Alguma coisa se move, além da Covid-19. Depois de jogar fora 1/3 de seu mandato, Bolsonaro, que se submeteu à pior Casa Civil da história da República, parece ter acordado. Creio que entendeu, finalmente, que a única solução possível para administrar o país é escolher alguns partidos e dividir com eles, republicanamente, o poder.
A tal "nova política" desestruturou o seu poder e o transformou em "dependente" das decisões do Legislativo e do Judiciário. E tinha que ser assim mesmo. Ele tem muito poder, mas só pode exercê-lo se negociar com o Congresso, dentro das limitações constitucionais controladas pelo Supremo Tribunal Federal. A prova disso é que o sucesso do Ministério da Agricultura se deve exatamente ao fato de ele ter a sua própria bancada no Congresso.
Como se já não bastassem essas nuvens ameaçadoras, chegamos à tempestade perfeita com mais uma pandemia das tantas que já habitaram a história do homem, a Covid-19, que nos ameaça de morte. Renova o velho terror hobbesiano que o levou a entregar parte de sua liberdade a um ente abstrato --o Estado-- para que este garanta a sua segurança.
Bolsonaro, que, todos sabemos, recusa a evidência empírica, começou classificando a pandemia como uma "gripezinha" qualquer. E continua resistindo às recomendações de seu Ministério da Saúde (mesmo o "novo"), talvez por inspiração de alguns líderes evangélicos, para os quais a Covid-19 é "obra de Satanás".
Tem agido muito mal ao permitir que seus correligionários se aglomerem e façam manifestações contra as regras da Organização Mundial da Saúde e de nossas instituições. Como é impermeável à experiência, é cego em relação à tragédia humana imposta aos EUA por seu "guru", Trump, à reação inicial do cabeça-dura Boris, no Reino Unido, e, o que parecia impossível, ao absurdo comportamento do primeiro-ministro da Suécia, Stefan Löfven, que, para a vergonha de seus pares, demonstrou que a famosa virtude escandinava tem exceções...
Se quiser enfrentar com algum sucesso o comportamento —até agora defensivo, mas hoje ofensivo— das direções da Câmara e do Senado, só lhe resta fazer o que deveria ter feito em novembro/dezembro de 2018: escolher alguns partidos, formar uma coalizão e dividir com eles o poder, para administrar como se faz em qualquer República onde se pratica o Estado democrático de Direito.
Talvez seja só otimismo de um velho que torce para ver o Brasil vencer a Covid-19 e, no terceiro trimestre de 2020 (se estiver vivo), assistir à recuperação do crescimento e do emprego. É isso que, na minha opinião, sugere a manobra política iniciada a partir da nova Casa Civil.
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