terça-feira, 16 de dezembro de 2025

Brasil desbanca EUA e é líder mundial na produção de carne bovina, FSP

 

São Paulo

Pela primeira vez, o Brasil ultrapassou os Estados Unidos em produção de carne bovina. Agora, além de maior exportador, o país é também o principal produtor mundial. Os dados são do Usda (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos).

Há quatro anos, a produção norte-americana superava em 31% a brasileira.O mercado de carne bovina tem sido surpreendido por variantes pouco imagináveis. No início deste ano, previa-se uma queda na produção brasileira, o que não se confirmou. Pelos dados do Usda, não muito diferentes dos de instituições brasileiras, a produção de 2025 subiu para 12,35 milhões de toneladas, número que, se confirmado, superará em 4% o volume de 2024.

Gado descansa na fazenda Ipê Ouro, em Uberaba (MG)
Gado descansa na fazenda Ipê Ouro, em Uberaba (MG) - 6.mai.21/ Divulgação Fazenda Ipê Ouro

Discutiu-se muito o abate de fêmeas, dentro da composição total da oferta de carne neste ano, mas o país chega ao final do ano com recorde no rendimento de carcaça. Em setembro, o macho abatido atingiu, em média, 303 kg, o que ajudou o país a superar a produção mensal de 1 milhão de toneladas de carne bovina. Quanto mais peso por animal, maior a produção.

Maurício Nogueira, da Athenagro, consultoria especializada no setor, e responsável por esses dados, afirma que esse aumento do peso do boi é reflexo de maior uso de tecnologia no campo, principalmente na alimentação do gado. A Athenagro levou em consideração os abates com inspeção municipal, estadual e federal para chegar ao peso médio recorde da carcaça do boi em setembro.

A produção americana de carne bovina recua para 11,81 milhões neste ano, nas estimativas do Usda, 4% a menos do que a de 2024. Rebanho no menor patamar desde a década de 1970, efeitos climáticos e elevação de custos da produção têm sido alguns dos principais problemas vividos pela pecuária bovina dos Estados Unidos.

Para o próximo ano, o Usda prevê queda tanto na produção do Brasil como na dos Estados Unidos. Ambos produzirão 11,7 milhões de toneladas. Outros líderes em produção, como Austrália, China e União Europeia também produzirão menos, enquanto México e Índia colocarão mais carne no mercado.

Nogueira, que, no início do ano, não acreditava na queda de produção brasileira em 2025, contrariando boa parte do mercado que apostava na redução, também não vê a retração de 5% prevista pelo Usda para 2026. Na avaliação dele, a produção poderá ficar estável, podendo até atingir leve aumento. No mercado, há apostas de queda de 4% a 9%. O país ainda tem muito espaço para crescer no rendimento da carcaça. Além disso, os preços estão melhorando há 18 meses, o que incentiva o pecuarista a produzir, afirma ele.

Pelos números de Nogueira, só com a manutenção da estabilidade de produção, o Brasil voltaria a superar os Estados Unidos em 2026. A manutenção ou até aumento de produção nacional colocará o país em uma melhor posição no mercado exportador, uma vez que o Usda estima que, após cinco anos, as exportações mundiais terão a primeira queda em volume no próximo ano. Em 2024, as exportações mundiais subiram 8%, voltando a crescer 5% neste ano. Em 2026, devem recuar 1%, conforme estimativas do Usda.

Nas contas do órgão norte-americano, a produção mundial de carne bovina deste ano sobe para o recorde de 61,9 milhões de toneladas, com exportações de 13,7 milhões. Em 2026, a produção recua para 61 milhões, e as exportações caem para 13,5 milhões.

Eventual aumento de preços e substituição da carne bovina por outra proteína de custo menor farão com que o consumo mundial de carne bovina tenha queda de 1% no próximo ano, recuando para 59,5 milhões. Já o consumo de carne de frango, ocuparia parte desse mercado, uma vez que as exportações previstas serão de 14,7 milhões de toneladas, 3,3% a mais do que neste ano.

O cenário para a produção de carnes nos próximos anos favorece o Brasil. Além de abertura de novos mercados em todos os segmentos, o país tem competitividade maior na produção. O fator doença também pesa, uma vez que o país está livre de gripe aviária, peste suína africana, mosca da bicheira e língua azul.

No quesito produtividade, Nogueira diz que um dos pontos fortes da pecuária do Brasil é a produção de bezerros. O país tem escala, e o custo é mais barato do que em outros países fortes na pecuária bovina.


Reforma societária e Política Nacional de Economia Circular: o que muda para o mercado e por que importa, FSP

 

Arthur Parente

Advogado

Daniel Calhman de Miranda

Advogado

A aprovação pela Câmara dos Deputados do substitutivo ao PL 3.899/2012, que incorporou o PL 2.925/2023, representa uma inflexão relevante na regulação societária e do mercado de capitais no Brasil. O texto promove a mais ampla revisão recente da Lei das S.A. e da Lei do Mercado de Valores Mobiliários. Estas alterações promovem inovações nos critérios de responsabilidade civil em razão de ofertas de valores mobiliários, disciplinam ações coletivas de investidores e aumentam a transparência de arbitragens societárias.

O efeito esperado é a adequada distribuição de responsabilidades por informações imprecisas, o fortalecimento da confiança dos investidores, a melhoria das informações disponíveis ao mercado e a redução do custo de capital para companhias brasileiras.

A imagem mostra o Congresso Nacional do Brasil, com suas duas torres retangulares e as cúpulas em forma de meia-lua e de prato. O céu está limpo e azul, refletindo na superfície da água em primeiro plano.
Fachada do Congresso Nacional, em Brasília - Pedro Ladeira/Folhapress

A tramitação do projeto com relação às medidas de direito societário e de mercado de capitais foi marcada por consolidação técnica e ajustes realizados ao longo de mais de um ano, com contribuições de reguladores, entidades de mercado e sociedade civil. Neste período, o projeto foi incorporado ao PL 3.899, que tratava principalmente de diversas novidades sobre economia circular, que não são objeto deste ensaio.

O texto agora segue ao Senado, e, embora possa sofrer emendas, o sentido da mudança permanece claro: maior governança, transparência e alinhamento do Brasil a padrões internacionais.

A versão final aprovada na Câmara contempla mudanças importantes às propostas iniciais. A responsabilidade por informações incorretas passa a recair primordialmente sobre administradores das companhias abertas, mediante comprovação de dolo ou violação ao dever de diligência. A regra de que controladores, ofertantes e coordenadores responderiam pelos atos de outras pessoas foi eliminada, de modo que cada um responde apenas por seus próprios atos, na medida de sua culpabilidade. Essa delimitação reduz incertezas sem comprometer a responsabilidade de cada um.

Em decorrência da responsabilidade do administrador, o texto isenta a companhia, como regra, de responsabilidade perante investidores por falhas informacionais, exceto quando negociar ações em ofertas públicas. A lógica é evitar que acionistas arquem com prejuízos decorrentes de atos praticados por administradores, já que a companhia pertence aos seus acionistas. Em contrapartida, a norma estipula que os administradores podem contratar acordos de indenidade com a companhia.

A ação coletiva de investidores passou a ter legitimação mais objetiva e restrita —atribuída ao Ministério Público, à CVM, a agentes fiduciários e a investidores que detenham pelo menos 5% dos títulos da mesma classe. Esse desenho tende a evitar reclamações oportunistas.

As propostas relativas à aprovação de contas também refletem os debates públicos. Sob a lei atual, há defensores da tese de que os administradores somente responderiam por ilícitos se for primeiro anulada qualquer aprovação de suas contas em um procedimento próprio.

Após uma proposta inicial de eliminar a quitação automática das contas do administrador nas assembleias anuais, a solução aprovada permite que a anulação da quitação e a responsabilidade do administrador sejam discutidas em um único procedimento, conforme já apontam algumas decisões judiciais. Esta solução oferece uma ferramenta viável e adequada para a tarefa, e estabelece salvaguardas para os administradores.

Outro avanço relevante é a publicidade regulada das arbitragens que tratem de responsabilidade de administradores, ofertantes, ou controladores por falhas informacionais ou danos causados à companhia, ou que possam afetar acionistas não participantes do procedimento. A medida reduz assimetrias informacionais e contribui para consolidar precedentes que poderão nortear a conduta futura de companhias abertas. Caberá à CVM regular os limites dessa publicidade, equilibrando transparência, confidencialidade, proteção de segredos industriais e dados pessoais.

A CVM também recebe novos instrumentos de supervisão, como a possibilidade de realizar inspeções, solicitar mandados de busca e apreensão, requerer vista de processos judiciais e administrativos, e compartilhar informações com autoridades monetárias e fiscais. Isso amplia a capacidade de fiscalização do poder público e contribui para maior integridade do mercado.

A consolidação dessa reforma dependerá de regulamentação cuidadosa, especialmente no que diz respeito à publicidade das arbitragens. Ainda assim, o rumo é inequívoco: maior eficácia das regras informacionais, das ferramentas de responsabilização e da boa governança. O mercado vive de informações de qualidade e gestão responsável. Nesta reforma, serão ganhadores os investidores, as empresas e, por fim, a economia real.