domingo, 4 de junho de 2017

Governo diz que há recursos, mas faltam bons projetos de transportes, RF


02/06/2017 - Valor Econômico
Apesar das restrições orçamentárias, o financiamento para melhorias no transporte coletivo dispõe de recursos suficientes, mas faltam projetos bem estruturados no setor. "Temos dinheiro suficiente para fazer cinco, seis vezes o que estão fazendo hoje", disse ontem o secretário de mobilidade urbana do Ministério das Cidades, José Roberto Generoso, na abertura do seminário "Transporte Público Urbano: Desafios e Oportunidades", organizado pelo Valor.
Generoso informou que, nos últimos 12 meses, o setor recebeu investimentos de R$ 4,9 bilhões. Desse total, R$ 3,30 bilhões estão atrelados a financiamentos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e outros R$ 1,19 bilhão são do Orçamento Geral da União (OGU). Mais recursos não são liberados, segundo ele, por causa da má qualidade dos projetos. "Esse é o verdadeiro gargalo."
Muitas propostas levadas ao ministério, por exemplo, não estão integradas às de municípios vizinhos e a outras iniciativas do Estado, afirmou o secretário. Ele mostrou que, sem o uso do crédito oferecido ao setor, o conselho curador do FGTS tem reduzido a previsão de recursos. Neste ano, havia R$ 14 bilhões à disposição das obras de mobilidade, mas esse montante caiu para R$ 10 bilhões e o restante foi redirecionado para habitação. Simplesmente por falta de bons projetos. Em 2020, a previsão é de R$ 7 bilhões.
Na tentativa de suprir essa lacuna, a Caixa Econômica Federal está se estruturando para trabalhar com gestores públicos e com a iniciativa privada na formulação de projetos, segundo o vice-presidente de governo da instituição, Roberto Derziê. A ideia é oferecer assessoria técnica, jurídica, socioambiental, de engenharia e para a modelagem econômico-financeira dos empreendimentos. "Isso contribuirá para que os projetos possam ser licitados e saiam do papel. Queremos ser uma fonte perene e confiável de crédito", ressaltou o executivo.
Derziê disse que o sistema eletrônico de cobrança, hoje presente em 85% dos municípios com mais de 100 mil habitantes, facilita a estruturação de garantias para obter financiamentos, pois o banco passa a ter mais conhecimento sobre o fluxo de caixa das empresas. "A solução encontrada se sustenta nos recebíveis que giram na bilhetagem eletrônica. Se o fluxo da empresa passa pela Caixa, eu conheço o seu perfil, a sua capacidade de pagamento."
Um consenso entre autoridades e representantes do setor privado é que não se deve pensar necessariamente em empreendimentos complexos e caros, como BRTs. Às vezes, intervenções relativamente baratas - faixas exclusivas, sinalização, radares eletrônicos, recuos nas paradas de ônibus, abrigos com painel de informações - constituem soluções rápidas e efetivas para os usuários.
Viabilizar nova infraestrutura de mobilidade urbana, no entanto, é apenas parte da questão. Outro desafio diz respeito à operação e à manutenção dos sistemas. Generoso, do Ministério das Cidades, enfatizou que o custeio do transporte coletivo é um dos grandes problemas a ser enfrentado pelo segmento. "A situação é como a do hospital, em que você gasta cem para construir e outros cem por ano para manter", disse.
Uma ideia - nascida na Frente Nacional de Prefeitos e que hoje tramita no Congresso - é a criação de uma Cide sobre combustíveis com arrecadação voltada aos municípios e uso no transporte público. Estimativas da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU) indicam o potencial de levantar R$ 11,9 bilhões se houver uma alíquota de 6%.
O diretor administrativo e institucional da NTU, Marcos Bicalho, vê a possibilidade de isso reduzir as tarifas em quase 30%. Assim, o impacto no IPCA com a taxação dos combustíveis seria mais do que compensada pelo desconto nas passagens de ônibus.

Crack avança em todo o País, OESP



Até agora, medidas adotadas pelos governos municipais e estadual para tentar conter a expansão dessa droga ficaram muito aquém do necessário






O Estado de S.Paulo
04 Junho 2017 | 05h00
Atualizado 04 Junho 2017 | 05h00
A maior atenção ao que se passa em grandes cidades, porque nelas o problema é mais visível e por isso mais chocante – como a concentração de dependentes na Cracolândia, em São Paulo –, fez com que só mais recentemente começassem a surgir estudos mostrando a larga difusão do crack por todo o País. A tal ponto que já se pode dizer que ele tem tudo para se tornar um grave problema de âmbito nacional, que não poupa nenhuma região, das mais ricas às mais pobres, e, nelas, nem mesmo as pequenas cidades do interior.
Um exemplo disso é o que se passa em São Paulo, como mostra reportagem do Estadofeita com base em estudo do Observatório do Crack, da Confederação Nacional de Municípios (CNM). Os números levantados são tão impressionantes e assustadores que, perto deles, a Cracolândia já não pode ser considerada o ponto alto do problema, como se pensou por muito tempo. Dos 645 municípios do Estado, nada menos que 558 – entre os quais se inclui a capital – estão às voltas com problemas acarretados pelo crack, embora com níveis diferentes de gravidade.
O nível é muito alto em 193 cidades do interior, médio em 259 e baixo em 105. Outro aspecto importante a considerar é que, dos 608 municípios ouvidos – descontados os que informaram não terem sido atingidos (apenas 20) e os que não enviaram informações –, 95% têm problemas com o consumo de crack. Entre as mais importantes cidades do interior onde eles são mais graves estão Ribeirão Preto, São José do Rio Preto, Bauru e Marília. Os serviços públicos mais afetados por eles são os de saúde (67,1%), de assistência social (57,5%) e segurança pública (49,1%).
Até agora, as medidas adotadas pelos governos municipais e estadual para tentar conter a expansão dessa droga ficaram muito aquém do necessário. A Secretaria Estadual da Saúde diz ter aumentado seis vezes o número de vagas destinadas ao tratamento de dependentes de drogas, que passaram de 500 em 2011 para 3,3 mil, sendo 2 mil para o interior. É muito pouco, porque a comparação dos dados atuais da pesquisa da CNM com os colhidos em 2014 por reportagem do Estado sobre o avanço das drogas no interior mostra que a situação só piorou desde então.
Tem razão, portanto, o consultor da CNM Ernesto Stranz quando afirma que, apesar do “grito de socorro” das prefeituras – que é como define a disposição delas de participar da pesquisa, expondo a difícil situação em que se encontram, nesse caso –, o governo estadual nada mudou em sua maneira de enfrentar o problema, não fazendo os investimentos necessários para conter o avanço do crack no interior.
Se no Estado mais rico a situação é essa, não é de admirar que ela se repita nos outros, especialmente nos mais carentes do Nordeste. Pesquisa da CNM, feita em 2013, mostrou que o consumo de crack estava presente em 90% dos municípios de Pernambuco. Segundo outra pesquisa de 2013, esta da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), em parceria com a Secretaria Nacional de Política sobre Drogas (Senad), do Ministério da Justiça, só nas capitais havia 370 mil pessoas que consumiam crack regularmente, 80% em locais públicos. No Nordeste, estão 40% dos dependentes.
Tudo indica que, a exemplo do que aconteceu em São Paulo, a situação piorou em todo o País porque também nos demais Estados carentes não houve mudança significativa na forma de tratar o problema.
Está mais do que na hora de União, Estados e municípios acordarem para a gravidade do problema e colaborarem estreitamente na formulação e implementação de uma nova e mais ousada política de combate às drogas, em especial o crack, que ataque ao mesmo tempo e com igual empenho os seus dois aspectos fundamentais: a assistência social e médica para a recuperação dos dependentes e o combate sem trégua aos traficantes.
O crack deve merecer maior atenção por suas características, que o tornam particularmente perigoso: é uma droga barata – o que explica sua difusão –, que vicia rapidamente. Tem efeitos devastadores.

Quem preserva o meio ambiente - EDITORIAL O ESTADÃO


ESTADÃO - 04/06

Fatia de terras preservadas em propriedades rurais por agricultores no Estado de São Paulo é maior do que todas as reservas indígenas e unidades de conservação juntas


Com frequência constata-se a tentativa de atribuir uma suposta oposição entre sustentabilidade e agropecuária, como se o agricultor e o pecuarista fossem os grandes inimigos do meio ambiente. Dados recentes, compilados pela unidade de Monitoramento por Satélite da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), indicam justamente o contrário da versão habitualmente difundida.

A fatia de terras preservadas em propriedades rurais por agricultores no Estado de São Paulo é maior do que todas as reservas indígenas e unidades de conservação juntas, indica a Embrapa. No Estado de São Paulo, as terras de preservação permanente, sejam as de reserva legal ou de vegetação excedente, em 309,4 mil imóveis rurais totalizam 3,8 milhões de hectares, correspondentes a cerca de 22% da área rural do Estado.

“Os dados revelam um papel decisivo da agropecuária na preservação do meio ambiente. Muitas vezes, não se leva em conta que as propriedades rurais têm, em média, uma fração de suas áreas preservadas maior do que os espaços que são oficialmente reservados para preservação de vegetação nativa. Erroneamente, acabamos não associando a prática de proteção da vegetação aos imóveis rurais”, afirma Evaristo Eduardo de Miranda, chefe-geral da unidade de pesquisas da Embrapa, sediada em Campinas.

No Brasil, a vegetação protegida pelos agricultores em suas propriedades representa mais de 20% de todo o território nacional, segundo a Embrapa. As unidades de conservação abrangem cerca de 13% do território. Os números são provenientes do Cadastro Ambiental Rural (CAR), registro eletrônico de propriedades rurais criado em maio de 2012 pelo Código Florestal (Lei 12.651/2012) e que arquiva as informações dos imóveis rurais, como delimitação das Áreas de Proteção Permanente (APP), Reserva Legal (RL), de interesse social e utilidade pública e remanescentes de vegetação nativa.

Até fins de abril de 2017, isto é, em menos de cinco anos desde a criação da Lei 12.651/2012, já haviam sido cadastrados mais de 4,1 milhões de imóveis rurais no País, totalizando uma área de 407,9 milhões de hectares. Na Região Sudeste estão registrados 60,7 milhões de hectares.

Desde sua criação, o CAR tem sido um eficaz instrumento de regularização ambiental das propriedades rurais, bem como uma poderosa fonte de dados a auxiliar na análise e no planejamento da sustentabilidade no País. Além de permitir um acompanhamento próximo das tendências na ocupação das terras no País, o CAR vem possibilitando desvendar o papel decisivo da agropecuária na preservação ambiental. “Com os dados que temos a partir do CAR, foi possível observar que, na prática, ninguém e nenhuma instituição ou categoria profissional preserva mais a vegetação nativa do que os agricultores”, afirma Miranda.

Todo esse trabalho de regularização e acompanhamento só foi possível graças ao Código Florestal de 2012, uma lei que, para surpresa de quem acompanha de perto os seus benefícios, vem sendo ao longo desses anos duramente criticada, como se representasse um retrocesso na luta pela preservação ambiental.

Não bastassem as opiniões críticas, a Procuradoria-Geral da República e o PSOL ajuizaram perante o Supremo Tribunal Federal (STF) ações questionando a constitucionalidade de boa parte do Código Florestal de 2012. Na verdade, esses processos são uma tentativa extemporânea de reabrir uma discussão já decidida pelo Congresso Nacional, que, após intenso debate e estudo, estabeleceu o necessário marco jurídico ambiental, com uma equilibrada solução entre produção rural e sustentabilidade.

Cabe ao STF não fechar os olhos à realidade e, com presteza, reconhecer a constitucionalidade do Código Florestal de 2012, que, de forma tão eloquente, contribui para a preservação e a recuperação do meio ambiente. Como indicam os dados da Embrapa, nem a lei nem o produtor rural são os vilões nessa história. Não é justo, portanto, seguir tratando-os dessa forma.