José Serra (PSDB) cresceu. Pode não ter sido nas pesquisas, mas evoluiu politicamente. Sua fidelidade a Gilberto Kassab (PSD) é de fazer inveja aos tucanos. Sua disposição para elogiar a gestão do prefeito nos erros e nos acertos é rara na política. O candidato Serra mudou 180 graus em comparação à eleição presidencial de 2002. Tornou-se um campeão da continuidade com continuísmo. Era tudo o que Fernando Henrique Cardoso queria dez anos atrás. Alguém que defendesse seu governo e sua imagem com gana. Que falasse seu nome e mostrasse suas obras na TV.
Não é fácil defender um governante impopular. Custa e caro. O candidato aliena o eleitorado que desaprova aquela administração. Mas Serra está pagando sem reclamar. O tucano segue no patamar de 13% de intenção de voto entre os eleitores que acham o governo Kassab ruim ou péssimo, segundo o Ibope. Não seria um problema se o contingente dos que acham a gestão Kassab ruim ou péssima fosse pequeno. Era 43% do total do eleitorado da cidade antes da propaganda começar. É 48% agora.
"O Kassab tem uma gestão na Prefeitura que é bem melhor do que a avaliação que neste momento tem". As palavras "neste momento" dessa frase de Serra (dita em entrevista à TV Estadão na sexta-feira) encerram sua esperança. Em 2008, Kassab também era mal avaliado antes da campanha eleitoral, mas usou suas horas na TV para convencer o eleitor do contrário e acabou reeleito.
A torcida de Serra não basta para a história se repetir. Talvez sua propaganda ajude, mas está atrasada. Na eleição paulistana anterior, o prefeito partiu de um fosso menos profundo e começou a escalada antes. Além disso, enfrentava uma adversária que carregava uma taxa de rejeição equiparável à de Serra hoje. As circunstâncias são diferentes, o resultado pode ser também.
Serra não está levando um voto sequer para carregar Kassab. Antes do horário eleitoral, tinha 42% entre os raros eleitores que acham a gestão do prefeito boa ou ótima. Tem agora 36%. Entre o terço que classifica o governo Kassab como "regular", o tucano caiu de 31% para 21%. Como os números do Ibope mostram, a administração do fundador do PSD está longe de ser uma mola.
Olhando de fora, carregar um peso como Kassab parece fatal para um candidato. Mas Serra conformou-se na entrevista à TV Estadão: "É uma realidade". Prefeito e candidato são uma coisa só. Um veio do outro. É como se Kassab tivesse mantido a cadeira ocupada para ninguém sentar enquanto Serra foi ali disputar uma eleição de governador e outra de presidente. Unha e carne. São tão indissociáveis que Serra não só defende como diz que "faria o mesmo" quando a Prefeitura de São Paulo viola o sigilo médico de um eleitor que só queria curar os olhos para voltar a trabalhar, mas foi usado como bola de pingue-pongue pelas campanhas do PT e do PSDB na sua guerra de versões.
O episódio, trazido à luz pelo corajoso furo da repórter Julia Duailibi, sintetiza a sucessão paulistana até agora. Petistas e tucanos ficam de picuinha, e o eleitor paga a conta. Gabriel Chalita (PMDB) martela esse diagnóstico diariamente, mas quem fatura é um adversário. Celso Russomanno (PRB) lidera a eleição enquanto Serra e Fernando Haddad (PT) empatam, um ao outro.
Neomalufismo. Paulo Maluf (PP) suicidou-se, politicamente, ao bancar Celso Pitta como seu sucessor à Prefeitura de São Paulo. Nunca mais ganhou uma eleição majoritária. Mas seu legado reaparece nesta sucessão, ironicamente pelas asas de um renegado. Russomanno nasceu para a política quando Maluf era governador, há mais de 30 anos. Rompeu e, agora, "Celsinho do Detran" herda o malufismo, sem Maluf. Como Lula, ele transforma eleitor em consumidor e vice-versa. É o malufismo de consumo.
Neofilia. Chalita foi de uma sinceridade comovente ao confirmar, em entrevista à TV Estadão, que está faltando dinheiro e faz campanha a fiado. É dos poucos a admitir, mas está longe de ser o único a enfrentar escassez de doações eleitorais. A prestação parcial de contas mostra que a maior parte do dinheiro gasto até agora (42%) nas campanhas Brasil afora veio - pasme - do bolso dos candidatos. Devem ver o gasto como um investimento.
Não é o caso de Chalita, que tem sido (mal) bancado pelo PMDB. Os partidos, aliás, tiraram mais dinheiro de seus cofres para custear campanhas do que as empresas. Ao menos por enquanto. É um sinal de que os empresários estão esperando para ver quais candidatos emplacam nas pesquisas para só investir no favorito. Chega de gastar com perdedor. Por falar em perdedor, tem partido de candidato derrotado a presidente com fatura de mais de R$ 700 mil pendurada até hoje na praça. Os fiadores de Chalita devem estar preocupados.