As revelações do senador Marcos do Val (Podemos-ES) sobre mais um plano golpista de Jair Bolsonaro podem surpreender pelo enredo, mas não pela disposição. A essa altura, está mais do que claro que Bolsonaro passou, se não os últimos quatro anos, ao menos os últimos três meses conspirando contra a democracia.
Os detalhes da nova trama podem afetar a situação jurídico-policial do ex-presidente. Se, no caso da minuta de decreto golpista encontrada na casa de Anderson Torres, ainda era logicamente plausível afirmar que Bolsonaro jamais tomou conhecimento do plano, agora o capitão reformado seria, pelo menos numa das versões apresentadas pelo senador, articulador do conciliábulo. Ouvi-lo num inquérito para apurar tudo se torna obrigatório. A PF já pode marcá-lo como "person of interest".
Com isso Bolsonaro vai para a cadeia? Não é tão simples. Mesmo que a história mais picante contada por Do Val se mostre 100% acurada, ainda restaria uma discussão jurídica sobre os meandros do "iter criminis", a trajetória criminosa. Em princípio, planejar um crime e mesmo fazer os preparativos para cometê-lo (algo como comprar o revólver) não são, de um modo geral, considerados atos puníveis. Para a maior parte dos doutrinadores, é só quando a execução do delito tem início que a conduta se torna ilegal. Chamar um senador para o Alvorada e convidá-lo para participar do conluio democraticida é preparativo ou execução? Aqui já entra a metafísica. De todo modo, vale lembrar que este é só um dos crimes pelos quais Bolsonaro pode ser responsabilizado.
Triste mesmo é constatar que só chegamos a essa situação surreal de ver o ex-presidente envolvido em múltiplas conspiratas porque as instituições não lhe cortaram as asinhas na hora certa. Dois dos principais responsáveis por essa omissão imperdoável, Augusto Aras e Arthur Lira, estão aí posando de campeões da democracia e recebendo votações consagradoras.
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