Jessica Brasil Skroch, O Estado de S.Paulo
25 de janeiro de 2022 | 02h43
Atualizado 25 de janeiro de 2022 | 08h04
Olavo de Carvalho, escritor considerado o "guru do bolsonarismo", morreu na noite de segunda-feira, 24, aos 74 anos. A notícia foi divulgada em seu perfil oficial nas redes sociais.
Na publicação, a família de Carvalho informou que ele faleceu na região de Richmond, na Virgínia, nos Estados Unidos, onde estava hospitalizado. A causa da morte ainda não foi divulgada. No dia 15 de janeiro, a equipe do escritor anunciou que ele foi diagnosticado com covid-19.
"O professor deixa a esposa, Roxane, oito filhos e 18 netos. A família agradece a todos os amigos as mensagens de solidariedade e pede orações pela alma do professor", finaliza a nota.
Natural de Campinas (SP), Olavo Luiz Pimentel de Carvalho ganhou projeção ao publicar vídeos e livros rejeitando veementemente pautas associadas às militâncias de esquerda, o que o fez se tornar um "guru" do conservadorismo e da nova direita nas redes. Ele, que intitulava a si mesmo como professor de filosofia, foi um dos grandes aliados ideológicos do presidente Jair Bolsonaro nas eleições de 2018 e ganhou elogios públicos do chefe do Executivo no início de seu mandato.
Olavo rompeu com Bolsonaro em meados de 2020, quando publicou um vídeo direcionando críticas e xingamentos ao governo. O escritor dizia estar decepcionado com o presidente por considerar ter sido usado por ele como uma espécie de "garoto propaganda". Em dezembro do ano passado, comentando a possibilidade de reeleição do mandatário este ano, Olavo afirmou que a “briga já está perdida”.
O escritor era considerado um dos principais promotores do debate que deu força ao bolsonarismo na internet. Em suas publicações, Olavo criticava ferrenhamente o "politicamente correto" e dava projeção às bandeiras que seriam levantadas por Bolsonaro durante a campanha, usando frequentemente de um vocabulário chucro para tecer os seus comentários na internet. Para críticos, uma figura central da radicalização da política e do incentivo ao ódio contra grupos minoritários.
Antes de ter contato com o então candidato à Presidência, o autoproclamado filósofo tinha o apreço dos três filhos políticos do chefe do Executivo, que acompanhavam seus vídeos e o chamavam "professor Olavo". O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-RJ) chegou a divulgar um dos livros do escritor enquanto discursava no plenário da Câmara.
Mesmo com a popularidade nas redes sociais – o seu perfil oficial no Youtube tem pouco mais de 1 milhão de inscritos, além das centenas de milhares de seguidores nas demais plataformas – e as cifras best seller de alguns de seus livros, Olavo sempre adotou para si a imagem de outsider, principalmente se comparado aos colegas acadêmicos, dentre os quais os seus escritos nunca tiveram grande repercussão.
Apesar de ter sido considerado um influenciador bolsonarista, Carvalho tentava se descolar do título nos últimos tempos. Em depoimento prestado à Polícia Federal, no bojo do inquérito das milícias digitais, em dezembro do ano passado, ele enfatizou que não mantinha relações com o presidente Jair Bolsonaro ou com seus filhos.
No Twitter, o presidente lamentou a morte de Carvalho: "Nos deixa hoje um dos maiores pensadores da história do nosso país, o Filósofo e Professor Olavo Luiz Pimentel de Carvalho", escreveu. Eduardo Bolsonaro, Arthur Weintraub e Gil Diniz também prestaram homenagens ao influenciador nas redes sociais.
Histórico de saúde
Entre julho e agosto do ano passado, Carvalho foi internado três vezes no Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (InCor). Ele é cardiopata e, nesse período, foi submetido a diversos tratamentos, uma cirurgia na bexiga e um cateterismo de emergência. Em abril do mesmo ano, o escritor foi internado nos Estados Unidos, onde mora desde 2005, para tratar problemas respiratórios.
Trajetória
Olavo nasceu em Campinas, no interior de São Paulo, em 1947. A carreira do autointitulado filósofo, apesar de nunca ter concluído graduação na área, começou longe da política. Na década de 1980, ele ministrava cursos de astrologia e oferecia serviços com base na análise de mapa astral.
Ao longo da década de 1990, começou a desenvolver ensaios sobre literatura, filosofia e ciência política, publicando artigos em jornais e escrevendo prefácios de livros. Em 1996, publicou o seu primeiro sucesso editorial, O Imbecil Coletivo: Atualidades Inculturais Brasileiras, em que desenvolve uma crítica ao meio intelectual brasileiro. O outro best seller de Olavo é o O Mínimo que Você Precisa Saber para não Ser um Idiota, coletânea de artigos publicada em 2013.
Olavo morava no estado da Virgínia, nos Estados Unidos, desde 2005. Foi de lá que lançou o seu curso de filosofia, pelo qual diz ter atendido mais de cinco mil alunos. Em 2015, intensificou a sua presença online com lives nas redes sociais.
Os filhos do presidente Bolsonaro – Flávio, Carlos e Eduardo – também eram seguidores de Olavo. Um volume do livro O Mínimo que Você... compôs o cenário da primeira live de Bolsonaro após ter sido eleito presidente da República, em 2018, ao lado da Constituição Federal e da Bíblia.
Naquela mesma época, Olavo foi o responsável por indicar dois dos ministros do time inicial do novo governo: Ricardo Vélez Rodríguez, para o cargo de ministro da Educação, e Ernesto Araújo, para as Relações Exteriores. Com o fracasso de Vélez Rodríguez, Olavo indicou um outro pupilo: Abraham Weintraub, que permaneceu no cargo até meados de 2020. O escritor ficou responsável pela chamada “área ideológica” do governo que, até então, estava em formação.
Em maio de 2019, o presidente Bolsonaro concedeu ao escritor o grau máximo da Ordem Nacional de Rio Branco, de Grã-Cruz, indicado para autoridades de alta hierarquia, e se equiparou ao vice-presidente Hamilton Mourão e ministros. A posição de destaque no governo também garantiu uma aproximação com o seu equivalente norte-americano, Steve Bannon, que foi estrategista do ex-presidente Donald Trump, admirado pelo presidente brasileiro e pelo guru.
Crise
A relação entre Olavo e o chefe do governo, no entanto, ruiu. Em março de 2020, Olavo acusou Bolsonaro de “se adaptar ao sistema”, ao ser “aconselhado por generais e políticos medrosos”. Depois, reclamou da falta de empenho do presidente da República em defendê-lo de uma suposta milícia digital e, no final do ano, sugeriu uma renúncia caso não pudesse defender “os mais fiéis amigos”.
Pressões recentes contra Olavo por parte de grupos da oposição nas redes sociais também balançaram o filósofo. No ano passado, ele se tornou o principal alvo do movimento Sleeping Giants, que pressiona empresas a retirarem recursos de páginas que classifica como de ódio e de desinformação. Somente com a ação do grupo, em novembro, o escritor perdeu cerca de 30% dos alunos que pagavam para receber seus ensinamentos via PayPal, uma das companhias que o baniu. Naquele mesmo mês, a Justiça determinou que Olavo pagasse R$ 2,9 milhões ao cantor Caetano Veloso por danos morais.
Poucos meses antes, o empresário Luciano Hang, apoiador de Bolsonaro, havia pedido a um grupo de empresários doações ao guru, que dizia estar sem dinheiro.
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