quinta-feira, 19 de abril de 2018

Mark Weisbrot: A evidência importa no caso de Lula?, FSP

Mark Weisbrot: A evidência importa no caso de Lula?

Com controle suficiente sobre o Judiciário e a mídia, a elite tradicional do Brasil acredita que possa deixar de lado o Estado de Direito e decidir quem pode concorrer à Presidência

 
 
Há uma surpreendente falta de atenção da mídia —tanto nacional quanto internacional— às evidências com as quais o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi condenado em julho de 2017 e preso no último dia 7 de abril.
Isso é estranho, porque Sergio Moro, o juiz que investigou e processou o caso, demonstrou repetidamente  sua animosidade contra Lula, de formas que abusam de sua autoridade judicial.

Por exemplo, ele vazou para a mídia telefonemas interceptados ilegalmente entre Lula e Dilma, sua família e seus advogados. Dados a intensa politização do caso e seu enorme impacto político —impedindo que o provável vencedor das próximas eleições presidenciais de outubro concorra à Presidência—, as pessoas não deveriam ser capazes de ver as bases para a condenação de Lula?
Segundo Moro, Lula é culpado de corrupção e lavagem de dinheiro em conexão com um apartamento, o qual foi supostamente “dado” a ele pela construtora OAS. (Ainda que corrupção e lavagem de dinheiro soem como atos separados, são, na realidade, apenas duas acusações para o mesmo suposto ato de aceitar esse apartamento como suborno).
Lula nunca recebeu o título do apartamento, nem o usou, e só o visitou para olhá-lo uma vez. O juiz Moro, portanto, teve que passar por muitas acrobacias legais e probatórias para argumentar que seria “dele”.
A maioria das evidências apresentadas por Moro mostra que a OAS tinha o interesse de dar esse apartamento a Lula, com reformas, em troca de um apartamento muito menor para o qual Lula e sua esposa já haviam feito pagamentos. Mas o juiz Moro não apresenta provas materiais de que Lula tenha aceitado tal acordo. A “prova” em si vem do testemunho do ex-presidente da OAS José Adelmário Pinheiro Filho, que foi condenado por corrupção e lavagem de dinheiro nas investigações da Lava Jato.
Segundo relatos desta Folha, Pinheiro teve seu acordo de delação premiada suspenso quando seu testemunho inicial não implicou Lula; a negociação judicial só foi restaurada quando ele o fez. Sua sentença foi subsequentemente reduzida em dois terços, para ser cumprida em regime aberto.
Se isso não bastasse para levar o testemunho de Pinheiro menos a sério do que o de outras testemunhas conflitantes, há também o problema adicional de que, como réu no caso, Pinheiro é autorizado pela lei brasileira a depor no banco de testemunhas sem penalidade —ele não é juramentado.
Nos Estados Unidos, o ex-presidente Barack Obama começou a fazer discursos por US$ 400 mil por palestra para grandes instituições financeiras dos EUA, menos de um ano depois de deixar o cargo. No Brasil, assim como nos EUA, tais presentes para um ex-presidente não são ilegais, então o juiz Moro também teve que provar que Lula concedeu algum favor à OAS enquanto presidente, pelo qual foi “recompensado” (com um apartamento que nunca recebeu ou usufruiu) depois de deixar a Presidência.

As coisas ficam ainda mais obscuras quando seguimos Moro por esse caminho. O breve resumo de seu argumento é que os fundos que supostamente pagariam pela diferença nos preços dos apartamentos, bem como as reformas, supostamente vieram de suborno na Petrobras.
As alegações para esta parte do argumento de Moro também vêm de delações premiadas. E ainda nenhuma prova foi oferecida que comprove um ato específico de corrupção por parte de Lula; só que, como presidente, ele nomeou funcionários que mais tarde se envolveram em suborno na Petrobras.
Pode um ex-presidente —ou, de fato, qualquer pessoa— ser sentenciado a 12 anos de prisão com tal escassez de evidências? No Brasil, aparentemente sim, da mesma forma como Dilma Rousseff foi cassada e afastada da Presidência sem nem sequer ser acusada de um crime.

Com controle suficiente sobre o Judiciário e a mídia, a elite tradicional do Brasil acredita que possa deixar de lado o Estado de Direito e decidir quem pode concorrer à Presidência ou permanecer no cargo depois de eleitos. Nos próximos meses, o mundo vai ver se eles realmente possuem esse poder irrestrito.
Mark Weisbrot
É codiretor do Centro de Pesquisa Econômica e Política, em Washington.

Corrupção, impunidade e ideologização dos problemas nacionais ameaçam democracia, diz general, FSP


O general Eduardo Villas Bôas, comandante do Exército, afirmou por meio de uma mensagem, lida nesta quinta-feira (19), que a corrupção, a impunidade e a ideologização dos problemas nacionais são "reais ameaças" à democracia. 
"Não podemos ficar indiferentes aos mais de 60 mil homicídios por ano; à banalização da corrupção; à impunidade; à insegurança ligada ao crescimento do crime organizado; e à ideologização dos problemas nacionais."
O trecho consta em mensagem assinada por ele e que foi lida durante evento que comemora o Dia do Exército, em Brasília. 
 Eduardo Villas Bôas olhando para o lado
O general Eduardo Villas Bôas durante cerimônia no Palácio do Planalto - Evaristo Sá - 11.abr.2018/AFP
De acordo com o general, esses são exemplos das "reais ameaças à nossa democracia e contra as quais precisamos nos unir efetivamente, para que não retardem o desenvolvimento e prejudiquem a estabilidade". Villas Bôas pede ainda "equilíbrio, conciliação, respeito, ponderação e muito trabalho".
No mesmo texto, ele menciona as eleições de outubro e diz que caberá à população definir "de forma livre, legítima, transparente e incontestável, a vontade nacional".
Ele diz ainda que as eleições serão o caminho para "agregar valores, engrandecer a cidadania e comprometer os governantes com as aspirações legítimas de seu povo. O Exército "acredita nesse postulado".
A fala do general ocorre quinze dias depois de ter postado uma mensagem polêmica em suas redes sociais sobre "repúdio à impunidade"
Na véspera do julgamento, pelo STF (Supremo Tribunal Federal), de um pedido de habeas corpus do ex-presidente Lula, o general escreveu em sua conta do Twitter que repudia a impunidade e acrescentou que o Exército está "atento às suas missões institucionais", sem detalhar o que pretendeu dizer com a expressão.
A declaração gerou controvérsia ao ser interpretada por alguns como uma "pressão" à corte. Na ocasião, o Palácio do Planalto não quis comentar a fala do comandante do Exército.
O presidente Michel Temer participou da cerimônia ao lado de Villas Bôas e do ministro interino da Defesa, Joaquim Luna e Silva. O evento contou com a presença ainda dos ministros Sergio Etchegoyen (Gabinete de Segurança Instituicional), Raul Jungmann (Segurança Pública) e Gustavo Rocha (Direitos Humanos). Os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes também compareceram.
Além de Temer, que pode se candidatar à reeleição, outros pré-candidatos à Presidência da República também participaram como o deputado federal Jair Bolsonaro (PSL-RJ) e o senador Álvaro Dias (Pode-PR).

Incentivo correto, FSP

O QUE A FOLHA PENSA

Incentivo correto

Reforma da CLT acerta ao desestimular ações aventureiras na Justiça

Estoque de processos que aguardam decisão em primeira instância na Justiça Trabalhista caiu de 1,8 milhão, ao final de 2017, para 1,7 milhão em fevereiro deste ano
Estoque de processos que aguardam decisão em primeira instância na Justiça Trabalhista caiu de 1,8 milhão, ao final de 2017, para 1,7 milhão em fevereiro deste ano - Gabriel Cabral/Folhapress
Dados reunidos pelo Tribunal Superior do Trabalho mostram que as varas passaram a receber menos processos relativos a litígios entre patrões e empregados desde que a reforma da CLT entrou em vigor, em novembro do ano passado.
O número de ações abertas de dezembro a fevereiro revela queda expressiva, de 48,3%, em relação ao período correspondente na passagem de 2016 para 2017. Em valores absolutos, a redução é de 571,5 mil para 295,5 mil casos.
Tal fenômeno teve reflexo sobre o estoque descomunal de processos que aguardam decisão em primeira instância na Justiça Trabalhista —que baixou de 1,8 milhão, ao final de 2017, para 1,7 milhão em fevereiro.
A variação se mostra relevante porque nos últimos quatro anos, período para o qual há estatísticas do TST, os totais só aumentavam.
Ainda é cedo para saber se o efeito se deve apenas à reforma aprovada pelo Congresso no ano passado. Há informações, por exemplo, de que os próprios escritórios de advocacia estão represando a abertura de ações à espera de deliberações dos tribunais a respeito das novas regras.
Existem, contudo, boas razões para acreditar que ao menos parte da redução veio para ficar. Afinal, com o redesenho da CLT, trabalhadores que acionam os empregadores agora podem ter de arcar com o pagamento de itens como perícias e honorários de sucumbência, em caso de derrota.
Antes, eles não corriam esse risco, o que representava um incentivo indevido à abertura das chamadas ações aventureiras —aquelas em que o direito reivindicado parece bastante duvidoso, mas, na ausência de custo, o reclamante opta por tentar a sorte. 
Trata-se de um dispositivo certamente virtuoso de uma reforma controversa por natureza.
Pouco se nota que as gratuidades antes oferecidas aos trabalhadores implicavam uma conta a ser assumida pelas empresas e pela própria Justiça —ou, vale dizer, por consumidores (que pagam por produtos mais caros) e contribuintes.
Se mantida a tendência de redução do estoque de ações, pode-se vislumbrar a possibilidade de um enxugamento futuro da vasta estrutura hoje existente para arbitrar conflitos entre empregados e empregadores —para tanto, claro, os juízes especializados deverão contribuir com mais celeridade no exame dos casos.
Sempre convém recordar que o Brasil abriga um Judiciário que consome 1,3% da renda nacional, enquanto em países desenvolvidos tal fatia raramente passa de 0,3%.