Ao redor de universidades, empresas inovadoras são criadas em vários pontos do País
08 de janeiro de 2012 | 3h 08
RENATO CRUZ / TEXTOS, SÃO JOSÉ DOS CAMPOS - O Estado de S.Paulo
Apesar de ser a grande referência mundial de alta tecnologia produzida no Brasil, a Embraer não costuma parecer bem colocada nos rankings de inovação. A empresa costuma ficar atrás até mesmo de companhias do setor de commodities, com petróleo, mineração e agronegócios.
Em rankings gerais, a Embraer normalmente é penalizada pelo ciclo longo de desenvolvimento de produtos do setor aeronáutico, que pode chegar a 20 anos. Um dos indicadores mais usados para se medir a inovação é a participação de produtos novos (lançados nos últimos três a cinco anos) no faturamento e no resultado.
Isso faz com que a Embraer não pareça bem. As empresas de internet do Vale do Silício costumam adotar palavras de ordem como "fail fast, fail forward" (fracasse rápido, fracasse adiante). Uma fabricante de aviões, como a Embraer, não pode se permitir adotar slogans como esses.
Quando o ranking é setorial, por outro lado, a Embraer acaba ficando muito próxima da média, já que tem um peso imenso no setor aeronáutico brasileiro. Mais uma vez, acaba sendo prejudicada pelas particularidades da área em que atua.
No começo do ano passado, a Embraer finalizou um diagnóstico sobre a situação da inovação na empresa, e chegou à conclusão de que as atividades inovadoras estão muito concentradas na engenharia, no desenvolvimento dos produtos. A partir dessa conclusão, a empresa começou a criar programas para incentivar a inovação em outras áreas, como comercial e marketing.
"Basicamente, a empresa foi criada para desenvolver tecnologia, e sempre foi muito forte na área de produtos", disse Hermann Pontes e Silva, vice-presidente de sustentabilidade da Embraer, também responsável por inovação. O executivo apontou que o mercado passa por grandes mudanças. A configuração atual - em que, numa ponta, concorrem Boeing e Airbus e, na outra, Embraer e Bombardier - deve mudar rapidamente. "Chineses, russos e japoneses vão entrar nesse mercado nos próximos anos. Para nos prepararmos, precisamos oferecer melhores serviços e mudar até a própria forma comercializar nossos produtos."
A Embraer criou um torneio de inovação para seus cerca de 400 profissionais de tecnologia da informação, que enviaram ideias de aplicativos para telefones móveis. O vencedor foi um aplicativo de plano de voo para o avião Ipanema. Em janeiro, a empresa vai lançar um segundo torneio de inovação, só para os funcionários da unidade de Gavião Peixoto (SP).
Polos. A Embraer é a face mais visível do polo de tecnologia de São José dos Campos (SP), que se desenvolveu ao redor do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA).
O Vale do Silício, principal polo de tecnologia dos Estados Unidos, nasceu da relação entre universidades, empresas e governo. Não foi resultado de uma política pública, mas, sem o investimento do governo em pesquisa nas universidades; compras públicas, principalmente do setor de defesa; e uma estrutura tributária favorável ao investimento, a história poderia ter sido outra.
Desde a fundação da HP, na cidade de Palo Alto, em 1939, as empresas foram surgindo ao redor da Universidade Stanford (e da Universidade da Califórnia em Berkeley), num ciclo virtuoso em que empreendedores alcançam o sucesso, se transformam em investidores e financiam uma nova onda de empresas iniciantes.
O Brasil tem vários polos tecnológicos, ainda que nenhum da estatura do Vale do Silício. Cidades como Campinas, São José dos Campos e São Carlos (SP), Porto Alegre e São Leopoldo (RS), Campina Grande (PB), Recife, Belo Horizonte e Rio de Janeiro, têm visto surgir empresas de alta tecnologia ao redor de suas universidades, e conseguido atrair centros de pesquisa de multinacionais.
Gargalos. Startups são criadas com entusiasmo em várias cidades do País, mas há limitações evidentes nesse cenário. Uma delas é o porte das empresas. Com algumas poucas exceções (como a Embraer, em São José dos Campos), as empresas brasileiras mais bem sucedidas, surgidas nesses polos, têm dificuldade de ultrapassar a faixa dos R$ 200 milhões de faturamento anual.
Uma das explicações poderia ser o foco dessas empresas no mercado interno. A Embraer, que é a referência brasileira de alta tecnologia no mercado internacional, descobriu muito cedo que, para se viabilizar, precisaria vender aviões para o mundo. Antes dela, outras fabricantes surgiram ao redor do ITA, mas não tiveram sucesso, sendo extremamente dependentes das compras governamentais.
Outra explicação seria a falta de investimento adequado. As empresas iniciantes ainda são muito dependentes das linhas de crédito oficiais, oferecidas pelo BNDES e pela Financiadora de Projetos (Finep), do Ministério das Ciência, Tecnologia e Inovação.
Um estudo da Fundação Getúlio Vargas apontou que, em 2009, havia US$ 36,1 bilhões investidos em venture capital (capital de risco) e private equity (investimento em empresas de capital fechado) no País, um crescimento de 29% sobre o ano anterior. Pode parecer bastante, mas não é. Esse montante representava 2,33% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, quando a média mundial é de 3,7%. Os Estados Unidos estão na média. Na Inglaterra, o investimento chega a 4,7% do PIB e, em Israel, a 4,2%.
Esse cenário começa a mudar com empreendedores que se tornam investidores. Em Campinas, um grupo de cerca de 40 empreendedores resolveu se reunir para investir em startups, criando a Inova Ventures Participações (IVP). O professor Silvio Meira, do Recife, se aposentou da Universidade Federal de Pernambuco e formou a Ikewai, para apoiar empresas de tecnologia. Em São Paulo (que é um também grande polo de tecnologia), Cassio Spina, fundador da Trellis, criou a Anjos do Brasil, para investir em startups.
Em rankings gerais, a Embraer normalmente é penalizada pelo ciclo longo de desenvolvimento de produtos do setor aeronáutico, que pode chegar a 20 anos. Um dos indicadores mais usados para se medir a inovação é a participação de produtos novos (lançados nos últimos três a cinco anos) no faturamento e no resultado.
Isso faz com que a Embraer não pareça bem. As empresas de internet do Vale do Silício costumam adotar palavras de ordem como "fail fast, fail forward" (fracasse rápido, fracasse adiante). Uma fabricante de aviões, como a Embraer, não pode se permitir adotar slogans como esses.
Quando o ranking é setorial, por outro lado, a Embraer acaba ficando muito próxima da média, já que tem um peso imenso no setor aeronáutico brasileiro. Mais uma vez, acaba sendo prejudicada pelas particularidades da área em que atua.
No começo do ano passado, a Embraer finalizou um diagnóstico sobre a situação da inovação na empresa, e chegou à conclusão de que as atividades inovadoras estão muito concentradas na engenharia, no desenvolvimento dos produtos. A partir dessa conclusão, a empresa começou a criar programas para incentivar a inovação em outras áreas, como comercial e marketing.
"Basicamente, a empresa foi criada para desenvolver tecnologia, e sempre foi muito forte na área de produtos", disse Hermann Pontes e Silva, vice-presidente de sustentabilidade da Embraer, também responsável por inovação. O executivo apontou que o mercado passa por grandes mudanças. A configuração atual - em que, numa ponta, concorrem Boeing e Airbus e, na outra, Embraer e Bombardier - deve mudar rapidamente. "Chineses, russos e japoneses vão entrar nesse mercado nos próximos anos. Para nos prepararmos, precisamos oferecer melhores serviços e mudar até a própria forma comercializar nossos produtos."
A Embraer criou um torneio de inovação para seus cerca de 400 profissionais de tecnologia da informação, que enviaram ideias de aplicativos para telefones móveis. O vencedor foi um aplicativo de plano de voo para o avião Ipanema. Em janeiro, a empresa vai lançar um segundo torneio de inovação, só para os funcionários da unidade de Gavião Peixoto (SP).
Polos. A Embraer é a face mais visível do polo de tecnologia de São José dos Campos (SP), que se desenvolveu ao redor do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA).
O Vale do Silício, principal polo de tecnologia dos Estados Unidos, nasceu da relação entre universidades, empresas e governo. Não foi resultado de uma política pública, mas, sem o investimento do governo em pesquisa nas universidades; compras públicas, principalmente do setor de defesa; e uma estrutura tributária favorável ao investimento, a história poderia ter sido outra.
Desde a fundação da HP, na cidade de Palo Alto, em 1939, as empresas foram surgindo ao redor da Universidade Stanford (e da Universidade da Califórnia em Berkeley), num ciclo virtuoso em que empreendedores alcançam o sucesso, se transformam em investidores e financiam uma nova onda de empresas iniciantes.
O Brasil tem vários polos tecnológicos, ainda que nenhum da estatura do Vale do Silício. Cidades como Campinas, São José dos Campos e São Carlos (SP), Porto Alegre e São Leopoldo (RS), Campina Grande (PB), Recife, Belo Horizonte e Rio de Janeiro, têm visto surgir empresas de alta tecnologia ao redor de suas universidades, e conseguido atrair centros de pesquisa de multinacionais.
Gargalos. Startups são criadas com entusiasmo em várias cidades do País, mas há limitações evidentes nesse cenário. Uma delas é o porte das empresas. Com algumas poucas exceções (como a Embraer, em São José dos Campos), as empresas brasileiras mais bem sucedidas, surgidas nesses polos, têm dificuldade de ultrapassar a faixa dos R$ 200 milhões de faturamento anual.
Uma das explicações poderia ser o foco dessas empresas no mercado interno. A Embraer, que é a referência brasileira de alta tecnologia no mercado internacional, descobriu muito cedo que, para se viabilizar, precisaria vender aviões para o mundo. Antes dela, outras fabricantes surgiram ao redor do ITA, mas não tiveram sucesso, sendo extremamente dependentes das compras governamentais.
Outra explicação seria a falta de investimento adequado. As empresas iniciantes ainda são muito dependentes das linhas de crédito oficiais, oferecidas pelo BNDES e pela Financiadora de Projetos (Finep), do Ministério das Ciência, Tecnologia e Inovação.
Um estudo da Fundação Getúlio Vargas apontou que, em 2009, havia US$ 36,1 bilhões investidos em venture capital (capital de risco) e private equity (investimento em empresas de capital fechado) no País, um crescimento de 29% sobre o ano anterior. Pode parecer bastante, mas não é. Esse montante representava 2,33% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, quando a média mundial é de 3,7%. Os Estados Unidos estão na média. Na Inglaterra, o investimento chega a 4,7% do PIB e, em Israel, a 4,2%.
Esse cenário começa a mudar com empreendedores que se tornam investidores. Em Campinas, um grupo de cerca de 40 empreendedores resolveu se reunir para investir em startups, criando a Inova Ventures Participações (IVP). O professor Silvio Meira, do Recife, se aposentou da Universidade Federal de Pernambuco e formou a Ikewai, para apoiar empresas de tecnologia. Em São Paulo (que é um também grande polo de tecnologia), Cassio Spina, fundador da Trellis, criou a Anjos do Brasil, para investir em startups.