terça-feira, 4 de outubro de 2022

Lula devia aprender com Lula, Elio Gaspari, FSP

 Durante o debate da TV Globo Lula perdeu a calma com o Padre Kelmon, da Igreja Ortodoxa do Peru, ex-petista, hoje no PTB do deputado Roberto Jefferson. Onze entre dez cidadãos também perderiam, mas Lula estava lá como candidato à Presidência da República.


Faz tempo, Lula estava preso no Dops de São Paulo e foi tirado da cela no meio da noite. No caminho, achou que ia apanhar.

O então dirigente sindical foi levado para uma sala onde o apresentaram a um assessor da Secretaria de Segurança, que desejava conversar com ele. Era mentira, o assessor era um oficial do Serviço Nacional de Informações e havia um grampo na sala.

Sentado em uma poltrona branca, com uma curtinha branca e iluminação azul ao fundo, Lula, um homem branco de barba e cabelos da mesma cor, está com semblante sério. Ele veste um terno escuro e gravata vinho. Diante dele, aparece o braço de um homem que está de pé
O ex-presidente Lula durante debate presidencial da TV Globo antes do primeiro turno - Mauro Pimentel - 29.set.2022/AFP


A conversa durou cerca de uma hora e a transcrição circulou em Brasília.

Lula deu um baile no inquisidor. Ele queria saber se Lula tinha um canal secreto de comunicação dentro do governo e ouviu o seguinte:

— Durante esse processo ninguém falou mais com autoridade do que eu. Reclamamos pela situação do trabalhador, como era que ele se encontrava (...) a gente sentia a coisa... ninguém estendia a mão para o trabalhador, quer dizer, vamos fazer um negócio e colocar na mão do trabalhador.

MURALHA NO TSE

Há uma muralha no Tribunal Superior Eleitoral, formada pelos ministros Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Benedito Gonçalves.

Têm votado juntos, sempre contra as maracutaias.

OBSERVADORES DA ELEIÇÃO

Estão no Brasil cerca de 30 observadores internacionais.

Depois de acompanhar a votação e a totalização do resultado, alguns deles estão prontos para anunciar ao mundo suas conclusões.

LULA MUDOU A ESCRITA

Lula alterou a escrita dos candidatos a formar frentes de apoio às suas campanhas. Pelo protocolo o apoio de notáveis era buscado a partir do início da campanha oficial. Por tática ou pelo simples movimento da roda, Lula recebeu-os no finalzinho do segundo tempo.

Foi o caso das manifestações de Joaquim Barbosa e do economista André Lara Resende. Barbosa significou uma poderosa vacina contra o reaparecimento das denúncias de corrupção ocorridas nos governos petistas.

Só o tempo dirá se o apoio de Lara Resende significará algo mais de uma simples declaração de voto.

Elio Gaspari - Primeiro turno está na mão dos 15%, FSP

 O Datafolha saiu no início do noite de quinta-feira (29) informando que o placar estava em 50% para Lula e 36% para Bolsonaro e 85% dos eleitores já haviam decidido seus votos. O debate da Globo terminou de madrugada e é razoável supor que não serviu para mexer os ponteiros. Vai daí, só no fim do dia de hoje ou na madrugada de amanhã vai-se saber o resultado do primeiro turno.

Desde que John Kennedy derrotou Richard Nixon no primeiro debate transmitido pela televisão, em 1960, muitos candidatos arrastaram as fichas nessas ocasiões. Na França, François Mitterrand moeu seu adversário. Nos Estados Unidos, Ronald Reagan se impôs. Todos os grandes momentos desses debates tiveram o ingrediente a seriedade associada à presença de espírito.

Em um estúdio com iluminação azul, com folhas de papel branco nas mãos, Bolsonaro se afasta de uma mesa com dois microfones fixos, um em direção a ele e outro em direção a Lula, que o segura e olha para frente com semblante sério. Os dois estão vestidos com ternos escuros e gravatas
O presidente Jair Bolsonaro (PL) e o ex-presidente Lula (PT) durante debate da TV Globo antes do primeiro turno - Marcos Serra Lima/Divulgação/G1

Em 1981 o presidente francês Giscard d’Estaing achou que tinha uma pegadinha letal e perguntou a Mitterrand o preço do pãozinho.

O senhor não é meu professor e eu não sou seu aluno, respondeu o candidato socialista. Arrastou as fichas.

Lula e Bolsonaro foram para o debate com tamanha agressividade que perderam a calma.

Ganha uma coleção de sermões do Padre Kelmon quem for capaz de repetir uma ideia nova e boa de Bolsonaro ou de Lula apresentada durante o debate. O capitão continua repetindo paranhas de 2018, mesmo sabendo que os ventos favoráveis que o elegeram viraram poeira na eleição municipal de 2020.
Os 15% que poderiam mudar de voto na pesquisa do Datafolha decidirão se a fatura será liquidada neste primeiro turno.

MIRO NO TEMPO DA CIVILIDADE

Hoje os eleitores poderão restabelecer o primado da civilidade nas relações políticas nacionais. Os bons modos evitam brigas de conveniência e, quando as crises entram no palácio, saem menores. Quando há elegância no convívio, o impossível acontece.

Aqui vão duas histórias, ambas envolvendo o deputado Miro Teixeira.

Em 1980 Lula estava preso. Era um líder sindical de barba negra e discurso a um só tempo novo e amedrontador. A ditadura agonizava com o último general no Planalto. Thales Ramalho era um deputado do MDB conhecido pela sua intransigente moderação. Conversava com generais (poucos, porém relevantes) e a ala mais radical da oposição detestava-o. Uma jovem e ilustre figura chegou a negar-lhe o cumprimento. Thales nada tinha a ver com Lula, mas, de Brasília, telefonou a Miro, que estava no Rio, pedindo-lhe que fosse a São Paulo, como deputado e advogado, para cuidar das condições carcerárias do preso.


Miro desceu em São Paulo e, numa pequena delegação, foi ao carcereiro de Lula. Era o delegado Romeu Tuma, outra figura do mundo de bons modos. O policial disse-lhes que não poderiam visitar o preso, mas, se a sua mulher, Marisa Letícia, quisesse trazer algumas roupas, talvez o delegado do próximo plantão não saiba as normas da incomunicabilidade desse preso. Dito e feito, Marisa visitou Lula. Thales agiu sem deixar suas impressões digitais no lance.

Um ano depois, o caso de Lula seria julgado no Superior Tribunal Militar. Dessa vez, a operação foi conduzida por Tancredo Neves, que nada tinha a ver com Lula. Ele chamou Miro, pedindo-lhe que o acompanhasse ao STM, para mostrar a importância do julgamento. Dito e feito. O tribunal decidiu que o caso não era da alçada da Justiça Militar, e a ação prescreveu.

Era o exercício da política com gestos, poucas palavras e muita civilidade.

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