Não existe a escolha entre economia e saúde. Essa é uma falsa dicotomia.
No começo da pandemia, até fazia sentido tentar adiar uma quarentena. Mas desde o início de março já temos informações concretas sobre a progressão da Covid-19 no mundo, e não há sombra de dúvidas: para discutir a retomada da atividade econômica, primeiro devemos fazer uma quarentena de verdade, diminuindo a rapidez da disseminação de infecções para não sobrecarregar o sistema.
Essa não é uma crise como outra qualquer. Em crises passadas, o que importava era o tamanho da resposta, mais do que o timing da decisão das autoridades de saúde e de economia. Agora não. Na atual crise, todo dia importa, seja para a saúde das pessoas ou para aumentar a probabilidade de solvência das famílias e empresas.
Quanto antes um país entra numa quarentena séria, antes pode sair. Na Dinamarca, as aulas já estão voltando: o sistema educacional está fazendo testes para ver se comporta uma retomada de todas as aulas.
Mas no Brasil temos o pior dos mundos: uma quarentena parcial que mata o fluxo de caixa de várias empresas sem gerar o benefício para o sistema de saúde. E uma falta de liderança na área econômica estarrecedora: a equipe econômica que ainda está presa na ideia de que o déficit público deve ser o menor possível.
No momento, desperdício não é nosso principal problema. A destruição da estrutura produtiva e a morte de milhares de pessoas são os maiores riscos.
O Ministério da Economia ficou soltando medidas parciais quase diariamente, sem, em nenhum momento, enfrentar o problema de frente. Assim, o fluxo de caixa das empresas e dos estados foi minguando.
O resultado? O Congresso Nacional tomou a diantei- ra, criou (em cima de um projeto inicial sofrível que veio do governo) uma renda bá- sica emergencial e agora vai socorrer os estados com um pacote multibilionário.
Esse pacote pode realmente criar um problema nas contas públicas. Mas a culpa é do ministério. Como não fez o seu trabalho, vai ver a Câmara e o Senado darem um cheque quase em branco para os governos estaduais.
Em tese, ainda poderíamos evitar a catástrofe. O governo deveria criar um plano coordenado de operacionalização do resgate para empresas e famílias. As filas para o saque da renda emergencial vão acabar aumentando a transmissão do vírus.
O pacote de ajuda financeira para manutenção de empregos ainda está parado nos bancos. A resposta que um médio empresário obteve quando perguntou para seu gerente quando ele ia poder sacar o dinheiro para não demitir seus funcionários foi: "A fila é grande".
Hoje, apesar do governo federal, não faltam recursos para a crise. Mas falta operacionalização. O crédito continua empoçado nos bancos, e falta clareza sobre quem pode receber a renda básica emergencial.
Estudo do governo do Rio Grande do Sul mostrou que são 2,6 milhões os empregados vulneráveis no estado que deveriam ser cobertos pela renda básica emergencial, mas, com as regras e operação atual, somente 600 mil devem conseguir sacar o benefício. Precisamos de liderança não só para desenhar os pacotes de auxílio mas para implementá-los.
Era para termos parado o país há mais de um mês. Se tivéssemos feito isso, poderíamos, agora, fazer como a Dinamarca e pensar em retomar atividades. Com liderança coordenada, poderíamos estar dando sinais claros para a sociedade. Será que veremos isso, antes tarde do que nunca?
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