Venho alertando, desde o ano passado, que Campos Neto ameaçaria a credibilidade do Banco Central se atuasse como central sindical do rentismo. Depois de espalhar pânico no mercado com suas manifestações públicas antes da reunião do Copom de maio, ele esticou a corda ao aceitar ser ministro da Fazenda em um hipotético governo Tarcísio de Freitas; agora pôs-se a espalhar informações catastróficas sobre a situação do governo.
Encurralado pelas ações desse quinta-coluna, o Copom precisou demonstrar unanimidade na parcimônia monetária, interrompendo os cortes da Selic, a qual não deve baixar de 10,5% até 2025. A despeito da incerteza no cenário externo, havia espaço seguro para cortes, pelo menos até 9%, como mostrou meu colega Bráulio Borges em artigo recente para o Ibre-FGV.
A manutenção da Selic interrompe a queda do serviço de juros da dívida, forçando ajuste fiscal mais austero para controlar a dívida. Cresce a pressão por substituir cortes nos gastos tributários —onde campeiam os privilégios dos fiscalistas do bolso alheio— pelos cortes em benefícios sociais.
O cerco sobre o governo tende a se fechar ainda mais. Esse freio de arrumação nas políticas monetária e fiscal (com sinalização de cortes de gasto pela Fazenda) pode aliviar as restrições para o futuro presidente do BC liderar um processo robusto de queda da Selic, mas não há garantias.
Ao analisar a "arriscada diplomacia econômica" de Haddad (21/4/23), destaquei o prazo curto que o ministro teria para mostrar resultados, os quais não seriam aceitos sem resistência. O motivo é simples: a agenda do governo Lula desacelera os ganhos passivos e subtributados do rentismo. A queda da Selic e a diminuição da influência política do mercado na gestão da Petrobras forçariam os gestores de ativos financeiros a sair de sua zona de conforto e aumentar a participação de ativos de risco e investimentos produtivos em suas carteiras.
Por esse motivo, a Faria Lima vem cobrando sucessivos pedágios pela governabilidade: a redução da meta de inflação de 3,5% para 3% ao ano, a imposição de um duro ajuste fiscal (com cortes de gastos sociais) e a manutenção da criminosa privatização da Eletrobras.
Essa linha de defesa recessiva tem sido eficaz. Os números do PIB no primeiro trimestre mostram os efeitos da retranca financista: o investimento cresceu 4,1%, estimulado pelas medidas tributárias do governo e pela queda da Selic desde agosto de 2023, mas ainda está em patamar muito baixo: 16,9% do PIB.
Não fossem os dribles do governo a essa zaga barulhenta —lembrando que drible não é impedimento—, a taxa de desemprego no país não teria caído a 7,5% no trimestre móvel encerrado em abril, a menor taxa para o período desde 2014.
Entretanto, os investimentos públicos correm atrás da depreciação do capital, fruto da restrição fiscal e do feudalismo orçamentário do centrão. Com queda de 0,5% em abril, a indústria de transformação se arrasta, com o esgotamento dos incentivos ao setor. Sem queda dos juros, é impossível retomar a capacidade industrial do país, e a transição ecológica fica mais distante.
Com um presidente da República (corretamente) desobediente à censura de suas falas sobre a política monetária, o mercado elevou os prêmios de risco cobrados nos títulos da dívida pública em toda a curva de juros. Há nesse meio quem "preveja", com base em puro voluntarismo, elevação da Selic neste ano. O desespero é tanto que há suspeitas de manipulação das previsões do IPCA, no boletim Focus, a partir de 2025, sob nova presidência do BC. Se for comprovada a farsa, o rentismo terá inventado a previsão de protesto!
Exigiu-se autocrítica de Lula, mas nenhuma de Campos Neto. No debate econômico brasileiro, afinal, o pau só bate em Chico.
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