quarta-feira, 1 de maio de 2019

Direita Incultural ,Antonio Delfim Netto, FSP

Direita incultural

O dia 25 de abril será lembrado como dia da mesquinhez

Suspeito que 25 de abril será lembrado como o dia da “mesquinhez”. Nele, em 2019, o governo Bolsonaro “partiu para a ignorância” contra os conhecimentos que prometem a possibilidade da construção de uma organização social onde os homens gozariam de paz e relativo conforto. 
O encarregado da Educação Nacional insistiu, sob o olhar aprobativo do presidente, numa proposição inimaginável. Disse ele, “imagine uma família de agricultores cujo filho entrou na faculdade e, quatro anos depois, voltou com o título de antropólogo”, coisa absolutamente inútil. O que sugeriu o John Dewey tupiniquim? Que “o filho deveria ter estudado na faculdade de medicina veterinária”, coisa prática. Com tal aprendizado poderia prosseguir e melhorar a atividade de seu pai, na qual seu avô revelou ter o mesmo talento do seu tataravô!
Mas, afinal, que sociedade é essa? Talvez uma lamarckiana, onde o DNA, pela repetição geracional, reproduziria “homens-agrários-naturais”, condicionados geneticamente, como se reproduzem as “formigas operárias”. 
É o oposto do que propõem as ciências sociais (antropologia, sociologia, direito, economia) em busca de um conhecimento social (nunca será uma ciência) que, convertido em instituições adequadas, ajudará a construir uma sociedade “justa”, na qual o menos favorecido de seus membros encontrará o conforto da solidariedade tribal, a equidade, a ausência de preconceitos de qualquer natureza e terá condições de realizar-se dignamente com seu próprio esforço.
​E o que dizer da condenação do conhecimento filosófico num governo que reconhece como seu “guru” alguém que se pretende filósofo? Pois bem. O conhecimento filosófico é fundamental para apaziguar os espíritos mais inquisidores que não se cansam de procurar uma explicação razoável para entender por que arte do destino o homem —um acidente aleatório de um óvulo e um espermatozoide— está aqui e para quê? Não há outro conhecimento que dê mais humildade e gere mais dúvidas aos mais brilhantes portadores das “ciências duras”.
A crítica instantânea e bem informada a tal ideologia veio de um físico renomado. Leandro Tessler, da Unicamp, disse nesta Folha (27/04, B4) que: “Nenhum lugar do mundo tem universidade de prestígio sem humanas, filosofia, sociologia, história. Isso é muito importante para saber que nazismo não foi de esquerda, por exemplo”.
Para responder ao espírito crítico do “marxismo cultural” é preciso enfrentá-lo, com argumentos lógicos e antropológicos, não incendiar a universidade e tentar substituí-lo pelo seu equivalente —de sinal contrário— o “direitismo cultural”.
ideias.consult@uol.com.br
Antonio Delfim Netto
Economista, ex-ministro da Fazenda (1967-1974). É autor de “O Problema do Café no Brasil”.

Golpe ou revolução?, FSP

SÃO PAULO
Enquanto a situação na Venezuela não se define, e torcendo para que o embate não degenere em guerra civil, podemos nos perguntar se o movimento deflagrado por Juan Guaidó deve ser classificado como tentativa de golpe ou como revolução para pôr fim a uma usurpação. A imprensa mundial se dividiu sobre a designação, e não apenas segundo as linhas ideológicas esperadas.
A definição menos polêmica de golpe, como ruptura institucional, em geral pela força, funciona bem até a página 1. Quando temos um governo legítimo que tem seu funcionamento suspenso de forma não prevista em lei, estamos inegavelmente diante de um golpe. É o caso da deposição de João Goulart em 1964.
É raro, porém, que o mundo nos presenteie com situações tão claras. Ora, nem todo governo é legítimo, mas todo governo impõe uma ordem jurídica passível de violação. Se nos centrarmos no critério formal, teríamos de considerar golpista, por exemplo, a resistência francesa ao nazismo, que, ao fim e ao cabo, agia contra a lei vigente com o objetivo de depor o regime.
O caso da Venezuela é suficientemente ambíguo, pois, embora os partidários de Guaidó tenham buscado uma ruptura, dá para afirmar que o governo de Nicolás Maduro tornara-se ilegítimo seja quando se utilizou de uma artimanha não prevista em lei para esvaziar os poderes da Assembleia Nacional em 2017 ou, de modo mais polêmico, quando fraudou o pleito que o reelegeu em 2018. Se aceitamos isso, faz sentido enquadrar Guaidó não como golpista, mas como resistente.
A moral da história é que não estamos diante de questões que possamos decidir por meio de formalismos jurídicos. Não há como escapar à tarefa bem mais difícil de fazer juízos morais sobre as posições dos contendores.
Minha avaliação pessoal é a de que, com Maduro, a Venezuela não tem futuro, daí que, na melhor tradição consequencialista, é melhor para o país livrar-se dele.
 


Hélio Schwartsman
Jornalista, foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".

Startup utiliza luz contra a dor, Fapesp

Eduardo Geraque  |  Pesquisa para Inovação – Em 2007, Marcelo Sousa, ainda estudante do último ano de física da Universidade Federal do Ceará, peregrinou por alguns hospitais de Fortaleza por causa de uma doença na família. O câncer da avó do futuro físico fez com ele constatasse uma difícil realidade. A tecnologia oferecida ao paciente, segundo ele, era algo do século 19.
“Aquela situação, e mesmo depois do falecimento da minha avó, fez com que eu decidisse que precisava usar a física de uma forma mais aplicada. Naquela época ainda estudava apenas física teórica”, afirma Sousa.
O primeiro passo rumo ao mundo da inovação ocorreu de forma simultânea à decisão de fazer o mestrado. Ele leu como se fosse um romance o livro Física para Ciências Biológicas e Biomédicas, de Emiko Okuno e outros autores, e começou a entender que a fronteira entre a física e a biologia era muito pequena. “Eu escrevi para a autora pedindo para ela me orientar no mestrado. Ela disse que estava aposentada e me indicou um laboratório no Instituto de Física da USP. Lá decidi então que seguiria a área da fotomedicina, um campo praticamente desconhecido”, diz Sousa.
Do mestrado veio o doutorado e, por meio do programa Ciência sem Fronteiras, a possibilidade de estudar em Harvard. O doutorado do físico cearense culminou com a descoberta do fenômeno da fotoneuromodulação. Neste processo, o uso da luz faz com que os neurônios passem a conduzir menos a sensação de dor, o que gera um efeito analgésico na pessoa, sem efeitos colaterais.
O salto entre a pesquisa básica feita durante o doutorado e a inovação tecnológica desenvolvida pela Bright Photomedicine, fundada em novembro de 2014, foi um inocente jogo de futebol, nos Estados Unidos. “Lembro que depois de um racha, no MIT, contei para os amigos sobre a minha pesquisa. Todos foram unânimes em me dizer que eu tinha em mãos um projeto de startup”, lembra Sousa. “Lá, eles têm muito sangue nos olhos quando o tema é inovação tecnológica.”
Segundo ele, entre 2013 e 2014, a imersão no mundo da inovação foi total. “Percebi que era um ambiente que me daria muito mais retorno profissional do que simplesmente seguir a carreira acadêmica tradicional. Aprendi muito, porque as pessoas desse setor têm visões diferentes das dos cientistas. É muito interessante.”
Sobre a pesquisa mais básica feita no doutorado, Sousa e os colaboradores que foram entrando no projeto agregaram tecnologia, algoritmos e big data. Na prática, o que a empresa desenvolve, dentro da fotomedicina, é uma tecnologia em que o médico ou o fisioterapeuta controla a dose e o tipo de luz exata para cada paciente. Nos casos de dores crônicas e severas, essa aplicação de luz tem efeito análogo ao da aplicação de uma droga. “O equipamento em si é simples. Ele pode ser carregado em uma mochila. O nosso diferencial está todo na nuvem. O software que desenvolvemos calcula tudo e indica qual é a dose ideal, considerando tanto a doença quanto o paciente. É um remédio digital.” O algoritmo informa o tempo de aplicação de luz e todas as características físicas da aplicação.
A ideia científica que deu sustentação à startup, em 2015, foi apoiada pelo Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE) da FAPESP. Em 2017, na fase 2 do programa, a empresa obteve mais recursos para o projeto “Desenvolvimento e validação tecnocientífica de equipamento vestível wearable para fototerapia”.
Além do apoio da FAPESP, a empresa também ganhou outros financiamentos públicos e privados nos últimos quatro anos. Em 2015, a startup foi a vencedora do programa de aceleração da Startup Farm. Em 2019, R$ 1,5 milhão foram captados via Kria, uma das maiores plataformas de investimento on-line do país. No total, 70 investidores privados aportaram um ticket médio de R$ 21 mil na iniciativa. O primeiro protótipo da empresa, segundo Sousa, em 2016, foi o grande divisor de águas na história da Bright.
Com o protocolo para o uso da fotobiomodulação sendo testado clinicamente em pacientes com osteoartrite no joelho no Hospital das Clínicas do Estado de São Paulo, Sousa e todo o time da Bright Photomedicine começam a olhar para outras áreas onde a tecnologia desenvolvida por eles pode ser aplicada.
“Além do efeito analgésico, também estamos pesquisando o uso da luz como anti-inflamatório ou também com ação neurológica, em casos de enxaquecas, depressão, Parkinson ou Alzheimer”, diz Sousa. Segundo ele, apresentações sobre estes próximos passos feitas em workshops internacionais foram bem recebidas pela comunidade científica.
Em tese, o efeito terapêutico da aplicação de luz ocorre devido a reações fotoquímicas no interior das células. Neste processo, os tecidos biológicos produzem remédios endógenos que permitem ao organismo voltar a ficar saudável. O que abre a possibilidade, também, de a tecnologia ser usada na cura de feridas ou em pós-operatórios em geral.
“É um mercado com muito potencial. Nossa tecnologia é única, criamos o remédio digital orgânico, no qual o próprio organismo é estimulado a produzir o remédio. Não temos concorrentes fazendo essa abordagem. Temos um horizonte com oceano azul”, diz Sousa. Atualmente, na expectativa da empresa, milhões de pessoas que sofrem com dores crônicas poderão ser beneficiados pela tecnologia. O fato de ela ser indolor, não invasiva e sem efeitos colaterais aumenta ainda mais o sucesso do negócio.
Com a chegada de outros sócios e executivos na empresa, o físico afirma ter conseguido um privilégio. Em 2019, por enquanto, ele conseguiu trabalhar durante 90% do tempo como cientista. “Isso nem sempre é fácil neste universo da inovação”, afirma. A empresa publicará a eficácia dos resultados quantitativos do ensaio clínico feito no Hospital das Clínicas.
Bright Photomedicine
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Telefone: (11) 3039-8373
Contato: www.brightmed.com.br/contato
Palavras-chave: Fotomedicina, fotobiomodulação, osteoartrite,Marcelo Sousa, Bright Photomedicine, dor, HC, osteoartrite