Enquanto o governadorJoão Doria faz campanha em Nova York, em encontros na ONU e com agências financeiras, oPSDBvai assistindo, ou melhor, patrocinando, o estouro da tucanada no Brasil. Abre o olho, Doria!
O encontro, a foto e os sorrisos do governador Eduardo Leite com o candidato Sérgio Moropoderiam ser apenas um gesto de anfitrião, já que Moro está no Rio Grande do Sul para eventos do Podemos. Mas são o estopim para a dispersão no PSDB.
Péssimo para o partido, ruim também para o próprio Leite, que é jovem, promissor, e deveria seguir uma velha regra: quem disputa prévias se compromete com o resultado. Pode até trair, mas tem de disfarçar.
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Com Leite aos sorrisos com Moro, Tasso Jereissati se bandeando para o ex-presidente Lula, Geraldo Alckmin nem aí para o PSDB e Aécio Neves um pote até aqui de mágoas, com que cimento e tijolos Doria vai construir sua candidatura? Ah! E Fernando Henrique e José Serra estão de molho.
Doria depende de tirar votos do presidente Jair Bolsonaro, mas quem está tirando é Moro. E a eleição vai caminhando para a consolidação de Lula como favorito (ao menos no primeiro turno), do tudo ou nada de Bolsonaro e de Moro como o fator novo, surpreendente – papel, aliás, que Leite se atribuía.
Por que Lula joga no ar o balão da vitória em primeiro turno com Alckmin? Porque sabe que a esquerda continua unida em torno dele e suas condições são muito favoráveis na fase inicial, mas que a parada vai ser dura, e incerta, no segundo turno, que é sempre uma nova eleição.
E, com recessão técnica, inflação, pratos vazios, a miséria, as barbaridades na pandemia e a total falta de discurso, sobram para Bolsonaro o Centrão e a mitificação: “Deus, família e armas”. Mas é preciso muito robô de internet para transformar a eleição num culto.
Ciro Gomes é um refúgio para a esquerda e a centro-esquerda que não engolem a versão de Lula de que o mensalão e petrolão foram “uma montagem política”. Moro, abrigo para bolsonaristas arrependidos.
No 1º turno, Ciro é adversário frontal de Lula, Moro é o pavor de Bolsonaro e tanto Lula quanto Bolsonaro avaliam o risco da terceira via. Até onde Ciro vai? Moro é fogo de palha? Doria terá capacidade de reunir cacos e penas do PSDB contra Moro?
E quem olha para os demais candidatos a presidente enxerga candidatos a vice, como Simone Tebet, única mulher, e Rodrigo Pacheco, presidente do Senado. O MDB é craque em ceder vices. O PSD finge que não, mas está bem adiantado nas tratativas com Lula.
Hoje, portanto, o foco está em Lula, Bolsonaro e Moro, com Ciro e Doria de esguelha.
Durante 240 horas, tropas dos exércitos do Brasil e dos Estados Unidos vão combater inimigos comuns. Serão empregados helicópteros armados, blindados leves, computadores portáteis e recursos tecnológicos avançados. Tambem criarão procedimentos de ataque conjuntos para ocupar objetivos estratégicos. O processo prevê certas sutilezas, como o emprego de 'snipers', os atiradores de precisão a respeito dos quais se sabe pouco, mas se sabe que podem atingir alvos a centenas de metros de distância - um alvo pequeno, talvez do tamanho de uma cabeça.
Todo esse cenário, no eixo das cidades de Lorena, Cachoeira Paulista e Resende, será ocupado por dez dias para o ensaio Core, que o Comando Militar do Sudeste (CMSE) anfitrião do treinamento, considera fundamental para a "integração com um ator de destaque para a Estratégia Nacional de Defesa (END)".
Em preparo há pouco mais de oito meses, o ciclo de adestramento vai trazer para o território brasileiro uma companhia completa, cerca de 240 militares americanos, da 101ª Divisão de Infantaria Aeromovel, uma das maiores do exército dos Estados Unidos. É uma unidade histórica, criada em 1918 e reorganizada em 1942 com participação em todas as guerras travadas pelos EUA nesse período.
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A 101ª das"Águias que gritam", tem uma frota própria de 100 aeronaves e um efetivo de cerca de 30 mil homens e mulheres. Todos usam boinas pretas. É destinada a zonas de conflito de alta intensidade, o que significa fogo pesado. De acordo com o gabinete do comando, em Fort Campbell, no Kentucky, a Divisão é a única dos EUA capaz de realizar mobilização rápida de grande porte, na escala de uma brigada, deslocando cerca de 8 mil combatentes e equipamentos.
A tropa brasileira participa com 750 soldados do 5º Batalhão de Infantaria Leve, de Lorena. O 5º Bil é uma força de elite, focada na alta mobilidade. A missão do grupo será complicada: vai ter de operar de forma integrada com parceiros formados sob doutrina diferente. Para um dos oficiais da organização do ensaio, "tornar efetiva essa interoperabilidade é um objetivo".
O equipamento no exercício é comum: fuzis 5.56mm, pistolas 9mm, foguetes e mísseis antiblindagem de disparo individual, granadas, explosivos diversos e, claro, uma faca de combate feita de aço negro. Para vestir, couraças de cerâmica.
A utilização de pequenos drones, para o bservação do terreno, acoplados a computadores de campanha, "está na pauta". Muito moderno.
Se fosse possível contar a história de Sérgio Moro por meio de uma única cena de seu livro Contra o Sistema da Corrupção (Editora Sextante, 269 pág.), a escolha recairia na que o ex-magistrado se transporta para o filme Os Intocáveis, de Brian de Palma. Ele se vê na pele de Eliot Ness, interpretado por Kevin Costner, quando o agente usa um machado para arrombar um depósito de bebidas ilegais de Al Capone. Seu parceiro, interpretado por Sean Connery, diz: “Se atravessar essa porta, não terá como voltar atrás”.
Moro se vê como uma espécie de intocável, alguém que arromba portas em nome de um bem maior: o combate à corrupção. Seu “depósito” foi a audiência em outubro de 2014, na qual interrogou o doleiro Alberto Youssef e o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa. “A audiência foi devastadora. A Lava Jato revelava em todos os seus detalhes o sistema de corrupção que governava o Brasil.” Ao fim, disse aos funcionários: “Nada será como antes”.
Moro é assim: se vê na pele de Ness, enquanto os críticos enxergam nele um Simão Bacamarte ou um Girolamo Savonarola, personagens da ficção e da vida real que tiveram fins não muito auspiciosos. Em seu livro, defende sua atuação como juiz e como ministro da Justiça das críticas de parcialidade e de conivência com o governo de Jair Bolsonaro, o principal adversário de seu mais famoso réu: Luiz Inácio Lula da Silva.
Também ataca o petista e o presidente, seus concorrentes em 2022. “Vejo atualmente o governo Bolsonaro muito parecido com o governo Lula, especialmente na parte ética.” Ele critica o Supremo Tribunal Federal, que o considerou parcial ao julgar Lula. Por fim, quer mostrar que não é uma variante de Bolsonaro e se diz comprometido com a democracia.
O livro não se confunde com as autobiografias de personalidades ou influencers. É obra que busca influir no debate público, como Minha Vida, de Leon Trotsky, ainda que, estética e politicamente, esteja distante do revolucionário russo. Trotsky não escondia de que lado da história estava. Moro quer fazer o leitor crer que não fazia considerações políticas ao tomar suas decisões.
Mas o próprio autor diz: “Este livro é a minha história focada no combate ao sistema da corrupção. Um grupo de policiais, procuradores da República, advogados e juízes, com grande apoio da população e da opinião pública, conseguiu vitórias importantes contra a grande corrupção”. Moro parte da premissa de que o juiz é parte de um grupo com procuradores e delegados. Foi esse voluntarismo que fez o STF considerá-lo parcial com Lula.
Moro aborda todas as polêmicas. Conta como manobrou para Teori Zavascki – que morreu em 2017 – voltar atrás na decisão de soltar os réus da Lava Jato em 2014. Diz que pediu informações a Teori e o alertou da presença de um traficante de drogas entre os presos. Os críticos diriam que ficou a um passo de atuar como o Ministério Público, a quem cabe recorrer de decisões favoráveis à defesa.
O autor é superficial ao tratar das provas contra Lula. Pode-se dizer que o fez nos autos, mas agora é pré-candidato e devia demonstrá-las. Moro não conta qual indício específico fez a Polícia Federal ir atrás de Lula. Alega que suas decisões foram referendadas por tribunais. Mas não reconhece as decisões do STF – também um tribunal – como critério para julgar seus atos. Diz que publicar a delação de Antonio Palocci antes da eleição de 2018 não prejudicou Fernando Haddad (PT) porque ele não era citado. Cabe ao leitor julgar o argumento.
Já Bolsonaro é pintado como desleal, mentiroso, extremista e preocupado apenas em proteger a família das acusações de corrupção. No Planalto importava mais se vingar de adversários do que pensar em administrar de forma eficiente. Moro admite que se calou diversas vezes diante do chefe.
Diz hoje saber ter sido um erro aceitar o convite de Bolsonaro. Mas usa a Operação Mãos Limpas, da Itália, para justificar por que entrou no governo. Queria evitar que a Lava Jato fosse destruída, como as Mãos Limpas. Moro esqueceu outra lição dos magistrados italianos: não entrar na política sem quarentena. Dois procuradores foram convidados pelo direitista Silvio Berlusconi para serem ministros. Ambos recusaram.
Moro pensa diferente. Crê que a Lava Jato mudou o jogo da captura do Estado pelos interesses privados. Tudo parece começar e terminar no ex-juiz. Mas, se os homens fazem a sua história, não a fazem segundo a sua livre vontade e sob circunstâncias de sua escolha, mas sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas pelo passado. Essa lição clássica das ciências sociais passou longe do autor. Sua análise é a de um operador do direito, não a de um intérprete de seu tempo.
Moro põe a corrupção dos grandes acima de tudo, como se os males do País pudessem ser explicados pela descoberta de um sistema corrupto. Não que ele não tenha enfrentado obstáculo reais – o balanço da Lava Jato mostra isso –, mas é como se dissesse: “Pouca saúde e muita saúva os males do Brasil são”. Sua história ainda não acabou. Seu eleitor espera que o homem que se vê como Eliot Ness não termine no papel de Macunaíma, revelando o descompasso entre quem ele é e quem gostaria de ser.