Fábio Gallo, O Estado de S.Paulo
27 de abril de 2020 | 04h00
A crise da covid-19 tem trazido um enorme volume de análises e de projeções econômicas sobre o que devemos esperar quando sairmos da situação atual. Algumas conclusões são óbvias, porque partem do que já estamos vivendo. A queda do PIB das nações é evidente, a economia ao redor do mundo parou. O tempo perdido na economia não volta mais. Empresas falindo, o desemprego e a perda da renda são consequências imediatas.
Em situações como a vivida, temos que a queda é de elevador, mas a subida é de escada, com degraus altos e que exigirão muito esforço. Há muitas discussões sobre o fim do neoliberalismo e se voltaremos para um campo com forte presença do Estado. Discute-se muito se o desenho econômico da crise será em “U”, em “V” em “L”. Outras discussões são dedicadas ao ambiente microeconômico, sobre o comportamento do investidor, uma delas é sobre a permanência do investidor pessoa física na bolsa. Só não dá para se discutir o valor de uma vida comparada ao preço de uma máquina. A economia não é eticamente neutra. Não há conta possível a ser feita.
Por outro lado, algumas “certezas” manifestadas estão desconsiderando a real dimensão do que estamos vivendo. Busca-se comparar a tragédia atual com outras já vividas pela humanidade, como as grandes guerras, a gripe espanhola e a peste negra. Assim, procurando-se entender o que ocorreu nesses eventos e ter-se uma perspectiva do que podemos encontrar no período seguinte. Mas, o fato é que o atual momento é muito diferente de outros. Encontramos mais paralelos em filmes de Hollywood com cenários de ruas vazias, o medo instalado, mas ao mesmo tempo percebendo-se coisas e situações que não eram vistas anteriormente.
Muitos estão narrando que passaram a enxergar as pessoas em situação de rua, que antes não notavam. Não viam esses seres humanos, não notavam que eles estavam lá, ou pelo menos na quantidade que agora é notada. Começamos a entender a importância de algumas profissões e dar valor para situações que não eram percebidas. Ficou escancarado que milhões de pessoas não têm nenhuma segurança social. Dependem do trabalho diário para poderem comer. Vamos ter de repensar sobre todo o nosso modo de vida. Tudo será diferente. Vamos ter de ressignificar muitas coisas de nossa sociedade e nas nossas relações nesse “novo” normal. Portanto, termos “certezas” do que nos espera no futuro é leviano. E como diz o poeta: “Caminhante, não há caminho, o caminho se faz ao caminhar”.
* PROFESSOR DE FINANÇAS NA FGV/EAESP
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