segunda-feira, 16 de abril de 2012

Uma revolução na indústria global?


OSÉ ROBERTO MENDONÇA DE BARROS - O Estado de S.Paulo
Em novembro publiquei neste espaço um texto ("Na crise, a indústria global se movimenta") no qual chamei a atenção para algumas mudanças na forma de operação do sistema de produção mundial. Em particular, mencionei uma revisão na extensão das cadeias globais de suprimento, buscando reduzir o risco de paradas súbitas na produção de certos insumos críticos (como determinados chips especializados), com efeitos graves na produção de integradores e montadores mais próximos do mercado.
O triplo acidente no Japão (com efeitos deletérios na montagem de automóveis) e a inundação na Tailândia, que afetou a montagem de computadores em várias partes do mundo, foram determinantes desse movimento. Os benefícios da concentração da produção de certos insumos em "clusters" continuam a pesar nas decisões de localização de plantas, mas certamente foram ajustados para determinados riscos, como os dos acidentes acima mencionados.
A segunda mudança importante foi o renascimento da indústria americana, resultado da elevação da produtividade, da redução de custos (como mão de obra) e da revolução da produção de gás natural, a preços muito baixos. O preço atual do gás equivale a um barril de petróleo de US$ 20! Com isso, indústrias, como a petroquímica e a de aço, vivem uma época de ouro, atraindo novos investimentos, como os realizados pela Braskem e pela Oxiteno. A operação americana da Gerdau também está sendo beneficiada. A constante elevação dos custos de produção na China reforça essa tendência.
Mencionei também naquele artigo as mudanças tecnológicas associadas à evolução da biotecnologia, da nanotecnologia e da robotização. A propósito desse último tema, Raquel Landim e Renato Cruz publicaram recentemente aqui no Estado uma extensa matéria sobre sua evolução no Brasil e no mundo. De fato, a automação e a robótica estão avançando muito rapidamente no mundo, particularmente como resultado da forte queda de preço dos equipamentos, algo especialmente decorrente de melhorias na área de software.
Antes de avançar, acho importante uma ressalva. Quando se fala de robotização o que vem à mente é um boneco com inteligência artificial tipo Guerra nas Estrelas. Entretanto, isso está longe da realidade, isto é, um equipamento com inteligência artificial ainda não existe. Alguém poderia perguntar se a máquina que vence o campeão mundial de xadrez não seria dotada de tal possibilidade; a resposta é negativa. O que o computador tem, ao contrário da inteligência, é o que Martin Ford chamou "de algoritmo da força bruta". A máquina ganha do enxadrista, que tem inteligência e criatividade, pela rapidez de examinar, em segundos, milhões de opções de jogadas, escolhendo a melhor.
A produção e venda de robôs industriais vêm crescendo rapidamente: superaram mais de 100 mil unidades/ano desde 2005, exceto em 2009, quando a crise reduziu a absorção para 60 mil. Estima-se que em 2011 a venda tenha atingido 141 mil unidades. Coreia (23,5 mil), Japão (21,9 mil), China (15 mil), EUA (14,3 mil) e Alemanha (14 mil) são os que mais compraram robôs. Por exemplo, o excelente Ethevaldo Siqueira visitou uma fábrica na Coreia, de telas de TV, totalmente automatizada. No mesmo ano, estima-se que o Brasil adquiriu 640 unidades. Estima-se ainda que o estoque mundial de robôs em operação seja algo entre 1,1 milhão e 1,3 milhão de unidades.
Do ponto de vista setorial, a indústria eletrônica e a automotiva são de longe os maiores consumidores. A demanda deverá continuar a crescer rapidamente nos países industriais líderes. Na área de serviços, o crescimento também tem sido muito rápido, destacando-se saúde, entretenimento e militar.
A expansão da automação é resultado de muitos fatores. A primeira causa é a redução de custos, especialmente de mão de obra, inclusive por menores riscos de acidentes no trabalho e pela preservação da saúde do trabalhador. Isso é especialmente verdadeiro em áreas como pintura e solda. Há redução também dos custos de energia e no consumo de materiais, em razão de menor desperdício. Ao mesmo tempo, a produtividade das fábricas se eleva pela possibilidade de produzir dia e noite, com uma cadência constante, pela precisão e qualidade do acabamento das peças, pela utilização do espaço da fábrica e pela maior flexibilidade na linha de produção, uma vez que a reprogramação do equipamento é muito fácil. Em resumo, a robotização permite produzir grandes volumes de produtos, com alta qualidade e menores custos. Como resultado, a expansão da nova tecnologia vai seguir crescendo velozmente, até mesmo, em países com limitações na oferta de mão de obra qualificada, como é o caso do Brasil. Todos os setores produtivos (indústria, mineração, agricultura, medicina, transportes, etc.) serão afetados.
Em paralelo, outra revolução avança, que é o desenvolvimento da impressora em 3D. Esse equipamento utiliza o conhecimento adquirido com base nas impressoras a jato de tinta (que trabalham em duas dimensões) e de inovações na eletrônica, na química e no laser. Trabalha com pó de metal ou de plástico e, comandada por um software, constrói uma peça, por exemplo, depositando o material camada por camada. É, por isso, chamado de um processo aditivo (additive manufacturing), para se diferenciar da forma clássica de construir a peça, por exemplo, de um bloco de metal. Este é desbastado por um torno, sendo, portanto, um processo subtrativo. As impressoras em 3D têm, em consequência, uma grande economia de matéria-prima. O processo também utiliza menos energia. Quem vê, pela primeira vez, um equipamento desses construindo um bloco de motor fica muito impressionado, posso garantir.
Quando esses equipamentos surgiram, há pouco mais de uma década, eram utilizados para construir protótipos, de forma rápida e barata, acelerando as inovações. Por essa razão, um dos mais importantes efeitos da tecnologia é diminuir as barreiras à entrada na indústria, beneficiando realmente os bons projetos, que só se conhecem quando vão a mercado. Mais uma vez, o preparo e o conhecimento das pessoas e das empresas será o fator decisivo. A combinação dessas tecnologias inovadoras vai implicar uma revolução no mundo da produção industrial. Vale a pena destacar os seguintes pontos:
1. Os países com grande disponibilidade de mão de obra perderão parte de sua vantagem. As vantagens comparativas estarão nos países com menor custo de energia, de infraestrutura e maior oferta de pessoal altamente qualificado, dedicado à geração de novo conhecimento. É neste último item que os países bem-sucedidos na Ásia (China e Coreia, especialmente) investem tão furiosamente;
2. No que depender dessas tendências, a distribuição de renda vai piorar;
3. A qualidade dos produtos vai se elevar;
4. Muitas ocupações intermediárias serão substituídas pela automação;
5. O emprego industrial crescerá menos que o valor adicionado do setor;
6. As novas tecnologias ajudam a reduzir custos em elevadas escalas de produção. Ao mesmo tempo, viabilizam escalas menores, permitindo o que Peter Marsh chamou de massificação personalizada.
É o início de uma nova revolução na produção industrial. Nossa indústria, também por essa razão, será afetada.

Hidroanel, o caminho de São Paulo pelos rios


Ao longo de 170 km, dezenas de portos carregariam todo tipo de material e possibilitariam retiradas de 50 caminhões de lixo das ruas

15 de abril de 2012 | 9h 25
ADRIANA FERRAZ - Agência Estado
A discussão não é nova. Há pelo menos 80 anos, cogita-se usar rios e represas de São Paulo para transporte de cargas e pessoas. Mas, até hoje, pouca coisa (ou quase nada) saiu do papel. A novidade é que agora a proposta ganhou finalidade sustentável: um anel hidroviário para transformar lixo em energia.
Ao longo de 170 km, dezenas de portos carregariam todo tipo de material em embarcações projetadas para evitar contaminação e possibilitar a retirada de 50 caminhões das ruas por viagem. Depois, descarregariam os produtos recolhidos em três grandes polos de transformação no Rio Tietê e na Represa Billings. Lá, usinas ou termoelétricas finalizariam o processo.
De execução aparentemente simples, o sistema não depende só de tempo, dinheiro - o custo está avaliado em pelo menos R$ 3,5 bilhões - ou vontade política para emplacar. O pacote de obras para "fechar" o anel inclui a construção de 20 eclusas e um canal de 17 km para ligar as Represas Billings e Taiaçupeba.
As eclusas, que funcionam como elevadores para barcos, são indispensáveis para fazer as "baldeações" necessárias para a navegação correr sem interferências. Mas interferência é o que não falta. Com tanta sujeira nas águas, só um sistema de dragagem permanente evitaria que os barcos encalhassem.
Segundo o arquiteto Alexandre Delijaicov, coordenador do grupo da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP que ajuda no projeto, o hidroanel ainda evitaria enchentes e reduziria o tráfego de caminhões. "Isso sem falar na qualidade de vida, com a interação dos rios com as cidades", diz.
Para tirar a proposta do papel, o Departamento Hidráulico (DH) de São Paulo planeja construir a eclusa da Penha, no Rio Tietê, ainda neste ano, para permitir 66 km navegáveis. "Em paralelo, vamos viabilizar dois portos. A ideia é que o governo faça a modelagem do negócio e o apresente à iniciativa privada", diz o diretor Casemiro Carvalho.
Mas, ao priorizar o uso dos rios para cargas públicas, o transporte de passageiros ganhou papel secundário. De novo. O cronograma prevê a realização de obras até 2042. Até lá, para superar as Marginais, só de carro. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo. 

Sem pompa nem circunstância


Timidez da agenda de Dilma nos EUA deve-se à inadaptação dos dois países ao novo contexto global, diz analista

15 de abril de 2012 | 3h 09
Ivan Marsiglia - O Estado de S.Paulo
O site da residência oficial americana (www.whitehouse.gov) destacou, na data anunciada, a importância do evento: "Na segunda-feira, 9 de abril de 2012, a Primeira Família vai receber o 134º Egg Roll da Páscoa na Casa Branca. O tema deste ano é 'Vamos lá, vamos jogar, vamos em frente'. Mais de 35 mil pessoas estarão conosco no Gramado Sul para jogos, histórias e, é claro, a tradicional brincadeira do ovo".
Esse pitoresco acontecimento teve mais visibilidade na mídia americana do que o encontro, no mesmo dia 9, da presidente da sexta maior economia do mundo com Barack Obama. É o que conta o professor americano Peter Hakim, presidente emérito do Inter-American Dialogue (Diálogo Interamericano), principal centro de análise política e cooperação entre países do Hemisfério Ocidental, com sede nos EUA. "Ou a visita de Dilma Rousseff foi mal planejada ou Brasil e EUA não tinham nada de muito importante a discutir", admite Hakim, sem meias palavras, nesta entrevista.
Ainda que a presidente tenha voltado a criticar, diante do anfitrião Obama, o "tsunami monetário" promovido pelos EUA para aliviar os sintomas domésticos da crise econômica ou tenha firmado convênios com centros de ensino de excelência como a Universidade Harvard e o Massachusetts Institute of Technology (MIT) - onde Hakim lecionou por anos -, ficou difícil disfarçar a timidez da agenda da visita dessa semana. Puro descaso do presidente americano, na interpretação do jornal britânico The Guardian, que estampou um artigo com o malicioso título Todos Querem Falar com a Presidente Dilma, menos Obama. Ou, antes, na opinião de Hakim, uma questão de inadaptação dos dois países ao novo contexto internacional de crise no mundo desenvolvido e ascensão dos emergentes.
"Os EUA parecem ter certa nostalgia de um Brasil de 'perfil baixo' e com menos contundência internacional", admite o analista. "O Brasil, por sua vez, é ainda cauteloso em se movimentar nessa nova estratégia, que combina independência e cooperação."
Apesar das críticas, o presidente do Inter-American Dialogue elogia os acordos firmados por Dilma - "a educação superior é a maior força dos EUA" -, mas alerta, ao comentar a malfadada cooperação entre o Ministério da Educação do Brasil e a United States Agency for International Development (Mec-Usaid), nos anos da ditadura militar, que esse tipo de programa deve ser seletivo e rigoroso para que os estudantes e o País tirem vantagem da experiência.
A visita da presidente Dilma aos EUA cumpriu seus objetivos?
Depois de refletir um pouco sobre a visita, não estou muito seguro de que objetivos eram esses. A mim me pareceu mais um encontro de cortesia, que não pode ser descartado como desimportante, mas com uma agenda tímida demais. As declarações públicas dos dois presidentes foram polidas e respeitosas, mas não passaram de retórica vazia - à parte a crítica feita por Dilma à política monetária americana. Mas talvez eu tenha perdido alguma coisa.
Um artigo no The Guardian criticou a forma como a presidente foi recebida. Disse que Obama lhe deu apenas duas horas, ao contrário da 'pompa e circunstância dedicadas aos líderes de Índia, China e Rússia'. O sr. concorda com essa análise?
Em termos gerais, sim. É fato que quase não houve pompa e circunstância. A data da visita foi mal escolhida, com o Congresso em recesso. Os líderes de Índia, Rússia e China certamente tiveram recepções mais elaboradas. Mas não é que os EUA tenham sido deliberadamente desatentos ou indiferentes. É que simplesmente não havia questões de grande importância ou urgência a serem discutidas. A mídia ficou procurando uma história e não encontrou. Os dois presidentes não tinham uma agenda clara a cumprir. Ou a visita foi mal planejada e organizada ou Brasil e EUA não tinham nada de muito importante a discutir. Possivelmente, houve uma mistura das duas coisas. Havia dois grandes eventos na Casa Branca no dia 9 de abril. A visita de Dilma e o Easter Egg Roll para crianças (tradicional brincadeira com ovos nos jardins da residência presidencial na Páscoa). O segundo teve mais destaque no noticiário televisivo.
Como entender o fato de que, apesar das significativas mudanças no panorama econômico internacional, as relações entre os EUA e o Brasil continuem em segundo plano?
A agenda americana com o Brasil ou com a América Latina não tem questões terrivelmente urgentes ou de vital importância para os EUA. Cuba, na realidade, não interessa para os EUA, exceto como problema político doméstico. O tráfico de drogas e suas consequências tampouco incomodam muito o país. Imigração é tema importante, mas não assunto a ser debatido com a América Latina; é outro problema doméstico ao qual os EUA se dedicam quando e como lhes convém. A presença da China na América Latina também não é vista com grande preocupação. A América Latina não é uma ameaça aos EUA de nenhuma maneira. Nem mesmo é alvo ou fonte de violência terrorista. O que faria, então, a América Latina sair desse segundo plano?
Para o Guardian, a ideia de que um país latino-americano possa servir de modelo 'está além da compreensão' americana.
O fato é que EUA e Brasil ainda não se adaptaram ao novo contexto global. O Brasil emergiu como polo de poder rival nas Américas, tem maior estatura internacional e uma economia mais forte e estável do que nunca. Os EUA parecem ter certa nostalgia de um Brasil de 'perfil baixo' e com menos contundência - internacional e regional. Ainda não encontraram um jeito de lidar com esse país assertivo, independente, que diz não aos interesses americanos. Por sua vez, o Brasil conquistou grande parte de sua nova influência afirmando sua independência em relação aos EUA, fazendo-lhe oposição nos fóruns internacionais, posicionando-se em questões como a Área de Livre Comércio das Américas, o Irã, bases militares na Colômbia, Estado Palestino, etc. E parece ainda cauteloso em se movimentar nessa nova estratégia, que combina independência e cooperação, assertividade e respeito.
Um dos destaques da visita foi a parceria firmada entre o governo brasileiro e instituições como a Universidade Harvard e o MIT. O que esperar dessa iniciativa?
É uma grande ideia que pode significar um grande negócio para o Brasil, se houver um número suficiente de estudantes brasileiros preparados para aproveitar esse treinamento de alto nível. Países como a China e a Índia mantêm um número enorme de estudantes nas universidades americanas - e têm há anos tirado vantagem dessa que é a maior força dos EUA, a educação superior. A América Latina, mesmo o México, nosso vizinho, está muito aquém no número de estudantes se aperfeiçoando nos EUA.
A nova cooperação anunciada apaga a triste memória dos acordos Mec-Usaid, feitos com os EUA durante a ditadura militar, que reduziram os anos letivos, cortaram disciplinas e sucatearam a escola pública no País?
Não sou um especialista nos acordos Mec-Usaid. Mas os EUA cometeram muitos erros trabalhando com regimes militares e ditadores personalistas. Além disso, levando-se em conta os recentes índices educacionais americanos, não estou certo de que sejamos o melhor lugar para se buscar conselhos para uma reforma educacional. Se o Brasil busca ajuda nos EUA, deveria fazê-lo com grande cautela - e clareza sobre o que o país realmente necessita. Pelo que sei, o Brasil já tem feito progressos importantes no redesenho de seu sistema educacional, particularmente em São Paulo.
Falando em cooperação, como ela anda entre os países do Hemisfério Ocidental, objetivo principal do Diálogo Interamericano?
Vivemos um período em que a cooperação se tornou mais difícil. A América Latina corretamente se percebe mais capaz do que nunca de agir com independência em relação aos EUA, de diversificar suas relações internacionais e mais apta a lidar com seus problemas por conta própria. Os EUA, por outro lado, enfrentam uma série de problemas que tornam difícil priorizar a cooperação com os países latino-americanos. Sua economia continua fragilizada e insegura, os recursos à disposição são parcos e o cenário político interno está polarizado e crescentemente disfuncional, tornando mais difícil o estabelecimento de um terreno comum para a formulação de políticas. Após engajar-se em duas guerras inconclusivas em menos de dez anos, os americanos têm os olhos voltados, cada vez mais, para si mesmos. Não querem se envolver com os problemas dos outros.
Recentemente, um microfone aberto flagrou uma conversa entre Obama e o então presidente da Rússia, Dmitri Medvedev, em que o mandatário americano prometia ser mais flexível às demandas russas após livrar-se 'do problema da reeleição'. Pode-se esperar comportamento distinto também em relação ao Brasil e à América Latina?
Talvez sim. Há alguns pontos na agenda americana com a América Latina que podem ser mais facilmente tratados após o fim do ano eleitoral. A reforma da imigração pode ser amenizada a partir de um acordo entre democratas e republicanos e a administração Obama deve dar mais alguns passos na agenda com Cuba. E há sempre a possibilidade de que o governo reveja seu approach com o Brasil - livre do risco de que uma concessão maior feita ao País lhe renda a acusação de tolerância com uma nação "amiga do Irã".
A esse respeito, o sr. escreveu que o Brasil sempre foi visto como um player que prefere se abster em certas questões, como a defesa da democracia e dos direitos humanos. Tal percepção se alterou após a mudança de tom de Dilma em relação ao Irã, por exemplo?
Dilma claramente mudou a forma com que o País lida com questões de democracia e direitos humanos, mas não de maneira tão dramática assim. Há mais continuidade do que mudança em relação ao seu predecessor. O lado positivo é que o Brasil está enfrentando a questão do balanço necessário entre dois princípios - o da não intervenção, por um lado, e o da promoção da democracia, de outro. A escolha certa nem sempre é óbvia. O Brasil sabe que essa decisão não é meramente ética, ela afeta as relações que tem com outros países e não é de se surpreender que se mova de maneira cautelosa. Mas tanto os EUA como a Europa veriam com bons olhos se o País assumisse um posicionamento mais forte na defesa dos direitos humanos, seja nos fóruns internacionais, seja em suas conversações bilaterais com países como Cuba, Irã e outros. China e Rússia é que ficariam menos contentes com isso.
Na sexta-feira, Dilma e Obama tinham outro compromisso, na 6ª Cúpula das Américas, em Cartagena. O que o sr. espera?
Não estou otimista quanto à possibilidade de resultados importantes. Os encontros recentes têm produzido poucos avanços efetivos. A verdade é que nem os EUA nem o Brasil se esforçaram muito nos preparativos para a Cúpula de Cartagena. O engajamento americano neste ano tem sido menor do que em todos os anteriores e as autoridades brasileiras têm sugerido que a Cúpula perdeu relevância em relação a outros fóruns de países latino-americanos e caribenhos. Apesar disso, nos últimos meses a cúpula foi energizada por acontecimentos inesperados em dois dos temas mais polêmicos desde sempre: Cuba e a política de drogas. Os americanos - que provavelmente estarão em posição minoritária e sob fogo cerrado em ambas as questões - serão duramente testados, assim como o grau de civilidade dos 33 países participantes da discussão. O resultado da Cúpula pode acabar sendo relevante ou apenas revelar apenas as animosidades de sempre.