29.jan.2022 às 14h00
Segundo uma concepção meio caricatural do Iluminismo, a razão levaria à emancipação do ser humano. Se fôssemos capazes de controlar as emoções e nos guiar apenas pela razão, descobriríamos mais verdades da ciência e encontraríamos as melhores soluções para nossos problemas sociais. Essa concepção está errada de várias formas. A razão não é o contraponto virtuoso das emoções e não leva automaticamente a respostas. Nossos raciocínios são marcados por tantos erros e vieses que fica uma suspeita no ar. Há um intenso debate entre cientistas cognitivos sobre o alcance e o papel da razão.
Um modelo de que gosto bastante é o proposto por Hugo Mercier e Dan Sperber. Para a dupla, a razão evoluiu para o propósito não muito enaltecedor de nos fazer vencer debates e justificar nossas próprias atitudes. É o que explica, por exemplo, a ubiquidade do viés de confirmação, que nos faz encontrar e abraçar rapidamente as evidências em favor de nossas teses e descartar sem exame as contrárias. Essa é uma péssima prática se o objetivo da razão é chegar à verdade, mas muito boa se a meta é só brilhar diante dos pares.
Isso significa que devemos abandonar todas as esperanças de progresso? No plano individual, talvez, mas não no coletivo. Há uma assimetria que nos favorece. Somos muito melhores em apontar erros nos raciocínios dos outros do que em encontrá-los nos nossos. Isso significa que, como sociedade, somos capazes de avançar. Grupos de pessoas suficientemente diversas até conseguem se livrar de teorias e ideias erradas. Fazê-lo individualmente, ainda que não impossível, é mais difícil, já que a tendência é que nos enamoremos de nossas teses mesmo que absurdas.
Se o modelo de Mercier e Sperber é correto, deveríamos ansiar pela publicação de artigos e livros que vão contra nossas ideias. Encontrar erros neles e criticá-los é a forma mais eficiente de fazer avançar nossa agenda.
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