quinta-feira, 9 de maio de 2019

Sem sombra à vista, FSP Mariliz Pereira Jorge


Atrito entre militares e Olavo só piora a sensação de que nada está sendo feito


“Uma sociedade cresce bem quando os mais velhos plantam árvores, sob cuja sombra eles sabem que nunca se sentarão.” A frase é atribuída a um provérbio grego e dita na série “After Life” (Netflix), escrita, dirigida e protagonizada por Ricky Gervais
Nela, o personagem principal, Tony, vê o sentido de sua vida desaparecer depois de perder a mulher para o câncer e passa a se relacionar com o mundo sem esperança, sem filtro e com muito mau humor. 
Tenho visto muita gente enfrentando o Brasil de 2019 assim. Sem esperança e com os nervos destroçados. Mas de que outra forma lidar com o cenário político em que vivemos? 
Embrulhou o estômago a cena em que Jair Bolsonaro comemora com parlamentares a assinatura do decreto que facilita o porte de arma para um punhado de profissões e a prática de tiro em clubes privados para crianças e adolescentes. É assim que se pretende combater a criminalidade no país? Aqueles políticos pareciam adolescentes deslumbrados que acabaram de ganhar mesada do papai para passar a noite no puteiro. 
A sensação de que não há nada acontecendo de importante para tirar o país do atoleiro só piora quando as manchetes dos jornais são as brigas entre os militares, alçados ao posto de reis do bom senso neste hospício em que vivemos, e um astrólogo gagá, que por razões óbvias virou guru do governo de lunáticos. 
Olha eu aqui concordando com Lula, a quem já critiquei muito. Mas que fique claro que essa oposição que continua aí não ajuda. Ela é fraca, preguiçosa e bolorenta, adepta do quanto pior, melhor. Como se precisasse torcer contra um governo que dá tiro nos pés todos os dias. 
A questão urgente que me remeteu à série que menciono no início é a seguinte: quem serão os “velhos” que plantarão as árvores (Previdência, educação e saúde de qualidade, segurança eficiente) que darão a sombra que o Brasil precisa para ter futuro? Não vejo quase ninguém. 
Mariliz Pereira Jorge
Jornalista e roteirista de TV.

quarta-feira, 8 de maio de 2019

Leandro Karnal, Ensino em casa, OESP

Leandro Karnal, O Estado de S. Paulo
08 de maio de 2019 | 02h00

A educação formal obrigatória, universal, em escolas, é uma novidade histórica. Até meados do século 20, estudar até o fim do segundo ciclo era um luxo reservado às elites e a parte da classe média. A maioria da população seguia com rudimentos de escrita e algumas operações matemáticas básicas, quando não completamente analfabeta. 
Os motivos para tal situação eram muitos. Um deles era decorrente da visão que a sociedade tinha a respeito de lugares determinados para todos. Filho de sapateiro, sapateiro será. Filho de agricultor lavrará a terra. Filhos de classe média e alta poderiam ser o que quisessem ou herdariam o negócio dos pais. Por isso, precisavam de estudo. Quando o Brasil não tinha universidades, nossas elites mandavam os filhos para Portugal ou França. Quando não havia boas escolas, contratavam preceptores e tutores para seus rebentos.
A universalização do ensino básico atravessou a história do Brasil recente como uma conquista e como uma pedra nos sapatos do nosso país. Estamos mais próximos do que nunca de termos todas as nossas crianças em escolas (na média, há entre 90% e 98% de crianças e adolescentes em instituições, variando entre creches e Ensino Médio), mas elas não frequentam, necessariamente, um ensino de qualidade, como preconiza a Constituição em vigor. As discrepâncias são imensas. Há colégios públicos excelentes, bem geridos, com estrutura adequada e professores dedicados. Há escolas particulares medíocres, sem o mínimo projeto para os alunos e com professores malformados. Entretanto, na média, os problemas se concentram no ensino público. Ainda somos uma sociedade com muita desigualdade.
Em meio a conquistas e retrocessos, discutimos hoje o ensino em casa. Isso já foi realidade por aqui e em outros lugares do mundo. Reis e rainhas, nobres e parte da elite europeia jamais viveram outra forma de ensino. Grandes gênios e pessoas muito eruditas estudaram assim. Em si, aprender em casa pode garantir excelência educacional. O potencial problema desse tipo de ensino não é esse, necessariamente. 
Para entendermos, precisamos pensar historicamente. Um dos aspectos tem a ver com o fortalecimento do Estado entre o século 19 e o 20, bem como com sua crise nos dias atuais. Quanto mais forte o Estado se tornou como instituição de regulamentação de nossas vidas, menos importância família e igrejas passaram a ter. Famílias participavam ativamente da escolha dos noivos e noivas. O casamento assegurava herdeiros, a igreja oficializava as uniões. Quando o Estado passou a ser o intermediário e as sensibilidades liberais do 19 afloraram, junto com uma maior produção de riquezas, casamentos passaram a se dar por escolha dos cônjuges, por amor. Casar e se divorciar se tornaram coisas mais corriqueiras. A família é menos importante, para o indivíduo moderno, do que o Estado. Precisamos de empréstimos, recorremos a bancos (regulamentados pelo Estado) e não mais aos pais; precisamos de saúde, vamos a hospitais (e não mais ao membro mais experiente da família) e assim por diante. Logo, educar seguiu esse caminho. Saiu da esfera da casa para ir para esfera da cidadania, dos valores da sociedade e das novas concepções pedagógicas, regulamentadas em escolas por leis federais.
A rigor, a lei não proíbe o ensino em casa. O STF já disse que a prática não pode ser feita, pois carece de regulamentação. Sem leis que regulem a prática, como auferir se o ensino funciona ou não? 
Educar os filhos em casa deveria, ser, a rigor, um direito de cidadania. Sou a favor da regulamentação. Há obstáculos práticos. Raramente, pais têm o preparo profissional. Não se trata apenas do conteúdo, porém da técnica em si. Um adulto alfabetizado ensina bem uma criança? Nem sempre, pois há métodos e debates sobre seus usos. Se quisermos uma comparação rápida e com certa fidelidade, você também deveria ter o direito de curar as doenças do seu filho em casa. Por que médicos? Talvez pelo mesmo motivo de existir professores. Você se sente seguro para prescrever a dosagem do remédio? Então, com certeza, estará apto a optar entre o método fônico de alfabetização ou três ou quatro variantes do processo de letramento.
Sim, deveria ser garantido o direito dos pais para o homeschooling. Mas eu queria enfatizar que os pais assumissem com plenitude o direito constitucional, do código civil e do estatuto da criança e do adolescente que indicam, com total clareza, que a educação é um dever dos pais. É muito complexo educar em casa, todavia imprescindível que os pais façam parte da responsabilidade parental na escola. Que sejam menos pais síndicos ou capatazes e mais pais participantes do desafio social de educar. 
Por fim: crianças educadas em casa perdem a chance do convívio com a diferença e são menos expostas – potencialmente – a pontos de vista conflitantes. Se não enfrentam conflitos, são menos resilientes e com tendência para fragilidade de um sistema imunológico nunca exposto a micro-organismos diversos. Se correr tudo bem, se a família tiver dinheiro para bons preceptores, para complementar com viagens, museus, para estimular o convívio dos filhos com outras crianças em parques e praças de esportes, na outra ponta teremos o mesmo resultado alquímico da escola: talvez um bom cidadão, alguém preparado para os desafios de nosso século e o constante aprender que nos exige. E, no entanto, se funcionar mal, teremos especialistas nas opiniões caseiras, fechados ao mundo. Há risco de reforçar o surgimento de crianças mimadas na sua zona de conforto, pouco aptas ao mundo de diversidades e desafios. Seu filho viverá com você para sempre ou , um dia, terá vida própria? Elizabeth, rainha da Inglaterra, foi educada em casa. Educou os filhos em escolas. O modelo perpetuou-se nas gerações seguintes da família real britânica. Por que será? Boa semana para todos nós.

Onde encontrar a felicidade A amizade importa mais que a riqueza para ser feliz, Susan Andrews , Època


SUSAN ANDREWS
é psicóloga e monja iogue. Autora do livro Stress a Seu Favor, ela coordena a ecovila Parque Ecológico Visão Futuro e escreve quinzenalmente em ÉPOCA. www.visaofuturo.org.brsusan@edglobo.com.br
Minha amiga Vicki Robin nos visitou há pouco, durante sua viagem ao Brasil, para lançar a versão em português, Dinheiro e Vida, de seu livro best-seller nos Estados Unidos (Your Money or Your Life). Um dos assuntos que sempre discutimos é a questão da felicidade. Todos queremos ser felizes. Pessoas mais felizes têm pressão mais baixa e pegam menos resfriados. Como demonstra a enxurrada de livros sobre a nova ciência chamada hedônica (o estudo daquilo que torna a vida prazerosa ou não), mais e mais especialistas estão tentando compreender o que é a felicidade e de onde ela vem.
Descobriram que os homens se sentem mais felizes por volta dos 65 anos, e as mulheres mais infelizes logo após os 45. E que as pessoas que convivem com adolescentes são as mais infelizes de todas!
A maioria de nós acha que ficar rico trará felicidade. Porém, como Vicki nos mostra, desde os anos 1950 o PIB americano triplicou. Em 1991, a família média americana possuía o dobro de carros que em 1950, dirigia 2,5 vezes mais longe, usava 21 vezes mais plástico e voava distâncias 25 vezes maiores. Os lares americanos estão tão abarrotados de coisas que o negócio de guarda de objetos dobrou nos últimos dez anos. Mas o curioso é que nada disso tornou os americanos mais felizes. Na realidade, o nível de felicidade declinou. E não apenas nos EUA. Um recente estudo apurou que a satisfação com a vida na China diminuiu entre 1994 e 2007, um período no qual a renda média real cresceu cerca de 250%.
Como reflete o autor americano Bill McKibben: “Se estamos assim tão ricos, por que será que estamos tão infelizes?”. Mesmo antes da crise imobiliária nos EUA, os americanos já experimentavam mais infelicidade. Uma pesquisa feita pela Universidade Emory verificou que apenas 17% dos americanos se consideram realmente felizes, enquanto 26% estão abatidos ou depressivos.
Dinheiro pode aumentar a felicidade temporariamente. Pesquisas têm demonstrado que comprar algo novo pode elevar os níveis de endorfina, o “hormônio do bem-estar”. Porém esse efeito não é duradouro. Depois de certo tempo, sempre queremos algo mais, ou então sentimos inveja daqueles mais ricos que nós. Nossa satisfação volta para o nível anterior assim que criamos expectativas maiores.
Diversos estudos mostram que a amizade contribui mais para o bem-estar que a renda
A despeito da aparentemente efêmera natureza da felicidade, existem meios para aumentar nossa satisfação a longo prazo. E eles nada têm a ver com dinheiro. Um deles, por exemplo, é ter mais tempo livre. Especialmente, mais tempo com amigos ou a família. Comprovou-se que esses aspectos produzem duradouros aumentos na nossa felicidade. Segundo o cientista político Robert Lane, da Universidade Yale, nos EUA, “as evidências mostram que o companheirismo contribui mais para o bem-estar do que a renda”. Talvez essa seja uma das razões por que os americanos são menos felizes hoje em dia. Durante as mesmas décadas em que sua riqueza inflou, o número de americanos que dizem não ter ninguém com quem discutir assuntos importantes praticamente triplicou.
Incontáveis estudos apontam para a mesma conclusão. Independentemente do nível de renda, as pessoas que têm “bons amigos e são próximos de suas famílias são mais felizes que aquelas que não têm”, constata o psicólogo Barry Schwartz, da Universidade de Swarthmore. Segundo Robert Putnam, cientista político de Harvard, filiar-se a um clube ou a uma sociedade de algum tipo corta pela metade o risco de morrer no ano seguinte.
Valorize suas amizades e as pessoas amadas, porque uma coisa é certa. Como diz o velho ditado, felicidade é algo que o dinheiro não consegue comprar.