Fernando Scheller, O Estado de S.Paulo
09 de janeiro de 2022 | 05h00
Raro exemplo de indústria brasileira competitiva no exterior e dona de um faturamento superior a R$ 20 bilhões ao ano, a catarinense Weg se tornou, nos últimos tempos, também um ponto de apoio para investidores no mercado financeiro, que “descobriram” o negócio em meio à pandemia.
Apesar de uma queda nos papéis em 2021, a Weg hoje tem cerca do dobro do valor de mercado em relação a 2019. Como arrecada 55% de suas receitas no exterior, o negócio também acredita entrar 2022 com um “seguro” contra as turbulências do mercado nacional em um momento de uma confluência negativa de cenário de juros altos, inflação alta e a turbulência de uma eleição presidencial com expectativa de polarização.
De acordo com o presidente da Weg, Harry Schmelzer Jr., para garantir certa “imunidade” às dificuldades deste ano, a companhia tem a seu favor, além de sua atuação internacional em um momento de dólar rondando os R$ 6, a entrada em negócios que estão em curva ascendente, como as energias renováveis e a mobilidade elétrica.
“Num momento em que todo mundo fala em inovação, estamos buscando tecnologias de energia renovável, de mobilidade elétrica, de infraestrutura. Todas essas ações trazem alguma vantagem – se algum em que atuamos está caindo, a gente compensa em outras áreas. Temos muitas frentes de atuação”, diz o executivo.
À frente da Weg desde 2008, Schmelzer Jr. diz que a companhia está também consciente do fato de que ganhar mercado lá fora é uma forma de “seguro”, já que o mercado global vem há anos crescendo bem à frente do Brasil. Mas ressalva que tudo precisa ser feito com consciência e sem pressa: “Todo ano estamos conseguindo ganhar um quinhãozinho a mais no exterior.” A seguir, os principais trechos da entrevista.
Como a Weg se protege desse cenário de incerteza, trazido pela eleição de 2022?
Essa visão para o ano – aumento de juros, inflação e queda do PIB – mostra que não teremos um bom ano em termos de crescimento econômico. Mas, quando você fala do mercado internacional, no qual a Weg está inserida, a retomada vai continuar nos Estados Unidos e na Europa, apesar da nova variante Ômicron do coronavírus. Então, temos boas perspectivas.
A Weg cresceu mesmo em meio à pandemia. O que influenciou esse resultado?
O nosso maior problema na pandemia foi em março, abril e maio de 2020. Foram meses muito difíceis. Desde julho de 2020, o cenário começou a mudar e conseguimos fechar 2020 com um bom crescimento, de 30,9% nas receitas em relação a 2019. E, até setembro de 2021, já vínhamos com alta de 31,3% sobre igual período do ano anterior. E a nossa perspectiva continua animadora. Além disso, vários setores para os quais a Weg atua – como a agroindústria, a geração solar distribuída e os parques eólicos – estão em alta, mesmo no Brasil. Então, acreditamos que, em 2022, teremos um ano de continuidade (de expansão).
De qualquer forma, ter forte atuação no exterior é um ‘seguro’ para a Weg?
Cinquenta e cinco por cento da nossa receita consolidada vem de fora do Brasil, e isso ajuda muito. A empresa não para de investir em nova tecnologia. Num momento em que todo mundo fala em inovação, estamos buscando tecnologias de energia renovável, de mobilidade elétrica, de infraestrutura. Todas essas ações trazem alguma vantagem – se algum em que atuamos está caindo, a gente compensa em outras áreas. Temos muitas frentes de atuação.
Mas a política e a imagem do Brasil lá fora não trazem danos à Weg, um negócio brasileiro?
Hoje, 45% dos nossos negócios estão no Brasil, mas 55% das nossas vendas estão no exterior. E, do que vendemos lá fora, 50% já produzimos também fora do País. Temos fábricas nos Estados Unidos, no México, na China e na Índia. Sem dúvida a visão sobre a Weg lá fora é de uma empresa internacionalizada. O que mais nos prejudica não é a política em si, o que traz alguma inquietude são os movimentos de greve, a noção de que o Brasil vai parar. Isso tem de levar a um cuidado muito grande, porque esse tipo de ameaça da logística brasileira pode levar os clientes a trocarem de fornecedor. Já senti de alguns clientes essa preocupação.
A Weg prevê aumentar, ainda mais, a fatia das receitas internacionais?
A empresa tinha 51% da receita fora do Brasil em 2012. Hoje, estamos em 55%. Temos 48 fábricas em 12 países. Isso significa que, embora a Weg tenha continuado a investir e a crescer no mercado brasileiro, como é o caso das energias eólica e solar, todo ano nós estamos conseguindo ganhar um quinhãozinho a mais no exterior. Nada na área industrial acontece no curto prazo. Nós estamos agora colhendo os frutos do que fizemos lá atrás, dessa orientação de historicamente investir em novos mercados.
O sr. ainda vê chance para as reformas estruturais, prometidas, mas nunca realizadas?
Eu vou chover no molhado. Eu acredito que nós não estamos conseguindo colocar celeridade em todas as reformas importantes. E, entre todas elas, a reforma tributária é a mais importante, porque o Brasil não aguenta mais. Acho que a gente precisa de uma regra clara e não ficarmos com esse problema de créditos tributários e de desoneração de folha, se vai acabar ou não. Além disso, acredito que o Brasil precisa dar um passo para se tornar mais competitivo, e isso tem de passar pela indústria. É o que vai trazer mais valor agregado. Precisamos voltar a ter a indústria nos planos do Brasil. E, depois da reforma tributária, acredito que a administrativa também é muito importante. Devemos valorizar os servidores, mas ao mesmo tempo otimizar e trazer eficiência para o serviço público.
A Weg teve um salto nas ações em 2020, seguido de uma queda – em proporção bem menor – em 2021. Como o sr. vê a imagem da Weg, hoje, no mercado financeiro?
A Weg foi melhor percebida principalmente por sua estratégia de internacionalização, que acabou sendo um bom exemplo da indústria brasileira que começou a chamar a atenção. Nos últimos anos, o número de investidores pessoa física na Weg aumentou muito. Hoje, também temos esse viés de estarmos ligados a novas tendências, como a eficiência energética. E mantemos resultados consistentes, porque a empresa é bem fundamentada, tem seus pilares. Hoje, somos a sexta empresa de maior valor do Ibovespa (principal índice de ações da Bolsa brasileira, a B3). Com as perspectivas da média geral – tivemos dois trimestres seguidos de queda no PIB (Produto Interno Bruto) –, nenhum dos nossos pilares foi abalado.
E o que mais o sr. espera para o ano de 2022?
Além das reformas tributária e administrativa, que estão na pauta de todo mundo e devem vir o mais rápido possível, o Brasil precisa ter de novo uma política industrial robusta. Não está certo dizer que a indústria local não é competitiva – o exemplo da Weg está aí para mostrar o contrário. A Weg está entrando no 5G, quer ser um dos players para fazer a rede privada de 5G, trazer a IoT (internet das coisas) para a indústria brasileira.
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