domingo, 4 de junho de 2017

Crack avança em todo o País, OESP



Até agora, medidas adotadas pelos governos municipais e estadual para tentar conter a expansão dessa droga ficaram muito aquém do necessário






O Estado de S.Paulo
04 Junho 2017 | 05h00
Atualizado 04 Junho 2017 | 05h00
A maior atenção ao que se passa em grandes cidades, porque nelas o problema é mais visível e por isso mais chocante – como a concentração de dependentes na Cracolândia, em São Paulo –, fez com que só mais recentemente começassem a surgir estudos mostrando a larga difusão do crack por todo o País. A tal ponto que já se pode dizer que ele tem tudo para se tornar um grave problema de âmbito nacional, que não poupa nenhuma região, das mais ricas às mais pobres, e, nelas, nem mesmo as pequenas cidades do interior.
Um exemplo disso é o que se passa em São Paulo, como mostra reportagem do Estadofeita com base em estudo do Observatório do Crack, da Confederação Nacional de Municípios (CNM). Os números levantados são tão impressionantes e assustadores que, perto deles, a Cracolândia já não pode ser considerada o ponto alto do problema, como se pensou por muito tempo. Dos 645 municípios do Estado, nada menos que 558 – entre os quais se inclui a capital – estão às voltas com problemas acarretados pelo crack, embora com níveis diferentes de gravidade.
O nível é muito alto em 193 cidades do interior, médio em 259 e baixo em 105. Outro aspecto importante a considerar é que, dos 608 municípios ouvidos – descontados os que informaram não terem sido atingidos (apenas 20) e os que não enviaram informações –, 95% têm problemas com o consumo de crack. Entre as mais importantes cidades do interior onde eles são mais graves estão Ribeirão Preto, São José do Rio Preto, Bauru e Marília. Os serviços públicos mais afetados por eles são os de saúde (67,1%), de assistência social (57,5%) e segurança pública (49,1%).
Até agora, as medidas adotadas pelos governos municipais e estadual para tentar conter a expansão dessa droga ficaram muito aquém do necessário. A Secretaria Estadual da Saúde diz ter aumentado seis vezes o número de vagas destinadas ao tratamento de dependentes de drogas, que passaram de 500 em 2011 para 3,3 mil, sendo 2 mil para o interior. É muito pouco, porque a comparação dos dados atuais da pesquisa da CNM com os colhidos em 2014 por reportagem do Estado sobre o avanço das drogas no interior mostra que a situação só piorou desde então.
Tem razão, portanto, o consultor da CNM Ernesto Stranz quando afirma que, apesar do “grito de socorro” das prefeituras – que é como define a disposição delas de participar da pesquisa, expondo a difícil situação em que se encontram, nesse caso –, o governo estadual nada mudou em sua maneira de enfrentar o problema, não fazendo os investimentos necessários para conter o avanço do crack no interior.
Se no Estado mais rico a situação é essa, não é de admirar que ela se repita nos outros, especialmente nos mais carentes do Nordeste. Pesquisa da CNM, feita em 2013, mostrou que o consumo de crack estava presente em 90% dos municípios de Pernambuco. Segundo outra pesquisa de 2013, esta da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), em parceria com a Secretaria Nacional de Política sobre Drogas (Senad), do Ministério da Justiça, só nas capitais havia 370 mil pessoas que consumiam crack regularmente, 80% em locais públicos. No Nordeste, estão 40% dos dependentes.
Tudo indica que, a exemplo do que aconteceu em São Paulo, a situação piorou em todo o País porque também nos demais Estados carentes não houve mudança significativa na forma de tratar o problema.
Está mais do que na hora de União, Estados e municípios acordarem para a gravidade do problema e colaborarem estreitamente na formulação e implementação de uma nova e mais ousada política de combate às drogas, em especial o crack, que ataque ao mesmo tempo e com igual empenho os seus dois aspectos fundamentais: a assistência social e médica para a recuperação dos dependentes e o combate sem trégua aos traficantes.
O crack deve merecer maior atenção por suas características, que o tornam particularmente perigoso: é uma droga barata – o que explica sua difusão –, que vicia rapidamente. Tem efeitos devastadores.

Quem preserva o meio ambiente - EDITORIAL O ESTADÃO


ESTADÃO - 04/06

Fatia de terras preservadas em propriedades rurais por agricultores no Estado de São Paulo é maior do que todas as reservas indígenas e unidades de conservação juntas


Com frequência constata-se a tentativa de atribuir uma suposta oposição entre sustentabilidade e agropecuária, como se o agricultor e o pecuarista fossem os grandes inimigos do meio ambiente. Dados recentes, compilados pela unidade de Monitoramento por Satélite da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), indicam justamente o contrário da versão habitualmente difundida.

A fatia de terras preservadas em propriedades rurais por agricultores no Estado de São Paulo é maior do que todas as reservas indígenas e unidades de conservação juntas, indica a Embrapa. No Estado de São Paulo, as terras de preservação permanente, sejam as de reserva legal ou de vegetação excedente, em 309,4 mil imóveis rurais totalizam 3,8 milhões de hectares, correspondentes a cerca de 22% da área rural do Estado.

“Os dados revelam um papel decisivo da agropecuária na preservação do meio ambiente. Muitas vezes, não se leva em conta que as propriedades rurais têm, em média, uma fração de suas áreas preservadas maior do que os espaços que são oficialmente reservados para preservação de vegetação nativa. Erroneamente, acabamos não associando a prática de proteção da vegetação aos imóveis rurais”, afirma Evaristo Eduardo de Miranda, chefe-geral da unidade de pesquisas da Embrapa, sediada em Campinas.

No Brasil, a vegetação protegida pelos agricultores em suas propriedades representa mais de 20% de todo o território nacional, segundo a Embrapa. As unidades de conservação abrangem cerca de 13% do território. Os números são provenientes do Cadastro Ambiental Rural (CAR), registro eletrônico de propriedades rurais criado em maio de 2012 pelo Código Florestal (Lei 12.651/2012) e que arquiva as informações dos imóveis rurais, como delimitação das Áreas de Proteção Permanente (APP), Reserva Legal (RL), de interesse social e utilidade pública e remanescentes de vegetação nativa.

Até fins de abril de 2017, isto é, em menos de cinco anos desde a criação da Lei 12.651/2012, já haviam sido cadastrados mais de 4,1 milhões de imóveis rurais no País, totalizando uma área de 407,9 milhões de hectares. Na Região Sudeste estão registrados 60,7 milhões de hectares.

Desde sua criação, o CAR tem sido um eficaz instrumento de regularização ambiental das propriedades rurais, bem como uma poderosa fonte de dados a auxiliar na análise e no planejamento da sustentabilidade no País. Além de permitir um acompanhamento próximo das tendências na ocupação das terras no País, o CAR vem possibilitando desvendar o papel decisivo da agropecuária na preservação ambiental. “Com os dados que temos a partir do CAR, foi possível observar que, na prática, ninguém e nenhuma instituição ou categoria profissional preserva mais a vegetação nativa do que os agricultores”, afirma Miranda.

Todo esse trabalho de regularização e acompanhamento só foi possível graças ao Código Florestal de 2012, uma lei que, para surpresa de quem acompanha de perto os seus benefícios, vem sendo ao longo desses anos duramente criticada, como se representasse um retrocesso na luta pela preservação ambiental.

Não bastassem as opiniões críticas, a Procuradoria-Geral da República e o PSOL ajuizaram perante o Supremo Tribunal Federal (STF) ações questionando a constitucionalidade de boa parte do Código Florestal de 2012. Na verdade, esses processos são uma tentativa extemporânea de reabrir uma discussão já decidida pelo Congresso Nacional, que, após intenso debate e estudo, estabeleceu o necessário marco jurídico ambiental, com uma equilibrada solução entre produção rural e sustentabilidade.

Cabe ao STF não fechar os olhos à realidade e, com presteza, reconhecer a constitucionalidade do Código Florestal de 2012, que, de forma tão eloquente, contribui para a preservação e a recuperação do meio ambiente. Como indicam os dados da Embrapa, nem a lei nem o produtor rural são os vilões nessa história. Não é justo, portanto, seguir tratando-os dessa forma.

Sem Temer - EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 04/06

Deve começar na terça-feira (6) o julgamento, pelo Tribunal Superior Eleitoral, da chapa que uniu Dilma Rousseff (PT) a Michel Temer (PMDB), acusada de delitos no financiamento da campanha na qual se reelegeu, em 2014.

A decisão é crucial, pois poderá implicar o afastamento do presidente Temer do cargo que exerce desde maio de 2016. Sendo provável que ao menos um dos sete integrantes da corte peça vista do processo, o julgamento talvez se estenda pelas próximas semanas.

A expectativa é que o relator, ministro Herman Benjamin, vote pela cassação da chapa. Há uma avalanche de evidências, sustentada em documentos e dezenas de testemunhos, a incriminá-la.

Os depoimentos de donos e funcionários de empreiteiras atestam que somas milionárias, originadas da rede de propinas e caixa dois descrita por ex-executivos da Petrobras, custearam parte substancial das despesas da chapa. Dos fabulosos R$ 300 milhões declarados, ao menos R$ 50 milhões são apontados como contrapartida pela prestação criminosa de favores.
Editoria de Arte/Folhapress



Embora não exista prova de que Temer tenha participado desse esquema, a legislação eleitoral é clara ao vincular o vice ao presidente. Resta fora de dúvida que tanto Dilma Rousseff como Michel Temer se beneficiaram de ilicitudes que abalam a própria validade do pleito.

Ao mesmo tempo, desde a divulgação da delação premiada do delinquente confesso Joesley Batista, há duas semanas, a credibilidade do presidente se viu comprometida de forma dramática e, tudo indica, irremediável.
É verdade que a gravação da conversa do delator com o presidente é inconclusiva: contém trechos ambíguos ou inaudíveis e está sob suspeita de edição. Mas é preciso demasiada credulidade para considerar inocente aquele tipo de diálogo, naquela circunstância; parece óbvio que o teor ali é indecoroso.

Todo julgamento que implica um presidente da República tem um aspecto jurídico e outro político. A iminência do juízo no TSE surge como fórmula legal para remover um chefe de Estado cuja situação se afigura indefensável, até porque sujeita à aparição de revelações que convertam as fortes suspeitas em certezas.

É com desalento que esta Folha, portanto, considera recomendável a cassação da chapa e o afastamento do presidente. Seria a segunda interrupção de mandato em pouco mais de um ano.

No ano passado, este jornal exortou à renúncia da presidente Dilma Rousseff ao constatar que ela perdera condições de governar. Mas evitou apoiar seu impeachment.

Não por faltar fundamento jurídico (pedaladas fiscais, sobretudo naquela escala, configuram fraude orçamentária, razão estipulada na Constituição entre as que autorizam impedir um presidente). Mas por se tratar de motivo técnico, obscuro para a maioria, e de medida extrema, que deixaria um rastro de ressentimento.

Agora, como então, o ideal seria que o substituto fosse eleito pelo voto direto. A crise moral que corrói o sistema político é tão grave e profunda que somente um retorno à fonte de toda legitimidade -a soberania popular- pode restaurar a autoridade presidencial.

A Folha já declarou simpatia pelas emendas constitucionais que convertem a eleição indireta em direta nos casos de vacância verificada até seis meses ou um ano antes de o mandato expirar.

Não seria casuísmo, dado que mudanças constitucionais são comuns na vida política brasileira. Além disso, trata-se de universalizar, não de restringir, prerrogativas, devolvendo-se acesso a um direito democrático exercido pelo povo -a quem, diz a Constituição, o poder pertence.

Não há como negar, entretanto, que seriam imensos os obstáculos à aprovação de diretas já.

Desde logo, gigantesca pressão da sociedade, expressa em manifestações de rua comparáveis às de junho de 2013 ou março de 2016, teria de compelir três quintos dos parlamentares a aprovar a medida, talvez no bojo da reforma política em análise na Câmara.

O processo deveria, ademais, ocorrer em tempo recorde, que mesmo assim consumiria meses. Por outro lado, é indiscutível que a Constituição exige do Congresso a escolha do sucessor em 30 dias, desfecho a ser acatado como legítimo.

O governo Temer vem implantando um audacioso elenco de reformas estruturais que estão no rumo certo. Sua capacidade de seguir adiante com esse programa parece seriamente prejudicada.

Em algum momento, decerto nas eleições gerais de 2018, o caminho adotado será submetido ao escrutínio popular. Por ora, o mais importante, com ou sem Temer, é que governo e Congresso persistam nesse rumo, único capaz de nos livrar da recessão e preparar um futuro mais próspero e promissor.