terça-feira, 25 de janeiro de 2022

Chapa Lula-Alckmin teve embrião em SP e Haddad e França como padrinhos, FSP

 Catia Seabra

RIO DE JANEIRO e BRASÍLIA

possível chapa unindo Lula (PT) e Geraldo Alckmin (ex-PSDB), que ganhou mais força com a recente e contundente defesa da aliança feita pelo petista, teve como embrião a disputa pelo Governo de São Paulo e, como padrinhos, o ex-prefeito Fernando Haddad (PT) e o ex-governador Márcio França (PSB).

A articulação, pensada inicialmente como uma união de forças entre petistas e tucanos dissidentes contra o governador João Doria (PSDB) e o bolsonarismo em São Paulo, cristalizou-se em uma proposta apresentada por Haddad a Lula, em agosto do ano passado.

Na montagem, o ex-presidente Lula e o ex-governador Geraldo Alckmin
Na montagem, o ex-presidente Lula e o ex-governador Geraldo Alckmin - Pedro Ladeira/Folhapress e Ciete Silvério/Fotos Publicas

Folha ouviu nos últimos dias petistas e aliados de Alckmin para tentar traçar a gênese da aliança que pode unir em um mesmo palanque nacional grupos políticos que desde os anos 80 se rivalizam.

A articulação mais incisiva para a formação da dobradinha Lula-Alckmin nasceu em meio a dúvidas sobre sua viabilidade. Haddad levou, formalmente, a ideia para o ex-presidente em um telefonema no dia 26 de agosto, segundo relatos, quando Lula estava na Bahia concluindo uma caravana pelo Nordeste.

O ex-prefeito de São Paulo havia acabado de sair de uma reunião com Márcio França no escritório do publicitário Cláudio Simas, amigo do ex-governador.

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Na conversa com Lula, Haddad teria dito ainda que França se comprometera a desistir de sua pré-candidatura ao Governo de São Paulo, caso o acordo vingasse.

Nessa composição, Alckmin seria vice de sua chapa para a Presidência, França concorreria ao Senado, e Haddad, ao governo estadual. Lula apenas ouviu.

Cerca de dez dias antes, a hipótese já tinha chegado, despretensiosamente, aos ouvidos de Lula após ser ventilada por França durante almoço com João Paulo Rodrigues, coordenador nacional do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), e o advogado Marco Aurélio Carvalho, coordenador do grupo Prerrogativas.

Segundo interlocutores, ao ouvir os entusiastas da aliança, Lula coçava o bigode e permitia o avanço das conversas.

O ex-ministro e ex-prefeito Fernando Haddad (PT) e o ex-governador Márcio França (PSB), durante encontro em novembro - Arquivo pessoal

De acordo com petistas, Haddad atribui a França a ideia original da chapa Lula-Alckmin. Na reunião de 26 de agosto, o ex-governador teria dito que a chapa resolveria os problemas do Brasil.

Há, porém, versões desencontradas. Em entrevista à rádio Bandeirantes, em dezembro, o ex-governador negou: "A ideia foi do [Fernando] Haddad, um pouco do [Gabriel] Chalita".

Há relatos de que haveria ainda a participação de outra pessoa, mantida em sigilo.

Além da autoria da ideia, França negou em conversa com Lula que tenha sugerido abrir mão do governo do estado em favor do petista. O ex-governador disse, na ocasião, que Haddad ouviu o que gostaria de escutar.

Presidente nacional do PSB, Carlos Siqueira atesta a paternidade de França para a união de Alckmin e Lula. "Foi o Márcio França. Ter Alckmin na vice de Lula, foi invenção dele", afirma.

Em uma conversa com a presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), Siqueira chegou a usar a atuação de França como argumento para que Haddad desista de concorrer ao Governo de São Paulo.

O presidente do PSB nega que França tenha concordado em renunciar à candidatura. Apenas sugerido que ele e Haddad sejam submetidos a uma pesquisa de opinião para definir quem será o cabeça de chapa na disputa.

Segundo Siqueira, a manutenção da candidatura de Haddad ameaça colapsar a montagem de uma federação do PT com o PSB. "E o PT vai perder a eleição em São Paulo. França tem chances de herdar os votos de Alckmin", alega.

A volta de Alckmin aos bastidores e ao dia a dia da política se deu em 2021, pouco mais de dois anos depois do fracasso nas eleições em que formou a mais robusta aliança política ao Planalto, mas em que acabou ficando apenas em quarto lugar, com 4,76% dos votos.

Em 2019 e 2020, Alckmin se recolheu e, entre outros afazeres, se dedicou a participar de programas na TV com dicas de acupuntura —ele é formado em medicina.

De acordo com aliados, a partir de 2020 prefeitos passaram a estimulá-lo a concorrer novamente ao Palácio dos Bandeirantes, que ele já governou por quatro vezes, tendo em vista pesquisas que o apontavam como o favorito.

No último levantamento do Datafolha, por exemplo, de dezembro, Alckmin liderava a corrida eleitoral paulista com 28% das intenções de voto. Logo atrás dele, vinham exatamente Haddad (19%) e França (13%), os dois padrinhos da articulação que deve tirá-lo da disputa.

Pesavam contra, porém, os reflexos da derrota de 2018, a relativa falta de ânimo de tentar um quinto mandato de governador e o fato de que, pela primeira vez, o então tucano teria que concorrer contra as três máquinas públicas —a municipal, a estadual e a federal.

O primeiro partido cogitado para ser o novo destino de Alckmin foi o PSD, mas o presidente da sigla, Gilberto Kassab, não teria topado a ideia de abrigá-lo para ser o vice de Lula, preferindo que Alckmin disputasse o governo estadual.

O PSD ainda tem, por ora, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (MG), como pré-candidato ao Palácio do Planalto.

Depois, Alckmin passou a ter como opção o PSB e outras siglas menores, como Solidariedade e PV.

Anfitrião do encontro entre França e Haddad, o publicitário Cláudio Simas confirma que a celebração da aliança Lula e Alckmin foi debatida no seu escritório, mas diz que não estava na sala no momento em que os dois discutiram a eleição estadual.

Embora as tratativas tenham se acelerado em 2021, o ambiente de boa convivência com fatia do tucanato —Alckmin incluído— vinha sendo criado desde a eleição do presidente Jair Bolsonaro (PL).

Até sua morte, em dezembro de 2018, o ex-deputado Sigmaringa Seixas era, ao lado de Haddad, defensor dessa aproximação, tendo o ex-ministro Nelson Jobim como um dos articuladores.

Em São Paulo, o ex-secretário estadual de Educação Gabriel Chalita foi fundamental para a consumação de um acordo entre Lula e Alckmin.

Amigo do ex-governador, Chalita também mantem laços de amizade com Haddad desde 2005, quando o petista ocupava o Ministério da Educação e ele, a Secretaria de Educação de São Paulo. Chalita foi vice da chapa de Haddad para a Prefeitura de São Paulo, em 2016.

Em seu apartamento, aconteceu o primeiro jantar entre Lula e Alckmin, em julho de 2021. À mesa, falaram sobre o país, mas ainda nada sobre alianças. Segundo aliados, os dois já se encontraram em três jantares, mas ainda não mencionaram a construção de uma chapa em parceria.

As tratativas para a aliança Lula-Alckmin foram reveladas em novembro pela coluna da jornalista Mônica Bergamo, da Folha. Houve críticas dentro do PT, em especial de Rui Falcão, ex-presidente do partido, mas o próprio Lula agiu para desencorajar críticas.

O ex-prefeito de São Bernardo do Campo Luiz Marinho, por exemplo, ensaiou uma reação, mas Lula sugeriu a ele que deixasse isso de lado e se dedicasse a outros problemas.

A lista dos que dentro do PT passaram a apoiar a chapa é bem maior. "O nosso objetivo é derrotar esse governo e reconstruir o país. Além do que, ajuda na eleição de São Paulo. A política é uma coisa que tem que olhar para frente, não pode ficar remoendo o passado", afirma o deputado federal Carlos Zarattini (PT).

Entre aliados de Alckmin, não há grandes resistências. Amigo do ex-governador e ex-presidente do PSDB de São Paulo, Pedro Tobias diz que em um primeiro momento chegou a se surpreender.

"Mas ele [Alckmin] falou para mim que está pensando o Brasil, que não está pensando nele. Que chega de briguinha de A com B. Ele explicou o motivo", disse.

De acordo com o ex-deputado, que também se desfiliou do PSDB, com Alckmin de vice Lula ganha no primeiro turno. "O Alckmin é um vice que ajuda sem abrir o bico, sem falar, é ético e trabalha nos bastidores para ajudar. Não tem chance nenhuma do Geraldo fazer golpe".

Em entrevista na quarta-feira, Lula fez a mais enfática defesa da aliança até agora, afirmando que o PSDB de João Doria não é o mesmo do que o que abrigou figuras importantes da sigla, como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o senador José Serra e o ex-governador Mario Covas.

Lula tem tido conversas com vários políticos de fora do PT —três dias antes de receber o telefonema de Haddad, ele havia visitado o senador tucano Tasso Jereissati (CE), em Fortaleza— com base na avaliação que, se vencer em outubro, precisará de um arco de alianças ao centro e à direita para governar.

Na viagem ao Nordeste, reuniu-se com o governador do Maranhão, Flávio Dino (PSB), o ex-presidente José Sarney (MDB-MA) e o ex-senador Eunício Oliveira (MDB-CE)

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