Luiz Inácio Lula da Silva terá a chance de escolher, pela segunda vez, o presidente do Banco Central. As comparações com o passado são inevitáveis agora que a indicação se dará em meio a um desgastante tiroteio, que tem produzido mais ruídos do que ganhos para o presidente da República.
Na primeira vez, Lula, eleito para o seu primeiro mandato na Presidência em 2002, escolheu no finalzinho da transição um então ex-banqueiro, na época recém-eleito deputado federal pelo PSDB.
Henrique Meirelles teve seu nome aprovado pelo Senado somente no final de dezembro, faltando poucos dias para a posse de Lula em 1º de janeiro de 2003.
Na época, havia uma grande preocupação no governo eleito de a economia não andar bem, após Fernando Henrique Cardoso ter assinado um acordo de US$ 30 bilhões com o FMI.
O acerto com o fundo previa a liberação de US$ 24 bilhões a partir de 2003 e estava explícito que, para receber o socorro, o novo governo deveria preservar a política macroeconômica do governo FHC.
O trauma vivido pelo argentino Fernando de la Rúa, que renunciara à Presidência um ano antes, após 36 horas de violência social, caracterizada por saques a supermercados e por manifestações de protesto aos milhares, rondava o novo governo. O medo era de errar na economia.
Acordado com Lula, Meirelles assumiu o compromisso público com senadores de que o novo governo aprovaria lei dando autonomia ao BC.
A promessa feita a senadores (nunca cumprida nos oito anos em que Meirelles foi presidente do BC) provocou forte reação dos parlamentares do PT.
Os bastidores da transição e da escolha de Meirelles foram revelados 20 anos depois no livro "Eles não São Loucos!", do jornalista João Borges —chefe da comunicação do BC na época da transição, quando Armínio Fraga era o presidente da instituição.
Nesta segunda indicação, as circunstâncias econômicas e políticas que cercam a escolha de Lula são diferentes. Lula escolherá o presidente do BC já com quase metade do seu mandato transcorrido e diante de uma conjunção de fatores que tem alimentado incertezas sobre a política fiscal e o futuro das contas públicas.
Em 2002, as contas públicas do setor público consolidado estavam superavitárias em 4% do PIB. No ano passado, primeiro do Lula 3, fechou com déficit de 2,29% do PIB –rombo de R$ 249,12 bilhões. Inflação e juros muito mais altos.
Lula adotou agora a estratégia política de polarização ao carimbar Roberto Campos Neto, atual presidente do BC, como adversário e inimigo do país. Tem insistido na tese de que Meirelles tinha autonomia com ele e que não interferia na autoridade monetária.
A vantagem era que podia demiti-lo, como disse o próprio presidente em entrevista recente: "Meirelles era uma pessoa, era um cara que eu tinha o poder de tirar, como Fernando Henrique Cardoso tirou tantos, como outros presidentes tiraram tantos".
Nem tudo, porém, eram flores com Meirelles, como as falas recentes de Lula indicam. Quando o BC aumentou os juros em 2005, Lula cobrou duramente Meirelles com temor de a alta da Selic se constituir em ameaça real para os dois anos finais do seu mandato, interrompendo o crescimento de 2004. Outros tantos momentos de tensão aconteceram.
A diferença é o que Lula tinha com Meirelles, e que não tem com Campos Neto: linha direta.
Mas o trabalho do próximo presidente do BC (Gabriel Galípolo segue como favorito) dependerá do alcance da resposta que a equipe do ministro Fernando Haddad (Fazenda) dará para afastar as incertezas.
Lula pode ajudar ou piorar mais cenário. Para fortalecer o processo de transição, menos ruído e mais calmaria seriam bem-vindos.
Campos Neto deve sair temporariamente de cena nos próximos dias. Após viagem já marcada para esta quinta-feira (27), deve tirar férias.
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