quinta-feira, 10 de março de 2022

Volkswagen Kombi renasce elétrica e deve chegar ao Brasil, FSP

 A Volkswagen cumpriu a promessa feita em 2017: a Kombi está de volta ao mercado, agora em versão elétrica. Embora tenha dado origem a diferentes vans da marca na Europa, o modelo que ressurge agora sob o nome ID. Buzz é inspirado na primeira geração, que no Brasil foi apelidada de corujinha.

Volkswagen apresenta ID. Buzz, a nova Kombi
Volkswagen ID. Buzz repete o padrão bitom da Kombi "corujinha" - Divulgação

As linhas permanecem as mesmas do conceito que foi exibido há cinco anos no Salão do Automóvel de Detroit. Cores e formas da carroceria e das janelas até lembram o modelo feito oficialmente no Brasil a partir de 1957, mas, por dentro, trata-se de um carro bem mais luxuoso.

O ID. Buzz obedece a comandos de voz do motorista, e suas respostas são acompanhadas por LEDs que se acendem no topo do painel. Parte da forração interna é feita a partir de garrafas PET recicladas.

Em vez de faróis redondos, há um conjunto triangular com LEDs. A mesma tecnologia está presente nas lanternas traseiras e nas luzes da cabine.

Há espaço para cinco pessoas e muitas bagagens: o porta-malas tem 1.121 litros de capacidade. A nova Kombi tem 4,72 metros de comprimento, tamanho equivalente ao de SUV de grande porte.

O motor elétrico tem potência equivalente a 204 cv. A Volks não divulgou qual é a autonomia do ID. Buzz, mas certamente será bem maior do que o do primeiro conceito elétrico feito pela marca, há 50 anos.

Na época, uma Kombi T2 –igual às produzidas no Brasil a partir da década de 1970– foi transformada em um veículo movido a eletricidade. Não rodava mais do que 85 quilômetros com uma carga completa.

A plataforma do novo modelo é a mesma usada no ID. 3 e no ID. 4, veículos elétricos da VW que serão vendidos no Brasil. Com isso, o caminho natural é o lançamento da nova Kombi no país, posicionada em uma faixa de preço acima de R$ 200 mil.

Contudo ainda não há uma data prevista para o início da comercialização por aqui. Na Europa, as entregas terão início em setembro, mas haverá pré-venda a partir de maio.

Haverá ainda a versão Cargo, voltada para o setor de entregas urbanas e com capacidade para transportar 600 quilos.

O formato monovolume permanece fiel ao desenho feito por Ben Pon em 1947. Ele, que era um concessionário holandês da Volkswagen, aproveitou um encontro com oficiais que controlavam a fábrica alemã após o fim da Segunda Guerra para mostrar os rabiscos.

A Kombi foi o veículo que ficou mais tempo em produção no Brasil. A montagem durou até 2013, quando normas de segurança e emissões mais exigentes determinaram o encerramento da fabricação.

O lançamento na Alemanha ocorreu em 1950. Três anos depois, as primeiras unidades chegaram ao Brasil, trazidas desmontadas pelo grupo importador Brasmotor.

A Constituição que polícia aplica e juiz confirma, Conrado Hübner Mendes, FSP

 Existe uma Constituição não escrita da brutalidade brasileira. A compilação de praxes sociais e institucionais está traçada em livros de sociologia, história e literatura, mas não ecoa nos códigos jurídicos.

Não está traduzida na linguagem das leis, linguagem mais livre para fugir da vida real e emitir comandos. Mas permanece em vigência disfarçada e normalizada nesse lusco-fusco da cordialidade brasileira.

Qualquer programa para desenvolvimento humano do país precisa sacar essas normas das entrelinhas, psicografá-las e ter estratégia para revogá-las.

Bolsonaro contribuiu à consciência da incivilização brasileira ao dar corpo, voz e legitimidade eleitoral a essa Constituição das ruas e morros, florestas e garimpos. Nunca houve melhor encarnação do "Brasil feião, sem maquiagem" (Mano Brown).

Pessoas negras seguram uma faixa escrito "Nem bala, nem fome, nem Covid. O povo preto quer viver"
Protesto contra racismo e violência policial no Rio no ano passado - Luís Costa - 13.mai.21/Folhapress

Esse esforço de síntese sociológica no dialeto normativo tem algum valor didático. O capítulo constitucional não escrito da polícia, pouco reconhecido e mais sentido na pele de alguns que de outros, poderia se ler assim:

Artigo 1º Todos são iguais perante a lei, exceto pretos etc.

Artigo 2º A violência preventiva é imperativo de segurança pública e privada.

Artigo 3º Preto se presume suspeito até prova robusta em contrário.

Artigo 4º Preto deve ser abordado com força e contundência. Polícia deve cobrar nota fiscal do tênis, do relógio, do celular e da bicicleta. Se estiver de carro novo, pode prender para averiguação. Policial não precisa justificar nem formalizar seus atos.

Artigo 5º Em operações policiais, quem leva tiro se presume bandido. Parágrafo único. Se policial ou cidadão branco de bem ficar incomodado diante de corpo preto e matar sob leve emoção, homicídio será culposo. Se matar sob violenta emoção, legítima defesa.

Artigo 6º Palavra de preto e marcas de tortura em corpo de preto não têm valor em inquérito ou decisão judicial. Palavra de policial se presume verdadeira e tem fé pública.

Artigo 7º Ignoram-se disposições da Constituição de 1988 em contrário.

Essa é a Constituição que polícia aplica, promotor defende e juiz confirma. A violência é policial. A cumplicidade é judicial e ministerial. A indiferença é social. Os dividendos se distribuem entre políticos do pânico e circo.

Levantamentos já quantificaram os delitos dessa instituição de uso da força que navega à margem do estado de direito. O dispositivo de irresponsabilização da polícia que mais mata e mais morre no mundo, e o apagamento da cadeia de comando que faz o policial lá embaixo matar, é obra magistocrática. Procure saber como o TJSP, palácio da magistocracia bandeirante, lidou com o massacre do Carandiru nesses últimos 30 anos.

Pelo menos quatro temas merecem a maior urgência. Primeiro, a abordagem policial de cidadãos. Relatório "Elemento Suspeito" (Cesec) constatou que pessoas negras correspondem a 63% das abordadas, e que 20% passaram por isso mais de dez vezes (os "superabordados" ou "freios de camburão").

Pesquisa da FGV e Cebrap revela tendência judicial de chancelar abordagens ilegais e de invasões domiciliares sem mandado. Alegações de "legítima defesa", "fundada suspeita" e "estrito cumprimento do dever legal" são senhas aceitas por seu valor de face.

Segundo, a condução judicial das audiências de custódia, que buscam neutralizar prisões ilegais, controlar tortura e garantir ampla defesa, desidratam seu potencial de desencarceramento.

Na melhor das hipóteses, a liberdade provisória concedida vem acompanhada de condicionamentos que restringem a liberdade sem razão jurídica específica ("medidas cautelares" como o recolhimento noturno ou a proibição de circular numa área).

Relatório "O Fim da Liberdade" (IDDD, 2019), percebeu que menos de 1% das concessões de liberdade provisória não trazem uma medida restritiva a reboque.

Terceiro, o reconhecimento fotográfico pela vítima e a palavra policial como única prova que embasa acusação (a partir da presunção ilegal da veracidade da palavra policial) também agravam a injustiça e o viés discriminatório do sistema de justiça. Relatório da Defensoria Pública do Rio de Janeiro, que analisa prisões ilegais de 2012 a 2020, indica que 81% foram de pessoas negras.

Quarto, operações policiais em favelas precisaram do STF, semanas atrás, para reafirmar a necessidade de protocolos e algum meio de controle e accountability. Ninguém sabe se a autoridade do STF vencerá o policial que delínque. Em operação no Jacarezinho, polícia matou 28, muitos baleados pelas costas, a curta distância e com excesso de tiros. Maioria negros.

Não chame de "lei e ordem" uma política que viola a lei e multiplica a desordem. Libera arbitrariedade sem prestação de contas. Entrega medo e morte, populismo e liberticídio. Só não entrega segurança.