quinta-feira, 7 de agosto de 2014

O diploma da profissão-fantasma, Luciano Martins Costa


Por Luciano Martins Costa em 07/08/2014 na edição 810
Comentário para o programa radiofônico do Observatório, 7/8/2014 
 
Uma nota na Folha de S. Paulo informa, nesta quinta-feira (7/8), que o Conselho de Comunicação Social do Congresso aprovou, por 6 votos a 4, a tramitação da Proposta de Emenda Constitucional que restabelece a obrigatoriedade do diploma de curso superior específico para o exercício da profissão de jornalista.
Um dos argumentos citados pelo jornal é o de que a qualificação universitária é necessária para o “bom jornalismo”. As opiniões contrárias, emitidas por representantes das empresas de mídia, apelam para aspectos legais, ao questionar a atribuição do Congresso para rever um tema sobre o qual há uma decisão do Supremo Tribunal Federal. Mas também é citada opinião segundo a qual “o bom jornalismo não é exercido apenas por profissionais com diploma universitário”.
Por falta de espaço, o que significa dizer falta de interesse, o diário paulista deixa o assunto flutuando no mesmo mar de imprecisões e argumentos dúbios que levou o STF a suspender a obrigatoriedade do diploma em 2009. A Proposta de Emenda Constitucional nº 386/2009, de autoria do deputado Paulo Pimenta (PT-RS), foi aprovada pelo Senado em 2012 mas não tem prazo para ir a votação na Câmara.
A imprensa acompanha o assunto com aparente desinteresse, comparando-se à grande mobilização que levou à decisão no STF por 8 votos a 1. Na ocasião, o argumento que convenceu a maioria dos ministros a aprovar o parecer do relator Gilmar Mendes foi o julgamento de um caso levado à Corte Interamericana de Direitos Humanos.
Na ocasião do intenso debate promovido por jornais, revistas e emissoras de televisão e rádio em 2009, os defensores do fim da obrigatoriedade do diploma tinham como ponto de apoio o julgamento de um processo, em 1985, no qual a Corte Interamericana condenava a regulação da profissão de jornalista na Costa Rica, onde o exercício do jornalismo era restrito a membros de uma entidade profissional.
O parecer da Corte Interamericana de Direitos Humanos não tinha relação com o caso brasileiro, onde nunca se exigiu que alguém fosse filiado a um sindicato, associação, conselho ou colegiado para exercer o jornalismo profissional.
Uma questão de justiça
Como sempre acontece com assuntos nos quais coloca seu interesse corporativo, a imprensa hegemônica no Brasil omitiu que se utilizava como jurisprudência um caso diverso do que estava em julgamento, e lançou mão do argumento segundo o qual a obrigatoriedade do diploma limitava a liberdade de expressão.
Acontece que a decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos nunca se referiu a uma lei federal condicionante do exercício profissional, como ocorria no Brasil, mas à colegiação obrigatória. A especificidade do caso costarriquenho pode ser percebida ainda mais claramente nos votos declarados por alguns dos julgadores daquela corte, que fizeram uma clara vinculação entre a questão do direito à liberdade de expressão e a associação em colegiado profissional.
Além disso, é interessante notar que, nos detalhes desses votos, os juízes que se justificaram discutem o papel dos colegiados de todos os tipos de determinar o que seriam “justas exigências de uma sociedade democrática”. Assim, colocam em questão, diretamente, entidades corporativas que manipulam o conceito da liberdade de expressão em função de seus interesses específicos.
O texto do julgamento pode ser encontrado, no original em espanhol, nos arquivos da Corte, sob o título “Colegiación obligatória de periodistas”. Os votos em separado (ver aqui) nunca se referem a outra questão que não a da associação em colegiado – caso absolutamente diverso da legislação brasileira que criou a obrigatoriedade do curso superior específico para o exercício do jornalismo como profissão.
No entanto, esse aspecto não foi considerado pelos ministros do Supremo Tribunal Federal, que se impressionaram com as alegações da imprensa sobre violação do direito à liberdade de expressão.
Desde que foi extinta a obrigatoriedade do diploma, o jornalismo passou a ser uma profissão-fantasma no Brasil. As empresas demitiram centenas de jornalistas, principalmente os mais experientes, as redações encolheram, e não consta que a possibilidade de contratar especialistas de outras áreas tenha melhorado a qualidade da imprensa.
A Proposta de Emenda Constitucional nº 386/2009 segue seu curso. Se aprovada, vai corrigir uma falha da Justiça. É só isso, mas é bastante.

China investe para vencer a guerra contra a poluição em todo o país, do Mundo Sustentável


Dependendo do número, a China já é a maior economia do planeta e entendeu que a poluição é o principal obstáculo ao crescimento. A guerra que a China declarou à poluição é o tema de uma série de reportagens especiais que o Jornal da Globo exibe, em parceria com o Globo Natureza.
Nem a maior e mais exuberante de todas as fortalezas já construídas pela humanidade foi capaz de proteger os chineses de novo inimigo. Ele está presente no ar que se respira, e quando não mata, causa doenças e limitações importantes no dia a dia.
A coluna Sustentável foi até a China para acompanhar de perto a guerra declarada por este país contra a poluição.

CONSUMO ENERGÉTICO
O primeiro-ministro Li Keqiang foi claro: a poluição é o inimigo. Um inimigo criado dentro de casa.
A energia que move a economia chinesa virou caso de saúde pública. O carvão mineral responde por 80% de toda a matriz energética do país e, há pelo menos três décadas, vem turbinando o crescimento à custa de muita fumaça.
Nos últimos dez anos, o consumo de energia mais que dobrou. Foi nesse período que a China ultrapassou os Estados Unidos como o maior poluidor do planeta e principal vilão do aquecimento global.
A energia suja ajudou o país a passar da condição de emergente para potência econômica, com direito a indicadores impressionantes de inclusão social. Praticamente inexistente na década de 1990, a classe média chinesa tem hoje quase 330 milhões de pessoas.

FEBRE DOS AUTOMÓVEIS
Achou muito? A China tem mais de 1,354 bilhão de habitantes, e 52% deles estão nas cidades (711.820.000). E não vieram de bicicleta, não. A febre dos automóveis pegou o chinês de jeito.
Em nenhum outro lugar do mundo a frota automobilística cresceu tão rápido quanto na China. O país hoje tem mais carros que os Estados Unidos e, a cada mês, são licenciados e emplacados mais 1 milhão de veículos.
OS resultado desse crescimento descontrolado são visíveis. Engarrafamentos que crescem a cada dia e o agravamento da poluição do ar.
Também pudera: toda essa frota consome 80 milhões de toneladas de gasolina por ano e 180 milhões de toneladas de óleo diesel. E tudo isso saindo dos escapamentos.

AR DIFÍCIL DE RESPIRAR
Fumaça do carvão, fumaça dos automóveis e um ar difícil de respirar.
O ar de Pequim é denso, pesado. Uma mistura de poeira, fumaça e partículas em suspensão. Quem está lá, logo sente os efeitos da poluição. Nariz entupido, olhos secos, garganta irritada são os sintomas mais comuns.
Neste inverno, no auge da poluição, respirar por um dia em Pequim teve o mesmo efeito que fumar um maço e meio de cigarros.
Sem alternativa, o jeito foi usar máscaras. Para muitos, porque é bom pra saúde. Para outros, por medo de doenças.

APLICATIVOS DE SAÚDE
Em um país onde a informação é controlada com mão de ferro, surpreende também o sinal verde do governo para que diferentes aplicativos reportem de hora em hora a qualidade do ar nas principais cidades do país. Os indicadores vão de muito ameaçador à saúde a saudável.
É consulta obrigatória antes de sair de casa ou do trabalho. Aplicativos, máscaras e equipamentos que filtram o ar dentro das casas ajudam o cidadão, mas não resolvem o problema.

MORTES COM A POLUIÇÃO
O governo não confirma, mas especialistas em saúde calculam que aproximadamente 500 mil chineses morram a cada ano em consequência de doenças causadas ou agravadas pela poluição do ar.
E o povo reclama. As queixas contra a poluição do ar mais que dobraram em Pequim, a capital, nos primeiros cinco meses deste ano. Não à toa o governo considera a poluição do ar mais grave. E a pressão dá resultados.
Para começar, o governo chinês decidiu fechar 50 mil fornos a carvão, modernizar as termelétricas, incentivar a energia solar e a eólica, retirar 6 milhões de veículos considerados ineficientes das ruas.
Além disso, acelerar o plantio de árvores em uma área equivalente a trezentos e 30 mil campos de futebol ainda este ano, e aprovou alterações da lei de proteção ambiental para dar mais poder aos fiscais.

PLANEJAMENTO AMBIENTAL
Jinnan Wang é o homem que aponta os caminhos a serem seguidos pelo governo.Vice-presidente da Academia Chinesa para o Planejamento Ambiental, o professor Wang diz quanto o governo pretende gastar: US$ 300 bilhões contra a poluição do ar; US$ 340 bilhões até 2020 na limpeza da água. E ainda mais: nas três regiões mais afetadas (Hebel, Tianjin e Pequim).
É muito dinheiro, mas os resultados não vêm rápido. O diretor do Centro de Investigação de Políticas Climáticas da universidade Tsinghua, em Pequim, professor Tzi Ié, um estudioso da questão, não arrisca previsões, mas garante que a China chega lá.

domingo, 3 de agosto de 2014

Em 2013, brasileiro produziu 3 milhões de toneladas de lixo a mais


ADRIANA FERRAZ - O ESTADO DE S. PAULO
02 Agosto 2014 | 03h 00

Volume é 4,1% maior em relação ao ano anterior; prazo para fim de lixões venceu, mas 40% dos resíduos têm destinação inadequada

Em vez de reduzir, o brasileiro produziu mais lixo em 2013. O aumento foi de 4,1% em relação ao ano anterior, o que representa quase 3 milhões de toneladas a mais no ano. Tais números não só situam o Brasil na quinta posição entre os que mais produzem lixo no mundo - atrás de Estados Unidos, China, União Europeia e Japão -, como confirmam que o País está longe de atingir as metas estipuladas pela Política Nacional de Resíduos Sólidos, instituída pela Lei 12.305, de agosto de 2010.
Na média por habitante também houve alta, de 0,39%, segundo levantamento inédito da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe). Já a coleta recuou. “Deixamos de coletar 10% de todo o lixo produzido. São cerca de 20 mil toneladas por dia que nem sequer foram para o lixão. Acabaram jogadas em córregos ou no meio da rua”, afirma o diretor-presidente da entidade, Carlos Silva.
Na lista de avanços previstos pela lei, a redução do volume de lixo é tratada como prioridade, assim como a eliminação completa dos lixões e, em seu lugar, a construção de aterros sanitários. Nesse quesito, o cenário também é negativo: 40% dos resíduos ainda têm destino inadequado, apesar de o governo federal ter estipulado a data de 2 de agosto como limite para cumprir a meta.
Nem alguns dos lixões mais emblemáticos do Brasil foram fechados. O lixão da Estrutural, a 16 quilômetros do Palácio do Planalto, em Brasília, está na lista. Com 124 hectares, recebe diariamente 2.700 toneladas de lixo produzido pelos 2,8 milhões de moradores do Distrito Federal.
 Só em 2060. Até a lei ser cumprida, porém, tanto o Estrutural quanto os demais lixões presentes em 3.344 dos 5.570 municípios brasileiros continuarão a receber milhares de toneladas de lixo por ano, contaminando o solo, o lençol freático e provocando danos à saúde da população. As Regiões Norte e Nordeste são as que apresentam os piores índices. Em ambos os casos, mais de 75% dos municípios descartam o lixo de forma inadequada. Nesse ritmo, segundo a Abrelpe, os lixões só terão fim no Brasil em 2060.
“Após quatro anos, os dados mostram que faltou vontade política. A instalação de um aterro sanitário é complexa, mas dá para ser feita em dois ou três anos”, diz o presidente do Sindicato das Empresas de Limpeza Urbana de São Paulo (Selur), Ariovaldo Caodaglio. No Estado, a situação está quase controlada - no ano passado, somente 8,5% do lixo seguiu para lixões.
Já o diretor comercial Alberto Fissore, da Estre - empresa especializada em serviços ambientais -, defende a ampliação do prazo para o fim dos lixões no País. “Creio que quatro anos tenha sido pouco dentro da tradição brasileira de planejamento. O saneamento não é prioridade dos políticos. A maior parte nem cita o tema. Acho que dá para estender por mais quatro anos. Aí, sim, será tempo mais do que suficiente.”
Oficialmente, o governo federal não se diz favorável à ampliação do prazo por até oito anos, mas tentará impedir que os prefeitos que não cumpriram as metas sejam punidos com multas ou processos em pleno ano eleitoral. “Esta é a hora de pressionar. Essa discussão precisa ir para as ruas”, diz Silva, da Abrelpe.