sábado, 1 de maio de 2021

Cristina Serra Biden, Guedes e a Casa-Grande, FSP

  EDIÇÃO IMPRESSA

Merece ampla discussão o plano do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, para a retomada pós-pandemia, especialmente pelo que propõe sobre o papel do Estado numa economia capitalista e numa sociedade profundamente desigual como a norte-americana.

Basicamente, o presidente propõe reformas de caráter progressista, que se destinam a melhorar as engrenagens do capitalismo, para que o motor econômico volte a girar sem deixar para trás multidões de desesperados revirando lixo para não morrer de fome.

Biden quer criar empregos para a classe média e trabalhadores com menor qualificação, aumentar o valor do salário mínimo, ampliar a educação pública e melhorar o acesso à saúde, que, segundo ele, deve ser um direito, não um privilégio.

A questão é saber quem vai pagar a conta dos investimentos do Estado. Biden quer elevar a carga tributária das empresas e daqueles que ocupam, digamos, o topo da cadeia alimentar e que engordaram suas fortunas ainda mais durante a pandemia. Ele enunciou seu argumento de forma até singela: "É hora de pagarem a sua parte justa".

Joe Biden discursa no Congresso - Melina Mara - 29.abr.2021/Pool/Xinhua

No Brasil, porém, falar em aumento de carga tributária dos mais ricos (inclusive no âmbito de uma reforma sobre o tema) é um debate interditado, sobretudo em parte da grande mídia, que deveria amplificá-lo. Esta parece domesticada pelo "mercado" e se comporta como porta-voz de Paulo Guedes em seu projeto de desossar o Estado e seu papel de indutor da mobilidade social.

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Guedes é exemplo extremo de "aporofobia", expressão cunhada pela filósofa espanhola Adela Cortina para definir a aversão aos pobres e que se manifesta de diversas formas no mundo contemporâneo. A palavra vem do grego áporos (pobre) e fobéo (rejeitar).

Guedes não cansa de demonstrar ódio de classe: empregadas domésticas não podem viajar e filhos de porteiros não merecem estudar. Cada vez que abre a boca, Guedes exala o mau hálito da Casa-Grande.


Alvaro Costa e Silva CPI da autodestruição, FSP

 

Na hora em que se mobiliza para combater a CPI da Covid, o governo atira no pé. Se um observador internacional chegasse hoje a Brasília, a primeira coisa que pensaria é que o país está nas mãos de um bando de lunáticos autodestrutivos.

Ex-ministro da Saúde que não sabia o que é o SUS, o general Pazuello desfilou sem máscara num shopping de Manaus, cidade que, por falta de oxigênio, registrou em janeiro uma das mais altas taxas de letalidade do mundo. Cobrado por ignorar a proteção, Pazuello reagiu fazendo piada. Diante dos senadores, ele manterá o bom humor?

Um dos articuladores das forças governistas para minar a comissão, o que revelou o chefe da Casa Civil, general Ramos? Em reunião do Conselho de Saúde transmitida ao vivo pela internet, admitiu uma molecagem: tomou a vacina escondido para driblar a orientação do Planalto. E não foi só ele. Outros dois ministros —um almirante e um general— curvaram-se aos caprichos do capitão da cloroquina. Bento Albuquerque, de Minas e Energia, e Braga Netto, da Defesa, também se vacinaram em segredo.

Ramos ainda revelou que tenta convencer o presidente —que devia ser o primeiro a mostrar o muque de atleta para receber a picada— a imunizar-se. Com negacionista é assim. Não bastasse, o Ministério da Saúde encontrou 100 mil doses de imunizantes "esquecidas" num canto de almoxarifado. Com esse tipo de gente a ser investigada, Renan Calheiros não terá de se esforçar para produzir um relatório concludente e devastador. Divulgados pela imprensa, os crimes são de conhecimento geral, inclusive daqueles que continuam a apoiar Bolsonaro.

A batalha na CPI está perdida. Bolsonaro aproveita o momento para confabular com membros de sua seita no cercadinho do Alvorada, condenando a prática do beijo gay na época do PT. Quem dera tivesse a dupla fixação com a saúde e a vida dos brasileiros.

Hélio Schwartsman - O futuro é sombrio, FSP

 Cabify, Ford, Sony, LG, LafargeHolcim. Nas últimas semanas, várias multinacionais anunciaram que deixarão de produzir no Brasil. Dificuldades setoriais específicas decerto contribuíram para as decisões dessas empresas, mas sua confluência temporal torna inevitável perguntar se não está havendo uma perda de confiança no futuro do país. E eu receio que a resposta seja afirmativa.

O ambiente de negócios brasileiro nunca foi fácil. Anos e anos de hiperinflação, complexidade tributária, instabilidade regulatória e morosidade da Justiça destacam-se entre os fatores que já fizeram com que muitas firmas globais desistissem do Brasil.

Entre meados dos anos 90 e a primeira década do novo milênio, porém, pareceu que o país estava encontrando seu caminho. Principalmente sob as gestões de FHC e Lula, logrou-se controlar a inflação, melhorar o sistema de contas públicas e a regulação em geral, universalizar o ensino básico, expandir o acesso ao terceiro grau e ampliar a renda de vários grupos sociais. Não durou muito.

Os avanços não se fizeram acompanhar de outras medidas que teriam sido necessárias para manter o círculo virtuoso em operação. Tentativas de prestidigitação econômica sob Dilma escancararam e acentuaram nossa precariedade fiscal e depois vieram Bolsonaro e a pandemia, ambos aniquiladores.
Não há dúvida de que, no momento, é preciso gastar para que sobrevivamos à epidemia, mas isso apenas reforça a necessidade de nos prepararmos para o pós-crise. Não se percebe, nem no governo nem no Parlamento, nenhum sentido de urgência para lidar com essas questões.

O buraco fiscal em que estamos metidos ficou bem mais fundo, a economia está muito mais desorganizada, com falências e desemprego em alta, teremos problemas sérios e duradouros na educação e as velhas dificuldades não foram embora.

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Se eu fosse uma multinacional também estaria pensando seriamente em cair fora.