terça-feira, 7 de agosto de 2018

Primeiro os meus santinhos, Alvaro Costa e Silva - FSP

A máquina pública a serviço de um projeto de poder

O prefeito do Rio, Marcelo Crivella, durante evento oficial
O prefeito do Rio, Marcelo Crivella, durante evento oficial - Yasuyoshi Chiba - 19.jun.17/AFP
Usar a máquina pública para favorecer grupos religiosos, como faz Marcelo Crivella, é grave. Mas não espanta. Faz parte de um rasteiro, mas eficiente, projeto de poder. 
O Café da Comunhão foi o ato mais memorável da administração Crivella até agora: 250 pastores reunidos, fora da agenda oficial, no Palácio da Cidade. Aos irmãos, o prefeito pregou: “Nós temos de mudar o país. É esse Brasil evangélico que vai dar jeito na pátria”.
Ao oferecer cirurgias de catarata e de varizes aos fiéis, Crivella escandiu as palavras —“ca-ta-ra-ta”, “va-ri-zes”— como se estivesse num púlpito e anunciasse uma revelação divina. Ao seu lado, estava Rubens Teixeira, pastor da Assembleia de Deus, ex-diretor da Transpetro investigado pela Lava Jato e pré-candidato a deputado federal pelo PRB. 
Braço político da Igreja Universal, a sigla integra o centrão que apoia a candidatura Alckmin à Presidência. Fez 106 prefeitos em 2016, entre os quais Crivella, que recebeu 1,7 milhão de votos no vácuo deixado pelo MDB no Rio. Na reunião secreta, ele instruiu os pastores a procurar o “doutor Milton” na hora de acertar a isenção de IPTU para imóveis que abrigam igrejas.
Quando não está trabalhando pelo avanço de pautas conservadoras —proibição do aborto, mesmo para os casos legalmente previstos, e proibição da discussão sobre gêneros—, a bancada do partido em Brasília (21 deputados e dois senadores) atua pela manutenção de privilégios como isenção tributária e concessões de TVs e rádios.
No combate à corrupção, o rigor não é o mesmo. Marcos Pereira, o presidente do PRB, é bispo da Igreja Universal, foi vice-presidente da TV Record e ministro de Temer. Está no rol da Lava Jato, acusado de receber propina de Joesley Batista em troca de linhas de financiamento na Caixa Econômica. Mas nem liga: já está confeccionando os santinhos da campanha a deputado federal.
 
Alvaro Costa e Silva
Jornalista, atuou como repórter e editor. É autor de "Dicionário Amoroso do Rio de Janeiro".

'Dinamismo só se recupera com intervenção do Estado', diz econonista de Boulos, OESP

Matheus Lara, Mateus Fagundes e Caio Rinaldi, O Estado de S.Paulo
07 Agosto 2018 | 10h47
O economista Marco Antonio Rocha, "guru" econômico do candidato Guilherme Boulos(PSOL) à Presidência da República nas eleições 2018, disse nesta terça-feira, 7, que a economia do País só vai recuperar seu dinamismo se o Estado recuperar a capacidade de investimento. Para ele, "programas emergenciais" para "salvar a economia precisam também sinalizar um novo modelo de desenvolvimento". 
marco antonio rocha
Marco Antonio Rocha em participação na série de sabatinas do 'Estado' em parceria com o Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargs (FGV)  Foto: Werther Santana/Estadão
"Nosso diagnótico pós-crise é de que o dinamismo só vai se recuperar com a intervenção do Estado, com capacidade de fazer investimento público", disse na abertura da série de sabatinas "Os economistas das eleições", do Estado em parceria com a Fundação Getúlio Vargas (FGV). "Um plano emergencial factível tem de ser pensado não apenas para solucionar a questão de emprego e renda a curto prazo, mas também precisa ser estrurante, para um médio e longo prazo."
Ele expôs detalhes dos três eixos que a campanha de Boulos propõe para a enconomia brasileira, que, em sua avaliação, "teve sua situação agravada a partir de 2015, com a política de austeridade fiscal".
O primeiro tópico destacado por Rocha é o desenvolvimento produtivo e tecnológico. "O governo tem que pensar uma nova estrutura de fazer política industrial no Brasil. É um desafio também por causa da eatrutura mundial. Nosso plano quer estabelecer canais de legitimação da política industrial e tecnológica com a população."
Rocha também falou da necessidade de "recuperar os mecanismos de intervenção do Estado na economia", ao tratar das empresas estatais e bancos públicos. Ele disse que não há planos de privatização num eventual governo do PSOL. "Essas instituições precisam ser instrumentos-chave. Não dá para financiar por completo a política industrial com o caixa dessas empresas. Queremos dar fim à política de privatizações. A Petrobrás não está desalinhada aos padrões internacionais."
Marco Antonio Rocha
Marco Antonio Rocha participa de debate com os jornalistas do 'Estado' Fábio alves, Renata Agostini, Celso Ming e a pesquisadora Vilma Conceição, da FGV Foto: Werther Santana/Estadão
O economista disse que Boulos pretende ainda "reestruturar a gestãoo macroeconômica. "O regime fiscal tem que ser menos fiscalista e dar mais abrigo a uma política de desenvolvimento. Queremos colocar uma política que permita ao Estado atuar de forma contracíclica contra a crise, com capacidade se investimento a longo prazo. Passar para um planejamento orçamentário plurianual, e não mirando metas de superávit". Ele defendeu ainda uma reforma tributária progressiva, com diminuição de impostos sobre consumo e aumento da carga sobre patrimônio e renda. 
Rocha comentou sobre as negociações com o Congresso Nacional para uma possível reforma fiscal e para que o estado possa atuar "contraciclicamente". "De imediato, é propor a revogação da emenda constitucional 95 (de 2016, que define a inflação do ano anterior como teto para o aumento dos gastos federais a cada ano ). Isso será uma questâo de governabilidade para qualquer governo eleito para o ano que vem. Já estive no Congresso para debates. A gente aceita entrar no debate, mas é preciso ter ganho em eficiência tributaria. Mas não vamos abrir mão, para isso, do funcionamento do nosso sistema de seguridade social."
Previdência
Rocha defendeu também a manutenção do regime de repartição da Previdência Social brasileira. Na sua avaliação, o regime de capitalização, proposto por outras candidaturas, pode passar em momentos de crise. "É complicado para nós adotarmos esse porque nossa história recente mostra que em 20, 30 anos temos grave crise, que pode impactar esta capitalização". 
Para Rocha, a Previdência Social tem papel fundamental na estruturação da economia. "Na minha visão, em cidades do interior e famílias lideradas por idosos a crise atual foi menor por causa da Previdência Social", disse. Rocha ponderou, no entanto, a necessidade de se rever a Previdência de Estados e algumas categorias. "Tudo isso só deve ser considerado pelo presidente a ser eleito", afirmou.
Banco Central
Sobre uma eventual possibilidade de independência do Banco Central, Rocha afirmou que a chapa propõe uma "quarentena" em relação à ocupação dos cargos-chave da instituição, e pede transparência. "A gente costuma dialogar com essa proposta de autonomia devolvendo uma outra pergunta: autonomia de quê?", questionou o economista.
"O que vemos hoje é aquilo que a literatura internacional chama de 'porta giratória'. Profissionais do Banco que passam pelo setor privado e depois voltam para o Banco. Então entendemos que primeiramente precisamos impor uma quarentena em relação à ocupação ds cargos-chave no Banco Central. E quanto à independência, acreditamos que o Banco Central precisa prestar esclarecimentos à população. Precisa passar por sabatina no Legislativo e ter um duplo mandato. Mirar a inflação, mas também responder pelo desemprego."
Sabatinas
A sabatina com Rocha foi o primeiro de oito encontros que o Estado e o Instituto Brasileiro de Economia da FGV promovem com os profissionais responsáveis pela elaboração dos programas econômicos de governo dos principais candidatos à Presidência. Além de Rocha, da chapa do PSOL, estão confirmadas sabatinas com os economistas das campanhas de Marina Silva (Rede), João Amoêdo (Novo), Lula/Haddad (PT), Henrique Meirelles (MDB), Ciro Gomes (PDT), Geraldo Alckmin(PSDB) e Jair Bolsonaro (PSL).
Os fóruns são abertos ao público e têm entrada gratuita mediante inscrição pela internet, no site da FGV (fgv.br). As vagas são limitadas. O público presente também participa do evento mediado por jornalistas do Estado com perguntas aos economistas.
Confira a agenda completa:
10/08 - André Lara Resede (campanha de Marina)
16/08 - Gustavo Franco (campanha de Amoêdo)
23/08 - Márcio Pochmann (campanha de Lula/Haddad)
11/09 - José Márcio Camargo (campanha de Meirelles)
18/09 - Mauro Benevides (campanha de Ciro)
21/09 - Pérsio Arida (campanha de Alckmin)
03/10 - Paulo Guedes (campanha de Bolsonaro)

Ciro tenta reagir a isolamento e acena a eleitor 'não lulista', FSP


Encurralado pelas articulações da cúpula do PT, Ciro Gomes (PDT) busca um caminho pelo “não lulismo” para recuperar fôlego na campanha. O pedetista se viu isolado na esquerda. Passou a fazer acenos a um eleitorado que concorda com suas ideias, mas se distancia do ex-presidente e do petismo.
Nos últimos meses, Ciro havia alfinetado o PT, mas preservava Lula para não alienar o eleitorado que ficará órfão com o provável impedimento da candidatura do ex-presidente.
O pedetista rompeu esse pacto velado de não agressão nesta segunda (6). Em conversa com empresários, criticou as negociações que o deixaram quase sem alianças. “Querem resolver as eleições em gabinetes ou em celas”, disse, em referência a Lula. A plateia gostou. Ciro sorriu.
Em pouco mais de 48 horas, o presidenciável atacou o partido e o próprio ex-presidente outras duas vezes. No sábado (4), em tom amargo, disse que “a cúpula do PT está numa viagem lisérgica” por tentar atraí-lo para uma aliança de última hora.
“Com dor no coração, não espero mais nada do Partido dos Trabalhadores agora”, afirmou. “O interesse do PT passa longe do interesse público. Parte da tragédia que o país está vivendo devemos a esse comportamento estranho do partido.”
Depois de negociar com os petistas e com as siglas do centrão, Ciro acusou a traição. “É só fuxico, só tratativa de gabinete, só conchavo, só rasteira, só punhalada pelas costas. A base moral da falta de escrúpulo na política é a mesma base moral de quem tem falta de escrúpulo diante do dinheiro público”, disparou.
Sozinho por imposição externa, Ciro acena como um outsider. Para se diferenciar do PT, acusa o partido e Lula de fazer uma política suja, que tem laços com a corrupção.
A imagem do candidato apunhalado representa um risco, já que Ciro sempre se vendeu como um governante hábil nas articulações partidárias. Além disso, resta saber se ele comerá as próprias palavras caso precise pedir ou dar apoio a um petista no segundo turno.
 
Bruno Boghossian
Jornalista, foi repórter da Sucursal de Brasília. É mestre em ciência política pela Universidade Columbia (EUA).
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