domingo, 13 de outubro de 2019

Governo ignora alertas e manipula debate sobre pacote de Moro, FSP

Ministro contaminou projeto de combate ao crime com lei mais frouxa para policiais

BRASÍLIA
Sergio Moro disse que vai buscar “denominadores comuns” para aprovar seu pacote de projetos de combate ao crime. O anúncio conciliatório, depois de uma série de choques com a Câmara, foi seguido de um argumento traiçoeiro. O ministro afirmou que as propostas recebem críticas de pessoas que “se dão bem dentro desse sistema”.
O governo aposta na manipulação de uma sociedade polarizada para aplicar suas vontades. Ao insinuar que a resistência serve a corruptos e criminosos, Moro passa o recado de que a lei pode ignorar muita gente que vive o dia a dia da violência.
Na terça (8), Bruna Silva estendeu um uniforme escolar manchado de sangue na mesa do presidente da Câmara. Em junho do ano passado, Marcos Vinícius, de 14 anos, morreu com um tiro nas costas durante uma operação na favela da Maré, no Rio.
O presidente Jair Bolsonaro, acompanhado do ministro Sergio Moro, durante cerimônia de lançamento da campanha de divulgação do pacote Anticrimes
O presidente Jair Bolsonaro, acompanhado do ministro Sergio Moro, durante cerimônia de lançamento da campanha de divulgação do pacote Anticrimes - Pedro Ladeira - 3.out.2019/Folhapress
“Eu mandei meu filho impecável para a escola, e o Estado me devolveu ele assim”, disse a mãe. Ela diz que o disparo partiu da arma de um policial e pediu que os deputados não aprovem a proposta de imunidade para agentes que matam em serviço. “Vai ser muito sangue derramado.”
O projeto traz avanços que podem ajudar na elucidação de crimes, como a ampliação da coleta de DNA de criminosos, e que podem sufocar facções que controlam o tráfico de drogas, como o endurecimento de regimes de segurança máxima.
Moro, no entanto, abraçou uma obsessão de Jair Bolsonaro e contaminou o próprio pacote. Embora o ministro diga que não instituirá uma “licença para matar”, os itens que afrouxam punições nas mortes provocadas por policiais são um risco.
Na última semana, uma nota produzida pela Comissão Arns afirmou que esses tópicos deixam uma “porta aberta para que o agente, mesmo em legítima defesa, se exceda dolosamente”. Para o grupo de defesa dos direitos humanos, essas normas seriam uma ameaça para os cidadãos.
“Estamos diante de um arcabouço legislativo que, ao contrário de proteger a vida, estimula a sua destruição”, diz o texto.
Bruno Boghossian
Jornalista, foi repórter da Sucursal de Brasília. É mestre em ciência política pela Universidade Columbia (EUA).

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