Referência para frequentadores da região central de São Paulo, o Café Girondino fechou suas portas na última segunda-feira (3). Atendendo 30% do público habitual na comparação com a frequência pré-pandemia, a direção do restaurante que funciona há 26 anos diante do Mosteiro de São Bento decidiu encerrar a operação.
Com arredores esvaziados devido à adesão em larga escala de empresas do setor financeiro ao home office e à "persistente sensação de insegurança que afugenta turistas" do centro histórico paulistano, a operação se tornou financeiramente insustentável, segundo Felippe Nunes, gerente comercial que trabalha na casa desde o início dos anos 2000.
Nunes vem representando o Girondino em diversos encontros de empresários e do poder público para discutir a revitalização do centro, mas a avaliação agora é de que chegou ao limite.
"O centro está melhorando, o policiamento aumentou, as pessoas estão voltando a frequentar, mas esse aumento do público não está ocorrendo na velocidade que precisamos", diz o gerente. "A pandemia machucou demais a gente, o faturamento chegou a cair para 3% do normal", comenta.
Inaugurado em 1998 em um prédio que pertencia à Santa Casa de Misericórdia e foi construído pelo Metrô como contrapartida pela inauguração da estação São Bento, em 1975, o Girondino tem uma relação ainda mais antiga com a cidade de São Paulo, conta Nunes.
O restaurante foi inspirado no café homônimo que funcionou entre 1875 e a década de 1920 na esquina da rua 15 de Novembro com a praça da Sé. O local era ponto de encontro para transações comerciais entre barões do café.
A recriação, no final da década de 1990, manteve a tradição de receber frequentadores do mundo dos negócios. Operadores e investidores da Bolsa de Valores ajudavam a manter o local lotado durante a semana. Já perto dos anos 2010, pregões presenciais foram totalmente substituídos por negociações eletrônicas.
A ausência dos profissionais da Bolsa era compensada pela presença de servidores públicos de órgãos estaduais que passaram a funcionar no entorno, além dos bancários, na época em que a 15 de Novembro ainda tinha o apelido de "rua dos bancos".
"Enfrentamos muitas transformações, mas nada se compara ao que aconteceu na pandemia", diz Nunes.
A casa de 250 lugares distribuídos em três andares e cerca de 400 metros quadrados ainda é referência para turistas que frequentam a região aos sábados, único dia em que tem lotação parecida à dos bons tempos. Muitos visitantes são atraídos pelo comércio da rua 25 de Março, mas alguns vão especialmente ao local para conhecer o café.
"Sabemos que o Girondino é um local de destino e o seu fechamento vai agravar ainda mais o esvaziamento do centro, mas eu peço às pessoas que venham, que conheçam outros cafés e restaurantes daqui, muitos são maravilhosos", afirma.
As gestões do prefeito Ricardo Nunes (MDB) e do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) têm colocado em curso uma série de iniciativas para tentar reverter a tendência de esvaziamento da região central, agravada pela pandemia, mas que também foi impactada pelo espraiamento das cenas abertas de consumo de crack, as chamadas cracolândias.
A presença de pessoas em situação de rua e de usuários de drogas está entre as principais reclamações da população, segundo o Datafolha.
A região onde funcionava o Café Girondino é alvo de um programa de incentivos municipais para a recuperação de edifícios antigos para serem transformados, principalmente, em moradias.
Há cerca de dois meses, o governo estadual também lançou uma parceria público-privada com a previsão de R$ 2,4 bilhões em investimentos em moradia na área central da capital.
A avaliação dos resultados desses programas, porém, demanda tempo. Alguns dos projetos anunciados podem levar cerca de cinco anos para serem concluídos.
Até mesmo o Plano Diretor da cidade, que desde 2014, na gestão Fernando Haddad (PT), dá incentivos financeiros para a ocupação de áreas coma maior infraestrutura de transporte, que é o caso do centro, ainda não conseguiu aumentar a quantidade de moradores permanentes na região, conforme mostraram dados do Censo 2022 do IBGE.
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