quinta-feira, 14 de julho de 2016

O infernal estoque de pobres, por Clovis Rossi, na FSP

22/05/2016  01h32
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Depois de pouco mais de 13 anos de governo do PT, o partido que sempre se considerou o paladino dos pobres, o Brasil conta com 73.327.179 pessoas pobres -o que dá cerca de 36% de sua população total.
Não sou eu quem o diz, mas o sítio oficial do Ministério de Desenvolvimento Social de Dilma Rousseff, ao informar sobre o Cadastro Único para Programas Sociais, que "reúne informações socioeconômicas das famílias brasileiras de baixa renda -aquelas com renda mensal de até meio salário mínimo por pessoa".
Famílias de baixa renda é um piedoso eufemismo para pobres ou, até, para miseráveis, conforme se pode ver quando se separam os cadastrados por faixa de rendimento: de R$ 0 até R$ 77 -38.919.660 pessoas;
de R$ 77,01 até R$ 154 -14.852.534; de R$ 154,01 até meio salário mínimo -19.554.985.
O total é um estoque infernal de miséria e pobreza. Pode até haver mais, porque o cadastro inclui 7,8 milhões de pessoas que ganham mais que meio salário mínimo. Mas não especifica quanto mais.
O estoque existente em janeiro de 2015, a data mencionada no sítio do ministério, torna suspeita a propaganda petista segundo a qual 45 milhões de pessoas deixaram a pobreza nos anos Lula/Dilma.
Se essa informação for verdadeira, ter-se-ia que o estoque de pobres quando Luiz Inácio Lula da Silva assumiu seria de quase 120 milhões (os 73 milhões que continuam de baixa renda em 2015 mais os 45 milhões que escaparam da pobreza). Daria, então, cerca de 60% da população brasileira atual, o que não parece plausível.
Mas o ponto principal nem é esse. O que assusta nos números oficiais é que, se um partido que tinha como retórica permanente a defesa dos pobres lega 73 milhões de brasileiros abaixo da linha da pobreza, o que acontecerá agora que o novo samba de uma nota só é o acerto das contas públicas?
A austeridade, condição sine qua non para ajustar as contas, é, pelo menos nos primeiros momentos, inimiga do crescimento, que, por sua vez, é indispensável (mas não suficiente) para reduzir a pobreza.
Basta ver o estrago social provocado, em vários países da Europa, por políticas semelhantes às que se anunciam no Brasil de Michel Temer.
É verdade que os crentes nas virtudes celestiais dessas políticas dizem, sempre, que haverá um pote de ouro no fim do arco íris. Não é bem o que está acontecendo na Europa, mas só resta aguardar.
Por enquanto, dá para desconfiar que tende a se perpetuar a incapacidade de o Brasil livrar-se do aleijão da pobreza. Frei Betto, amigo e confessor de Lula, desiludido com o governo do amigo, deu entrevista ao "Valor Econômico" em que aponta o que ocorreu nos governos petistas:
"Investiu-se mais em facilitar à população acesso aos bens pessoais (celular, computador, carro, linha branca), quando se deveria priorizar o acesso aos bens sociais (educação, saúde, moradia, segurança, saneamento etc)".

Dá para acreditar que o novo governo investirá em acesso da maioria aos bens sociais, tão reclamados nas manifestações de junho de 2013? 

Cão de guarda, POR INÁCIO ARAUJO


Não entendo de ministérios, nem pretendo dizer muito a respeito.
Mas a ideia de colocar o mórbido secretário de Segurança do Alckmin como ministro da Justiça e rsrs Cidadania parece indicar o quão temível será o governo Temer.
(rsrs quer dizer: rir para não chorar…)
O espetáculo começa!
Pode-se argumentar que ele advogar para um suposto evangélico como Eduardo Cunha não significa muita coisa.
Trata-se de um profissional. Afinal, ele é, ou foi, secretário do católico ultramontano Alckmin.
Mas mandar tropa de choque para cima de estudantes é sua especialidade. Não distingue credos.
Matar pobre na periferia é, ao que parece, um prazer partilhado pela sua polícia.
Tratava-se de dar segurança aos paulistas…
Serão agora os brasileiros todos objeto e sujeito de tal conceito de segurança?
A não esquecer que este é o ministério que cuida da Lava Jato…
O Guardian, que não é bobo nem nada, já se deu conta de que a mudança de governo foi uma maneira de muitos políticos jogarem a bomba nas mãos da Dilma enquanto a coisa esfria.
Ou: será o novo ministro o cão de guarda da plutocracia? Ou também: da corrupção que permanece e precisa ser jogada para baixo do tapete?
Ou ainda: até onde é possível perceber, e tirando o vasto vazio da conversa fiada, parece que o único plano real de governo consiste em botar o Lula na cadeia. E ter polícias em alerta para bater nos dissidentes.
Desculpe, Clovis, mas que alguma coisa muda, muda.
O que não muda: o espetáculo continua nos mesmos canais, nos mesmos telejornais.
P.S. – Nenhuma mulher no ministério, reclamam todos.

Mas também nenhum negro… E índio nem pensar… Ninguém se incomoda com isso? Estão fora do espetáculo? (Filme de índio não dá público, sabe-se).

Guinada à direita no Itamaraty


CELSO AMORIM
ESPECIAL PARA A FOLHA
22/05/2016  01h22
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Uma imagem vale mais que cem palavras, diz o provérbio chinês; e uma ação vale por cem imagens, poder-se-ia complementar. E, no entanto, na diplomacia, as palavras podem ter grande peso.
A combinação das palavras com as ações em matéria de política externa, que se ouviram ou viram até aqui, inspira preocupação.
É até compreensível que o novo chanceler do governo interino defenda o processo que o guindou ao cargo, amplamente criticado no mundo, ainda que uma grande parte da população brasileira considere tal processo ilegítimo.
E não estamos falando apenas dos militantes do PT e do PC do B, mas de artistas e intelectuais, que, de maneira intuitiva, interpretam a alma do povo. Certamente, a imagem da equipe do filme "Aquarius", estampada pela Folhaem sua primeira página da edição de quarta-feira (18), contrasta, inclusive por sua diversidade, com as figuras cinzentas que aparecem na cerimônia de posse do presidente interino.
Evaristo Sá -18.maio.2016/AFP
Novo chanceler brasileiro, José Serra, em seu escritório no Itamaraty, Brasília
Por um momento, ao vê-las, com os áulicos de ontem e de sempre, fui transportado aos eventos palacianos do tempo do governo militar, quando não se viam mulheres, negros ou jovens.
O que assistimos no Itamaraty guarda semelhança com esse quadro mais amplo.
Em suas primeiras ações, o novo chanceler disse a que veio: com palavras incomumente duras, que fazem lembrar os comunicados do tempo da ditadura, como a acusação de que governos de países da nossa região estariam empenhados em "propagar falsidades", as notas divulgadas (aliás, estranhamente atribuídas ao Ministério das Relações Exteriores e não ao governo brasileiro, como de praxe, com o intuito provável de enfatizar a autoria) atacam governos de países amigos do Brasil, ameaçam veladamente o corte da cooperação técnica a uma pequena nação pobre da América Central e acusam o secretário-geral da Unasul (União das Nações Sul-Americanas), um ex-presidente colombiano, eleito pela unanimidade dos membros que constituem a organização, de extrapolar suas funções.
Um misto de prepotência e de arrogância pode ser lido nas entrelinhas, como se o Brasil fosse diferente e melhor do que nossos irmãos latino-americanos.
Talvez, por prudência (ou temor do sócio maior dessa entidade), as notas evitaram palavras equivalentes sobre a OEA (Organização dos Estados Americanos), a despeito das expressões críticas do seu secretário-geral e da Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Até o momento, eximiu-se de manifestar-se sobre as preocupações expressadas pela pequena, mas altiva Costa Rica, insuspeita de bolivarianismo.
Mas o que mais preocupa é o afã em diferenciar-se de governos anteriores, acusados de ação partidária, como se esta só existisse na esquerda do espectro político. Quando o partido é de direita, e as opções seguem a cartilha do neoliberalismo, não haveria partidarismo. Tratar-se-ia de políticas de Estado.
Há muito que "especialistas", cujos discursos são ecoados pela grande mídia, acusam de "partidária" a política externa dos governos Lula e Dilma, esquecendo-se que muitas de suas iniciativas foram objeto de respeito e admiração pelo mundo afora, como a própria Unasul —aparentemente desprezada pelos ocupantes atuais do poder— os Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul; sem os quais não teria havido a primeira reforma real, ainda que modesta, do sistema de cotas do FMI e do Banco Mundial) e o G-20 da OMC (Organização Mundial do Comércio), que mudou de forma definitiva o padrão das negociações em nível global.
Ao mesmo tempo, busca-se derreter o Mercosul, retirando-lhe seu "coração", a União Aduaneira (para tomar emprestado uma metáfora do presidente Tabaré Vasquez).
Em matéria comercial, o afã em aderir a mega-acordos regionais do tipo do TPP (a Parceria Transpacífico ) denota total ignorância das cláusulas, que cerceiam possibilidades de políticas soberanas (no campo industrial, ambiental e de saúde, entre outros).
Chega a ser espantoso que alguém que se bateu, com coragem e firmeza, pelo direito de usar licenças compulsórias para garantir a produção de genéricos, não esteja informado da existência de cláusulas, intituladas enganosamente de Trips plus (na verdade, do nosso ponto de vista, seriam Trips minus), que, de forma mais ou menos disfarçada, reduzem a latitude para o uso de tais medidas, no momento em que comissões de alto nível criadas pelo secretário-geral da ONU alertam para o risco de debilitar a Declaração de Doha sobre Propriedade Intelectual e Saúde, consagrada pelos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, aprovada pelos chefes de Estado na 20ª Assembleia Geral da ONU.
A África, de onde provém metade da população brasileira e onde os negócios do Brasil cresceram exponencialmente —sem falar na importância estratégica do continente africano para a segurança do Atlântico Sul- ficará em segundo plano, sob a ótica de um pragmatismo imediatista. Sobre os Brics, o Ibas (Índia, Brasil e África do Sul), as relações com os árabes, uma menção en passant. Esqueça-se a multipolaridade, viva a hegemonia unipolar do pós-Guerra Fria. Nada de atitudes independentes.
A Declaração de Teerã, por meio da qual o Brasil, com a Turquia (e a pedido reiterado do presidente Barack Obama, diga-se de passagem) mostrou que uma solução negociada era possível, completou seis anos, no dia 17 de maio. Na época, foi exaltada por especialistas das mais variadas partes do mundo, inclusive nos Estados Unidos. Porém causou horror aos defensores do bom-mocismo medíocre em nosso país.
Mas as elites não terão mais nada a temer. Nenhuma atitude desassombrada desse tipo voltará a ser tomada. O Brasil voltará ao cantinho pequeno de onde nunca deveria ter saído.
CELSO AMORIM, diplomata de carreira, foi ministro das Relações Exteriores (governos Itamar e Lula) e da Defesa (governo Dilma) 
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A outra sucessão, por Janio de Freitas

Já se pode entender a atitude sinuosa de Lula desde que acelerada, há dois anos, a guerra aberta contra ele, contra o PT e contra Dilma. A cada ataque mais infeccioso, Lula falava de uma próxima mobilização petista, do breve início de viagens suas "por este país todo", da ocupação manifestante das ruas. Essas reviravoltas foram propaladas tantas vezes quantas descumpridas por marasmo inexplicado. Seu e do partido a reboque. É, porém, em mais uma sinuosidade que se encontra o esclarecimento.
Diz Lula que pode ser candidato para salvar os programas sociais, mas está trabalhando pela candidatura de alguém mais moço. Ou seja, é possível candidato nas palavras, mas na intenção não é. Não quer ser. Já não queria, vê-se, quando o conservadorismo se organizava para montar a barragem contra sua assustadora candidatura. A vontade negativa prevalece, invalidando as sucessivas promessas de ação. E agora entra, de leve ainda, no tempo de admitir-se.
Para quem goste das especulações infrutíferas, que têm tantos adeptos na imprensa, uma indagação se oferece: se Lula houvesse deixado clara e firme, bem lá atrás, a desistência à candidatura em 2018, a oposição partidária, o grande empresariado e a imprensa fariam a mesma campanha para liquidá-lo? Ou antes achariam mais útil gerar, para os seus interesses, as candidaturas promissoras que até hoje não têm?
Sem Lula na corrida, a situação do PT é dramática. Mas a da oposição não é melhor. Temer assegurou-a publicamente de que não será candidato em 2018, e isso deu maior ânimo aos pretendentes peessedebistas para impulsionar o impeachment que é, na forma, anti-Dilma, e no objetivo, anti-Lula. Mas quem no PSDB imagina que o bando mercantilista do PMDB abrirá mão das bocas riquíssimas, vai aprender o que Dilma demorou, mas aprendeu.
Aécio, Serra, Alckmim, e quem mais sonhe com candidatura no PSDB, estão dependentes do governo Temer. Se o arremedo de administração fracassa, nem passarem de governistas a oposicionistas lhes servirá: vão ser responsabilizados, perante o eleitorado, como criadores gananciosos da aventura que deu em desastre maior que o anterior. E estar dependente da competência e seriedade de Moreira Franco, Geddel Vieira Lima e congêneres é, no mínimo, beira de abismo. Mesmo o mais badalado, Henrique Meirelles, é experiente em área financeira, mas uma incógnita em direção econômica, além de sua visão ilusória da política brasileira.
Na oposição, o PT pode até não se beneficiar em grande escala do fracasso do governo. Mas prejudicado não será, por certo ganha alguma coisa. O PT hoje está como a Rede de Marina Silva, são partidos que dependem só de si mesmos. Se souber aproveitar as circunstâncias, o PT pode mesmo fazer e ter surpresas. Em seguida ao golpe de 64, o PCB recebeu adesões espontâneas no país todo. Era a reação natural dos indignados, que hoje são multidões. Caso o PT encontre alguma criatividade, com campanhas que busquem adesões à restauração da democracia, à defesa de direitos e à conquista de novos, pode dar-se sua tão falada e nunca iniciada refundação.
Muita coisa gira, já, em torno de 2018. O PSDB não tem muito a fazer, por mais que a imprensa faça pelos pretendidos pré-candidatos do partido. Assim como a Rede e o PSOL, os petistas têm escolha entre aproveitar ou não as circunstâncias: com ou sem candidatura de Lula, o futuro do PT não está no futuro, está no presente.
Jogadas
Nenhum interesse carreia mais dinheiro, nem com maior constância, para congressistas e determinados integrantes de governo do que a reabertura dos cassinos. É assim há dezenas de anos. Durante o governo Sarney, viagens de congressistas eram patrocinadas por donos de cassinos de Las Vegas, para se animarem com o jogo lá e, na volta, o promoverem aqui. Amaral Netto, que liderava a bancada do jogo, organizou numerosas caravanas. Em tempos recentes, o destino passou a ser o jogo no Uruguai.

As torneiras dos já donos de cassinos e dos desejosos de o serem, brasileiros e estrangeiros, não secam.