segunda-feira, 11 de julho de 2011

Custo da ampliação da Marginal do Tietê já é 75% maior do que o previsto

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Gastos chegaram a R$ 1,75 bilhão, com mais R$ 200 milhões para ponte estaiada e outras obras; em 2008, estimativa era de R$ 1 bi

10 de julho de 2011 | 21h 35
Paulo Saldana e Rodrigo Burgarelli - O Estado de S. Paulo
SÃO PAULO - Apesar de as novas pistas da Marginal do Tietê terem sido abertas há quase um ano e meio, as obras de ampliação continuam consumindo dinheiro dos cofres públicos. Uma nova atualização no valor do convênio firmado entre Prefeitura de São Paulo e governo do Estado colocou mais R$ 200 milhões na obra no fim de junho. O custo da Nova Marginal chega a R$ 1,75 bilhão - 75% acima do estimado no primeiro orçamento, de 2008.
José Patrício/AE
José Patrício/AE
Vista da ponte estaiada no acesso à marginal Tietê
No total, seria possível construir 300 escolas ou 7 hospitais de 200 leitos cada com os R$ 750 milhões extras que já foram gastos com a avenida. O aumento de custos é resultado da inclusão de serviços que não estavam previstos pela Desenvolvimento Rodoviário S. A. (Dersa), empresa responsável pela obra.
Em fevereiro deste ano, só faltava terminar a ponte estaiada do Complexo Bandeiras, que vai facilitar a entrada dos veículos na Avenida do Estado a partir da Marginal - prevista no projeto inicial, em 2008.
A nova injeção de recursos não será dirigida apenas para a nova ponte. Segundo a Dersa, os R$ 200 milhões são necessários para obras secundárias, como travessias subterrâneas para passagens de cabos para iluminação, complementos de barreiras de concreto e o alargamento da pista local para implantação da 4.ª faixa entre as Pontes do Limão e Casa Verde. Esta última ainda não foi concluída, e não foi informado prazo para o término dos trabalhos. A Dersa não revelou a lista completa de ajustes ainda por fazer.
Já a ponte estaiada, prometida para dezembro de 2010, teve sua inauguração postergada para junho deste ano e, agora, a promessa é que ela seja aberta parcialmente ao tráfego até o final de julho. O custo total da estrutura foi de R$ 85 milhões, sem incluir a iluminação e a alça de acesso ao Bom Retiro, na região central, que não será inaugurada este ano.
As novas lâmpadas para a ponte também estão incluídas na atualização do convênio entre Prefeitura e Dersa feita no mês passado. Com a inauguração da ponte, cerca de 20 mil veículos por dia que vêm da Avenida do Estado poderão entrar diretamente nas pistas central e local da Marginal do Tietê no sentido Castelo Branco. Atualmente, é necessário virar à direita na continuação da Avenida Tiradentes, atravessar a Marginal, contornar a Praça Campo de Bagatelle e seguir pela Avenida Olavo Fontoura, que passa ao lado do Sambódromo do Anhembi.
Explicações
Os convênios são instrumentos jurídicos que viabilizam o repasse de recursos para a execução da obra. No caso da Marginal, o primeiro foi assinado em 25 de fevereiro de 2008, no valor de R$ 1 bilhão, quando se deu o pontapé inicial para os trabalhos. Progressivamente, novas atualizações foram feitas para que a Dersa pagasse os serviços considerados necessários para a continuação da obra.
Em relação aos motivos dos aumentos, a empresa afirmou que, como o projeto de engenharia e o licenciamento ambiental foram concluídos após a assinatura do convênio, somente com a finalização desses trabalhos é que foi possível obter uma "estimativa mais realista sobre o custo do empreendimento". Outra justificativa para os aditamentos foi a inflação, já que o convênio não possui cláusulas para reajuste automático da correção monetária.
A empresa disse também que há a possibilidade de não usar todo o valor das atualizações, mas não informou quanto dos R$ 200 milhões será usado ou economizado.

Acesso para Bom Retiro não tem data para ficar pronto

Quem trafegar pela Avenida do Estado em direção à nova ponte estaiada poderá ver uma entrada incompleta a cerca de 10 metros de altura, mais ou menos na metade da subida da ponte. Trata-se de um acesso direto ao bairro do Bom Retiro que estava previsto para ser inaugurado com a nova ponte, mas que ainda não tem data para sair do papel.
A alça terá cerca de 200 metros de extensão e funcionará como uma espécie de retorno para quem vem da Av. Presidente Castelo Branco - o atual acesso da pista local da Marginal à Avenida do Estado para os motoristas que trafegam no sentido Ayrton Senna. Segundo a Dersa, ainda faltam desapropriações de imóveis do bairro para concluir a alça, que custará R$ 55 milhões.
Enquanto o acesso não estiver pronto, blocos de concreto vão bloqueá-lo para evitar acidentes após a inauguração da parte principal da ponte.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Você está em Economia
Rolf Kuntz
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A armadilha

06 de julho de 2011 | 0h 00
Rolf Kuntz - O Estado de S.Paulo
A presidente Dilma Rousseff está numa armadilha. Seis meses depois da posse ela continua enrolada em trapalhadas e escândalos criados por ministros comprometidos muito menos com ela do que com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Só a força desse esquema explica a sobrevivência do ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento, depois da demissão de quatro de seus mais importantes auxiliares. Diante do escândalo e da reação da presidente, o ministro convocou uma reunião partidária. Foi uma óbvia demonstração de força para intimidá-la. O recado é claro: se houver demissão, o governo se arriscará a perder os votos do PR, componente da base parlamentar montada por Lula. Se ficar acomodada, a presidente confirmará uma das piores profecias do ano passado: seu papel principal será ocupar a cadeira até a volta do Grande Líder. Se quiser governar de fato, precisará libertar-se e para isso terá de fazer muito mais que demitir o ministro Alfredo Nascimento.
A presidente Dilma Rousseff gastou boa parte do primeiro semestre - um oitavo de seu mandato - enfrentando problemas criados por ministros e tentando fazer funcionar uma administração emperrada. Uma das heranças mais complicadas e mais custosas do governo anterior é o compromisso de hospedar no Brasil a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016. Todas as obras estão muito atrasadas, porque nada se fez em quatro anos para cumprir as promessas. As obras dos estádios vão mal, mas o ministro do Esporte, Orlando Silva, continua no cargo, embora sua capacidade administrativa tenha sido testada amplamente, com péssimo resultado, já no governo Lula. Seu desempenho atual é apenas a continuação do observado nos anos anteriores, talvez com alguma piora. O Tribunal de Contas da União recentemente o acusou de tentar ocultar informações sobre as despesas da Copa. Terá a presidente notado essa acusação?
O ministro dos Transportes é um velho conhecido da presidente. Quando ministra da Casa Civil, no governo anterior, ela já o havia cobrado pela demora na realização de projetos. Chegou a expô-lo a uma situação constrangedora numa acareação diante do presidente Lula. Nenhuma surpresa, portanto, exceto, talvez, por um detalhe: uma farra das proporções apontadas pela Veja pode ter ido além de suas expectativas.
Com a criação da Secretaria da Aviação Civil, em março, a presidente pareceu disposta a mexer na herança de incompetência administrativa. A nova secretaria assumiu algumas funções antes subordinadas ao Ministério da Defesa e passou a controlar a Infraero. A mudança deveria servir para o governo apressar a construção e a reforma de aeroportos. Também essas obras estavam atrasadíssimas, embora o governo as tivesse previsto quando se comprometeu com a realização dos jogos.
Os atrasos continuam. As mudanças provavelmente foram insuficientes para tornar a administração do setor mais dinâmica. De janeiro a abril, segundo a organização Contas Abertas, a Infraero investiu apenas 6,5% dos R$ 2,2 bilhões orçados para 2011. Tudo isso ajuda a explicar a decisão do Palácio do Planalto de privatizar alguns dos principais aeroportos, mas, mesmo assim, o cumprimento dos prazos continua duvidoso.
Uma das heranças mais pesadas - e já muito comentada - foi deixada no Ministério da Educação, uma das principais fontes de encrencas para a administração da presidente Dilma Rousseff. Nenhum princípio gerencial explica a tolerância a esse foco de problemas.
A herança inclui também o presidente do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Luciano Coutinho, e a orientação definida para a instituição no governo anterior. O administrador, nesse caso, pode ser bem preparado e eficiente, mas a estratégia continua sendo a de criar os tais "campeões nacionais". O desastrado envolvimento do BNDES no projeto de fusão do Pão de Açúcar com o grupo francês Carrefour é mais um capítulo de uma longa série de desacertos quase cômicos. O governo ainda pode abandonar essa aventura imprudente e despropositada, evitando o risco de graves complicações legais. Mas o cidadão brasileiro terá motivos para se preocupar enquanto persistir a política do governo anterior. O custo dessa política para o Tesouro é apenas uma parte do problema. Seus aspectos mais graves são outros, a começar pelo caráter autoritário e arbitrário dessa forma de intervenção. Planejamento econômico é outra coisa e passa longe da concessão de benesses a alguns eleitos.
Será difícil escapar da armadilha. A coalizão de governo é essencialmente uma aliança para a divisão das vantagens acessíveis, por bem ou por mal, a quem exerce o poder. A presidente Dilma Rousseff terá de ser corajosa e hábil para quebrar as amarras sem sofrer grandes danos. Será muito arriscado. Mas, se não o fizer, nunca assumirá de fato o governo.
JORNALISTA 

O problema do ''ex''


06 de julho de 2011 | 0h 00
Roberto Damatta - O Estado de S.Paulo
Depois dos 80 anos bem vividos e sucedidos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, a quem eu envio meus parabéns pela passagem do seu aniversário; e da passagem definitiva do igualmente ex-presidente e senador Itamar Franco, a quem eu rendo modesta homenagem pelo que fez pelo Brasil, vale especular sobre o que é ser um "ex".
Sobre o que significa deixar de ter sido um protagonista de um cargo ou papel social. Todos, diga-se logo, somos "ex" de alguma coisa ou pessoa. Por isso, o prefixo tem um lado ambíguo quando não claramente negativo, sobretudo em sociedades como a nossa, na qual a regra é sempre acumular poder (sobretudo o poder público) e, assim, multiplicar nosso patrimônio (real ou simbólico), porque os rios correm para o mar e quem é rei jamais perde a majestade. Nosso ideal é ficar por cima da carne-seca; isto é, por cima das leis. De todas as leis!
Hoje, temos uma clareza muito maior das diferenciações e das contradições entre atores e papéis, sobretudo os que se realizam por meio de cargos públicos. Mas chegar a essas distinções entre atores e papéis não é fácil num sistema que ainda não conseguiu desmistificar-se e até hoje deseja ter ídolos, e resiste a abandonar velhas hierarquias e utopias políticas ultrapassadas. Ainda somos o país do "maior" disso ou daquilo e do "número 1" nisso ou naquilo. Amamos as hierarquias que nos distinguem uns dos outros e nos situam como privilegiados, mas, simultaneamente, queremos também a igualdade e continuamos a ter o coração do lado dos pobres e dos oprimidos. As duas mãos, como o papel e o ator, ainda não se encontraram.
No fundo, distinguir pessoas de papéis é poder ver com clareza os sacrifícios impostos pelos cargos, pois se eles são do povo, é a coletividade quem os controla. Mas não é fácil fazer isso sem perder de vista o modo pelo qual os atores deles se apropriam. Pois se o papel coage, obrigando a enxergar deveres, os atores que neles entram quase sempre só querem ver os seus privilégios. Esse encontro do papel (que não nos pertence) e do ator que cada um de nós pode ser conduz à tal "ética" e ao tal "bom-senso", tão em pauta neste Brasil que vai ficando cada vez mais igualitário.
Hoje, o mal-estar da política está justamente nessa apropriação de cargos públicos sem uma discussão apropriada dos laços que devem unir os atores aos cargos públicos (ou coletivos) que ocupam. A democracia depende dessa conta de chegar, pois os cargos são instrumentos da coletividade e não marionetes de partidos e de pessoas.
Mas não se precisa ir muito longe para ver que o diálogo entre atores que abusam do papel e o papel que precisa englobar os atores é o grande drama de todo processo democrático igualitário. Pois, o que é um caudilho ou um ditador senão um sujeito que se apossou do papel de presidente da República, violando-o quando o interpreta do ponto de vista dos seus privilégios e jamais dos seus deveres? No Brasil, a eleição ainda é um mecanismo que sanciona mais o abuso do ator no papel do que o seu contrário.
Aliás, em certos países, quem ocupa um cargo público tem a sua vida pessoal controlada. A entrada num cargo do Estado obriga a redefinir os laços com a sociedade, pois, como dizia Tom Paine em pleno século 18, a sociedade é positiva e diz sim; ao passo que o Estado é sempre controlador, disciplinado e negativo, dizendo não. Um vai na nossa direção com suas amizades e seus compadrios; o outro, porém, com seus impostos e obrigações, vai contra nós. A democracia é um cabo de guerra entre essas duas tendências. Tensão para a qual não há leis ou códigos, mas apenas bom-senso e senso de limites.
Daí o elo importante entre saber ser um "ex" quando se ocupa certos cargos. A demanda de transparência (e de consciência) entre o mundo público e o universo privado - entre a casa e a rua - é um tema complexo e delicado, mas fundamental numa sociedade que adotou o ideal da igualdade e da democracia como guia ou causa perdida. Essas causas, acrescento com Frank Capra, pelas quais vale a pena viver e lutar.
Não é preciso fazer um curso de sociologia para compreender que nos comunicamos com o mundo por meio de personagens que nos são impostos por nosso grupo social. Tomamos consciência da vida através de papéis. Primeiro, como crianças, como pessoas que pertencem a uma casa onde passamos a jovens. Em seguida, viramos pais e pessoas maduras, prontas a serem julgadas por aqueles que nos criaram ou viram crescer. Finalmente, viramos velhos com a obrigação de tudo compreender, tudo dar e segurar tudo que nos atinge. Após esse tango interminável, parecido com uma masturbação sem orgasmo, somos aposentados e - doentes ou fisicamente exaustos - morremos e viramos aquele complexo "ex" eterno que cabe aos mortos.
Não é fácil ocupar papéis exclusivos e importantes como o de presidente da República numa sociedade cujo credo oscila entre leis e pessoas como solução para seus problemas. Pois todo presidente, sendo uma pessoa e tendo o poder de legislar, tem as duas capacidades. Por isso, figuras como Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso são raras. O primeiro, porque colocou o papel acima de sua pessoa e buscou consolidar instituições em vez de seguir o caminho do populismo. Hoje ele repousa na glória de sua vida produtiva. O segundo porque revela ao País que o "ex-presidente" representa o Brasil na sua integridade de sociedade e de Estado. Como um "ex" fora do sistema de politicagem, ele faz Política com "p" maiúsculo. Pois sabe que a Presidência não é de ninguém e, assim, demonstra pelo exemplo que ela deve ser preservada de causas menores, devendo ser tão grande quanto o povo a quem deve honrar e servir.