“Colorless green ideas sleep furiously” (ideias verdes incolores dormem furiosamente) é o exemplo clássico de Noam Chomsky para mostrar que uma frase pode ser gramaticalmente correta, mas não possuir qualquer sentido semântico.
O genial linguista americano o concebeu com o intuito de mostrar que os modelos que explicam a linguagem em termos de relações probabilísticas entre palavras não funcionam. Para ele, é preciso recorrer a esquemas mais estruturados, nos quais a gramática desempenha papel central. Esse é um “hot topic” da ciência e costuma opor linguistas (em geral alinhados a Chomsky) a neurocientistas (que tendem a favorecer os modelos probabilísticos).
Na entrevista que deu à Folha, Chomsky sustenta que Lula está presoinjustamente, mas que o PT sucumbiu à corrupção. Desconfio que haja algo de ideias verdes incolores aqui.
No plano sintático, é possível afirmar simultaneamente que Lula é perseguido e que o PT “se lambuzou”, para tomar emprestada a feliz expressão do petista Jaques Wagner. Mas, quando analisamos o conteúdo semântico dessas declarações, os problemas aparecem.
Se o PT sucumbiu à corrupção, ou seus dirigentes toleraram esse comportamento, ou ignoravam o que se passava à sua volta, ou participaram da farra. Em nenhuma delas dá para exculpar Lula, e, para piorar sua situação, todos os indícios apontam para a terceira alternativa, que é a mais grave delas.
Assim, fica difícil sustentar que Lula seja um injustiçado. O que quer que ele tenha feito de bom para o país não o autoriza a infringir a lei nem as normas éticas pelas quais o PT dizia se pautar. Lembrar que há corruptos em outros partidos também não constitui defesa apta.
Concordo com Chomsky quando ele afirma que a esquerda precisa fazer uma autocrítica. Só acrescentaria que, para que o exame não seja mero exercício de sono furioso, tem de incluir as lambanças de Lula.