quinta-feira, 13 de outubro de 2011


Cresce dependência por transporte rodoviário

Com o avanço mais robusto da economia, o modal rodoviário voltou a ganhar participação no mercado

09 de outubro de 2011 | 3h 07
O Estado de S.Paulo
Os constantes congestionamentos de caminhões nas estradas e portos do Brasil não deixam dúvidas: a movimentação de carga está cada vez mais concentrada no transporte sobre rodas. Apesar dos planos do governo para diversificar a matriz nacional, o modal rodoviário voltou a ganhar participação no mercado enquanto a ferrovia e a hidrovia seguiram movimento contrário em 2010, segundo o Instituto de Logística e Supply Chain (Ilos).
Com o crescimento mais robusto da economia, o transporte rodoviário absorveu boa parte do aumento da demanda interna, que alcançou 1,4 bilhão de tku (toneladas por quilômetro útil) no ano passado. "O meio mais fácil para acompanhar o avanço da economia é o rodoviário, pois basta comprar o equipamento e colocar na estrada para rodar", diz Antonio Wrobleski, sócio da AWRO Logística.
Os caminhões foram responsáveis por 66% de toda carga movimentada no País em 2010 - acima dos 64% de 2008. As ferrovias transportaram 19,4%; as hidrovias, 11,3%; os dutos, 3,4%; e o aéreo, 0,05%. "As empresas até tentam usar outros meios, mas não conseguem por falta de capacidade das ferrovias e hidrovias", destaca o especialista em logística, Paulo Fleury, presidente do Instituto Ilos. Ele conta que numa pesquisa recente realizada com 100 empresas de 15 setores diferentes, 26% responderam que usam apenas o transporte rodoviário para movimentar suas mercadorias. Exemplo disso é que o fluxo nas vias pedagiadas teve um crescimento médio de 14% ao ano desde 2003.
Apesar da dependência do transporte rodoviário, o Brasil é carente de boas estradas. Apenas 11% da malha nacional é pavimentada e, mesmo assim, a qualidade é questionável. Hoje é normal um caminhão percorrer mais de mil quilômetros (km), cortando o País de norte a sul em estradas asfaltadas e de terra, para recolher e entregar as mercadorias. Do ponto de vista econômico, o mais vantajoso seria transferir a carga de longa distância para ferrovias e hidrovias e deixar o caminhão só para viagens mais curtas, diz Wrobleski.
Mas a malha ferroviária está muito aquém das necessidades e da mudança geográfica do agronegócio no País. Até bem pouco tempo, o Estado do Mato Grosso, que tem se tornado um importante produtor de soja, não tinha nenhum quilômetro de trilho para escoar sua produção. A maioria da soja era transportada de caminhões para os portos de Santos (SP) e Paranaguá (PR). Uma pequena parte seguia pelos rios rumo aos terminais da região Norte. Há cerca de dois anos, a ferrovia começou a operar até a fronteira. Nos próximos meses chegará ao centro do Estado.
O mapa ferroviário do Brasil ainda é restrito. Tem apenas 28 mil km. Mas há, pelo menos, quatro empreendimentos que podem aliviar a matriz nacional de transporte: as ferrovias Norte Sul, Integração Oeste Leste, Nova Transnordestina e Ferronorte. O problema é que o ritmo dessas obras está muito lento, diz Paulo Fleury.
"Tínhamos a esperança de que os modais ferroviários e hidroviários evoluíssem. Mas isso não ocorreu", destaca o presidente da Veloce Logística, Paulo Guedes. Segundo ele, 99% do transporte feito pela empresa é rodoviário. "Por que somos rodoviaristas? Porque é meio mais rápido de transporte no País e o preço ainda é razoável." / R.P.


Eclusas de Tucuruí só operam com o rio cheio

Inaugurada por Lula no ano passado, obra foi interrompida e transporte ficou limitado

09 de outubro de 2011 | 3h 07
RENÉE PEREIRA - O Estado de S.Paulo
Foram quase três décadas de construção, R$ 1,6 bilhão gastos e muita dor de cabeça até aquele 30 de novembro de 2010. Era tarde de terça-feira, quando o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva desembarcou em Tucuruí, com sua sucessora, Dilma Rousseff, a tiracolo para fazer o que outros seis presidentes da República não conseguiram: inaugurar as emblemáticas eclusas de Tucuruí, no Rio Tocantins, que ampliariam em 1,6 mil quilômetros o transporte hidroviário no País.
O discurso foi regado a elogios e uma sensação de orgulho por tirar aquele projeto do papel. Mas a boa notícia ficou nisso. Depois da inauguração com pompa e circunstância, surgiram os primeiros entraves.
As obras complementares para tornar o rio navegável não foram realizadas e o transporte de carga está limitado. Trata-se da derrocagem (retirada de pedra) do Pedral de São Lourenço, que fica próximo de uma das eclusas de Tucuruí.
Sem a obra, os comboios com milhares de toneladas de carga não conseguem ultrapassar um trecho de 35 km durante o período seco do rio, entre agosto e janeiro. Nessa época do ano, somente pequenas embarcações trafegam no local.
"Com isso, apenas podemos usufruir das eclusas durante a cheia", afirma Luiz Carlos Costa Monteiro, presidente da Companhia Siderúrgica do Pará (Cosipar), controladora da MC Log, empresa de navegação que atua no Norte do País.
Foi a companhia que inaugurou o empreendimento no ano passado, quando o então presidente Lula visitou o local. Depois disso, as eclusas entraram em comissionamento e testes. A operação regular entre Marabá, Barcarena e Belém apenas teve início em julho deste ano. Mas no final de agosto teve de ser interrompida por causa da seca do rio e da falta de navegabilidade no trecho do Pedral de São Lourenço, conta Monteiro.
"Com a derrocagem, poderíamos fazer 100% do transporte da Cosipar pela hidrovia." A empresa já encomendou três novos comboios de 18 mil toneladas cada para ser usado na nova rota de transporte. "O primeiro já está pronto, mas só poderá começar a operar no ano que vem durante a cheia."
Para permitir a navegabilidade o ano todo, será necessário retirar do fundo do rio 693 mil metros cúbicos de rocha. O Ministério dos Transportes afirma que a obra já tem projeto e licença ambiental concedida, mas não foi iniciada porque o governo decidiu fazer um novo estudo para redução dos custos. A previsão inicial era gastar R$ 520 milhões com a derrocagem, dragagem e sinalização do rio. Os serviços durariam cerca de 30 meses.
Ou seja, ainda vai demorar algum tempo para a Hidrovia Araguaia-Tocantins ganhar impulso e ligar o Porto de Belém à região do Alto Araguaia, no Estado de Mato Grosso. Para especialistas em logística, a nova rota tem potencial para reduzir em até 15% o custo do frete na região produtora de grãos. As duas eclusas de Tucuruí têm capacidade de 40 milhões de toneladas por ano ou 24 comboios por dia nas duas direções.


Da contracultura, Steve Jobs fez uma revolução digital

Categoria: EmpresasInternet
Renato Cruz
Continuem famintos. Continuem tolos. “Stay hungry. Stay foolish.” Assim Steve Jobs terminou seu famoso discurso a formandos da Universidade de Stanford, em 2005. A frase foi tirada da contracapa da edição de outubro de 1974 do ‘Whole Earth Catalog’. Símbolo da contracultura, era catálogo de produtos voltados para um estilo de vida criativo e autossustentável.
Morto na última terça-feira, o cofundador da Apple fez, como ninguém, a ponte entre a geração de beatniks que se reunia na livraria City Lights em San Francisco e os nerds que deram origem à era digital nas garagens do Vale do Silício. Em 1968, quando estudantes clamavam pela revolução em câmpus universitários de todo o mundo, Jobs tinha somente 13 anos. Mas ele levou a ideia adiante e detonou uma revolução anos depois, ao criar a Apple com Steve Wozniak.
Antes da Apple, quando trabalhava na Atari, Jobs fez uma viagem à Índia, para conhecer o guru Neem Karoli Baba. Lá, adotou o budismo como filosofia de vida. De volta à Califórnia, participou de sessões de terapia do grito no Centro Zen de Los Altos. Certa vez, disse ao jornalista John Markoff que tomar LSD foi “uma das duas ou três coisas mais importantes que fez na vida”.
O telefilme Piratas do Vale do Silício, de 1999, conta a história da criação da Apple e da Microsoft. Numa cena do início do longa-metragem, o ator Noah Wyle interpreta um jovem Steve Jobs, de cabelos compridos e barba, que, numa viagem de ácido, se imagina um maestro que rege o universo.
Jobs se considerava um artista. E exigia que a equipe de desenvolvimento da Apple produzisse arte. No documentário O triunfo dos nerds, criticou a Microsoft com argumentos que não tinham nada a ver com tecnologia: “O único problema com a Microsoft é que eles não têm gosto. Quero dizer de uma maneira ampla, no sentido de que eles não têm ideias originais e não colocam muita cultura em seus produtos.”
Depois do lançamento do documentário, meio que se desculpou: “Só acho que ele (Bill Gates) e a Microsoft são um pouco limitados. Ele seria um cara mais amplo se tivesse tomado ácido uma vez ou ido a um ashram (eremitério hindu) quando mais jovem.”
Diferentemente de Jobs, Bill Gates não cresceu numa cidade da Califórnia, mas em Seattle, ao norte dos Estados Unidos, e estudou em Harvard, na Costa Leste, onde a diversão eram partidas de pôquer, e não viagens lisérgicas.
Precursor
O Whole Earth Catalog era editado pelo escritor Stewart Brand. Não foi à toa que Steve Jobs escolheu uma referência a Brand para fechar seu discurso em Stanford. Brand criou o aforismo “a informação quer ser livre”. Brand trabalhou numa equipe liderada por Douglas Engelbert, que apresentou, em 1968, tecnologias que se tornariam realidade muitos anos depois, como o mouse, a videoconferência e o hipertexto. Em 1985, foi um dos fundadores do serviço The Well (sigla de Whole Earth ‘Lectronic Link), uma comunidade virtual pioneira.
No mês passado, quando recebeu a reportagem do Estado na sede da revista Wired, em San Francisco, o escritor Chris Anderson falou sobre a influência da contracultura no Vale do Silício. “Stewart Brand é um grande amigo meu”, disse Anderson. “O Whole Earth Catalog representava a noção de individualismo, de movimentos de baixo para cima, de autossuficiência e de que as pessoas podem mudar o mundo de uma maneira que as instituições não podem.”
O slogan “Think different” (pense diferente), que foi usado pela Apple há algum tempo, refletia essa postura. A campanha trazia imagens de ícones do século 20, como Albert Einstein, Bob Dylan, Martin Luther King, John Lennon, Mahatma Gandhi, Amelia Earhart e Pablo Picasso.
O famoso comercial de lançamento do Macintosh em 1984, dirigido por Ridley Scott, também procurava passar essa mensagem contracultural. Nela, uma heroína, que representava o Macintosh, destruía uma tela gigante que mostrava o Grande Irmão. Na cabeça dos telespectadores, a imagem do Grande Irmão acabava sendo associada à IBM, que dominava o mercado de tecnologia na época.
Não deixa de ser irônico a Apple ter usado conceitos de cultura alternativa num comercial para ser exibido durante o Super Bowl, final do campeonato de futebol americano, horário mais caro da televisão dos Estados Unidos.