Eliane Cantanhêde, O Estado de S.Paulo
16 de janeiro de 2022 | 03h00
A eleição presidencial deu um salto no fim do ano e congelou no ar, com Lula confortavelmente na frente, Jair Bolsonaro mantendo um quarto do eleitorado apesar de tudo, Sérgio Moro em terceiro, mas sem chegar a dois dígitos, Ciro Gomes entre ser ou não ser e João Doria estranhamente quieto, fiando-se num selo, “pai das vacinas”.
À vontade, Lula parte para investidas internacionais, discute a sério o nome do (ou da) vice, consolida alianças no Nordeste e avança no Sudeste, enquanto Bolsonaro atira a esmo e acerta o próprio pé, ajoelha para o Centrão e afugenta militares, empresários, banqueiros, grandes produtores rurais...
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Quanto mais gente torce para viabilizar uma opção aos extremos, mais cresce a angústia e dispara a precipitação. Uns dizem: “O Brasil não merece Lula nem Bolsonaro, mas, se for assim, vou com Lula”. Outros: “Esse presidente é um doido, mas entre ele e Lula, fico com ele. No Lula, não voto de jeito nenhum”.
Ou seja: os que mais querem a terceira via são os que cristalizam a polarização entre Lula e Bolsonaro, jogando a toalha, disseminando o mantra de que “não tem jeito” e antecipando o segundo turno.
Afinal, tem jeito? Depende dos candidatos, das suas campanhas e da competência de cada um para vender seu peixe, além do principal: as circunstâncias. Neste momento, o fundamental não são nomes, são perfis. Nem o fulano, nem só princípios, mas que tipo de fulano a população intui como melhor para reconstruir o País.
Na onda da Lava Jato, 2018 foi o basta! Contra corrupção, política, políticos conhecidos, status quo. Jair Bolsonaro foi quem se encaixou nesse perfil. Ele não era absolutamente nada disso, como veio a confirmar na Presidência, mas o eleitor “não olha para cima”: não vê o candidato real, vê o personagem inventado para a circunstância.
Em 2022, o mundo é outro, o Brasil é outro, com pandemia, cambalhota na Lava Jato, desmanche da Saúde, Educação, Ambiente, Cultura, Política Externa e esgarçamento das relações entre os Poderes e os entes federativos, mais o troféu de 620 mil mortos e o coroamento de recessão técnica, inflação, desemprego e fome. E a democracia voltou à agenda.
Esse quadro favorece Lula e é evidentemente desastroso para Bolsonaro, mas não apaga o mensalão, o assalto à Petrobras, o fiasco Dilma Rousseff. E, por exemplo, se Bolsonaro meteu a mão nos órgãos de investigação (PF, Receita, Coaf...), Lula aparelhou os da grana (BNDES, CEF, agências reguladoras).
Conclusão: vai ter muita lavação de roupa suja e, quando a máquina esquentar, a imagem de hoje pode descongelar. É cedo para jogar a toalha.
COMENTARISTA DA RÁDIO ELDORADO, DA RÁDIO JORNAL (PE) E DO TELEJORNAL GLOBONEWS EM PAUTA
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