terça-feira, 12 de abril de 2016

Rodoanel pode ter desvios de R$ 1,3 bi em desapropriações, diz jornal, do G1

12/04/2016 12h19 - Atualizado em 12/04/2016 14h00


Esquema envolveria peritos judiciais, segundo 'Valor Econômico'.
Supervalorização de propriedades chegaria a 1.000%.

Do G1 São Paulo
Inauguração do Trecho Norte do Rodoanel é adiada para 2017 (Foto: Reprodução/TV Globo)Trecho de obras do Rodoanel norte (Foto: Reprodução/TV Globo)
O Ministério Público de São Paulo apura um suposto esquema de supervalorização em desapropriações para a construção do Trecho Norte do Rodoanel que teria desviado até R$ 1,3 bilhão, segundo reportagem publicada nesta terça-feira (12) pelo jornal "Valor Econômico". O esquema envolveria peritos judiciais.
A obra é uma das intervenções de maior vulto da gestão Geraldo Alckmin (PSDB) e tem investimento de R$ 6,8 bilhões. A construção é feita pela Dersa, empresa do governo estadual. O Departamento de Estradas de Rodagem (DER) é o responsável por indicar peritos administrativos que propõem valores para as desapropriações. Os donos dos imóveis podem contestar os valores, e a Justiça então nomeia peritos judiciais.
A reportagem diz que as investigações apontam indícios de envolvimento de ao menos três peritos nomeados pela Justiça da Fazenda Pública de Guarulhos. A supervalorização dos valores das propriedades chegaria a 1.000% em alguns casos. A apuração já teria levado a área criminal da Justiça de Guarulhos a quebrar de sigilo fiscal e bancário de 28 pessoas.
A Dersa solicitou providências e enviou documentos à Procuradoria Geral do Estado e auxilia o Ministério Público e a Corregedoria do Poder Judiciário na investigação. Procurado nesta terça-feira (12), o Ministério Público não se manifestou sobre a apuração.
Um dos casos citados na reportagem é o de uma propriedade que teve valor de desapropriação ofertado pelo DER em R$ 13 milhões. Um laudo elaborado por um dos peritos investigados, porém, elevou a quantia para R$ 80 milhões. Desse total, mais de R$ 68 milhões foram liberados para saque por ordem da Justiça em 2014, antes de publicação em Diário Oficial, segundo a reportagem.
Os escritórios citados pelo "Valor Econômico" onde atuariam os peritos judiciais investigados são Trama, Sugiyama & Kasten e Tessler, Martins, Araújo. Um dos sócios do segundo, Luis Alberto Araújo, afirmou que o escritório não cometeu nenhuma irregularidade em sua atuação e que os processos seguem o Decreto-Lei nº. 3.365/41 e a Constituição, sendo "conduzidos e julgados equitativamente por juízes e desembargadores". O escritório Trama, Sugiyama & Kasten foi procurado pelo G1, que aguarda possível manifestação.
A Dersa afirma que segue normas técnicas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) e recomendações do Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias (Ibap) para a definição dos valores das desapropriações. A empresa diz que tem “suportado tecnicamente"  Procuradoria Geral do Estado em todas as ações judiciais” que move no sentido de reverter o efeito de perícias inadequadas ou irregulares. Diz ainda que “todos os depósitos efetuados pelo Estado no curso das ações judiciais de desapropriação e relativos a diferenças de avaliação cumpriram determinações judiciais.”
G1 também procurou o Tribunal de Justiça de São Paulo para uma posição dos juízes que atuaram no caso e aguarda possível manifestação.

segunda-feira, 11 de abril de 2016

Zika, EI e Trump, Moisés Naím, OESP

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 - Atualizado:10 Abril 2016 | 19h 33
Não poderiam ser mais diferentes. Zika é um vírus, o Estado Islâmico (EI) é um grupo terrorista e Trump é...Trump. E os três têm surpreendido o mundo. Ocorre que eles têm mais em comum do que parece, à primeira vista. São a versão para o século 20 de fenômenos antigos e recorrentes: epidemias, terrorismo e demagogia.
Os três aparentam ser muito recentes. A epidemia de Zika começou em 2015, o EI nasceu em 2014 e Donald Trump anunciou sua pré-candidatura pelo Partido Republicano nos Estados Unidos em 2015. Os três, porém, possuem antecedentes.
O zika foi identificado pela primeira vez em 1947, encontrado em um macaco em uma selva em Uganda. Os líderes do EI têm uma longa trajetória em outras organizações terroristas islâmicas. Quanto a Donald Trump, em 1987, ele já anunciara aos meios de comunicação que pretendia candidatar-se à presidência dos Estados Unidos, um plano que, na época, não prosperou. No entanto, apresentou-se em 2000, participando como pré-candidato presidencial nas eleições primárias do Partido da Reforma.
Embora epidemias, terroristas e demagogos sempre tenham existido, as recentes manifestações pegaram o mundo de surpresa e sem respostas eficazes para contra-atacar seus nefastos efeitos.
Suspeita-se que o zika seja transmitido especialmente pelo mosquito Aedes aegypti. Em fevereiro, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou que tanto o repentino aumento no Brasil de recém-nascidos com microcefalia, assim como de pessoas afetadas pela síndrome Guillain-Barré (doença rara que atinge o sistema nervoso), constituem um problema de saúde pública preocupante e de emergência internacional.
O Aedes aegypti é bem conhecido das autoridades sanitárias e cientistas, mas o novo vírus que transmite, o zika, não é. Estão sendo feitos enormes investimentos para prevenir os surtos e conter a epidemia. E foram intensificadas as investigações científicas para descobrir vacinas contra o zika e curas para a infecção.
No entanto, o fato é que a comunidade internacional não está preparada para enfrentar a epidemia e pouco se conhece sobre esta ameaça ou a maneira de combatê-la. É um vírus antigo que adquiriu nova força.
Ocorre exatamente o mesmo com relação ao terrorismo islâmico. Ele existe há muito tempo, mas o número de vítimas que já provocou chegou a extremos nunca vistos. Comparados com as mais recentes atrocidades praticadas pelo Boko Haram ou pelo EI, os horrendos atos terroristas do Hezbollah ou o Hamas podem parecer tímidos.
Até para a Al-Qaeda a violência do EI é inaceitável. O comando central da organizaçã,o que foi liderada por Osama bin Laden, emitiu um comunicado distanciando-se do EI e esclarecendo que não tem vínculos com aquela organização. “Al-Qaeda não é responsável pelos atos do EI”, insistiu. 
As táticas e atividades do EI não surpreenderam somente a Al-Qaeda. Sua crueldade, eficácia e métodos de recrutamento também deixaram surpresos governos com enorme experiência em lidar com o terrorismo islamista. “O EI é diferente” é o resignado e reiterado reconhecimento das agências de segurança de países ameaçados pelo grupo terrorista. 
Do mesmo modo se manifestam os líderes do Partido Republicano que tentam impedir a candidatura de Donald Trump e os analistas políticos que nunca imaginaram que o empresário chegaria tão longe. “Trump é diferente”. Similar às ações terroristas do EI, as intervenções de Trump na política dos EUA não têm precedentes. Não se trata apenas das suas inusitadas mensagens ameaçadoras e as propostas agressivas. Trump também mudou a maneira tradicional de financiar as campanhas presidenciais, o uso dos meios de comunicação ou a relação com o establishment do seu partido. Sua habilidade para fazer com que milhões de pessoas acreditem em promessas que nunca serão cumpridas ou que se entusiasmem com a ideia de que basta Trump se tornar presidente para tudo melhorar, deixa os analistas perplexos. 
Um outro fator comum no caso do zika, do EI e de Trump é que os três são, em parte, fruto da globalização. De acordo com artigo da revista Science, o vírus chegou ao Brasil proveniente da Polinésia Francesa e, com a facilidade de se viajar atualmente e o aumento de turistas à época dos jogos da Copa do Mundo, ele se propagou rapidamente. Já há surtos de zika em 30 países e territórios das Américas. 
No caso do EI, com a globalização ficou mais fácil para o grupo recrutar jihadistas na Europa, enviar terroristas treinados para o Ocidente, vender petróleo, administrar suas finanças internacionalmente ou arrecadar doações em todo o mundo. 
E o que seria de Donald Trump sem os mexicanos que, segundo ele, “invadem” os Estados Unidos, os 11 milhões de “ilegais” que promete deportar ou os chineses que levaram milhões de americanos a perder seu emprego? 
Zika, EI e Trump são a continuação de antigos fenômenos. No entanto, na versão atual, são manifestações mais violentas e perigosas dos fenômenos que representam. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO 
*É ESCRITOR VENEZUELANO E MEMBRO DO CARNEGIE ENDOWMENT EM WASHINGTON

sexta-feira, 8 de abril de 2016

A sociedade órfã, por José Renato Nalini, secretário da Educação do Estado de São Paulo



05/04/16

Uma das explicações para a situação de anomia que a sociedade humana enfrenta em nossos dias é a de que ela se tornou órfã. Com efeito. A fragmentação da família, a perda de importância da figura paterna – e também a materna – a irrelevância da Igreja e da Escola em múltiplos ambientes, geram um convívio amorfo. Predominam o egoísmo, o consumismo, o êxtase momentâneo por sensações baratas, a ilusão do sexo, a volúpia da velocidade, o desencanto e o niilismo.
Uma sociedade órfã vai se socorrer de instâncias que substituam a tíbia parentalidade. O Estado assume esse papel de provedor e se assenhoreia de incumbências que não seriam dele. Afinal, Estado é instrumento de coordenação do convívio, assegurador das condições essenciais a que indivíduos e grupos intermediários possam atender à sua vocação. Muito ajuda o Estado que não atrapalha. Que permite o desenvolvimento pleno da iniciativa privada. Apenas controlando excessos, garantindo igualdade de oportunidades e só respondendo por missões elementares e básicas. Segurança e Justiça, como emblemáticas. Tudo o mais, deveria ser providenciado pelos particulares.

Lamentavelmente, não é isso o que ocorre. Da feição “gendarme”, na concepção do “laissez faire, laissez passer”, de mero observador, o Estado moderno assumiu a fisionomia do “welfare state”. Ou seja: considerou-se responsável por inúmeras outras tarefas, formatando exteriorizações múltiplas para vencê-las, se autoatribuindo de tamanhos encargos, que deles não deu mais conta.

A população se acostumou a reivindicar. Tudo aquilo que antigamente era fruto do trabalho, do esforço, do sacrifício e do empenho, passou à categoria de “direito”. E de “direito fundamental”, ou seja, aquele que não pode ser negado e que deve ser usufruído por todas as pessoas.

A proliferação de direitos fundamentais causou a trivialização do conceito de direito e, com esse nome, começaram a ser exigíveis desejos, aspirações, anseios, vontades mimadas e até utopias. Tudo a ser propiciado por um Estado que se tornou onipotente, onisciente, onipresente e perdeu a característica de instrumento, para se converter em finalidade.

Todas as reivindicações encontram eco no Estado-babá, cuja outra face é o Estado-polvo, tentacular, interventor e intervencionista. Para seu sustento, agrava a arrecadação, penaliza o contribuinte, inventa tributos e é inflexível ao cobrá-los.

Vive-se a paranoia de um Estado a cada dia maior. Inflado, inchado, inflamado e ineficiente. Sob suas formas tradicionais – Executivo, Legislativo e Judiciário. Todas elas alvos fáceis das exigências, cabidas e descabidas, de uma legião ávida por assistência integral. Desde o pré-natal à sepultura, tudo tem de ser oferecido pelo Estado. E assim se acumulam demandas junto ao Governo, junto ao Parlamento, junto ao sistema Justiça.

O Brasil é um caso emblemático. Passa ao restante do globo a sensação de que todos litigam contra todos. São mais de 106 milhões de processos em curso. Mais da metade deles não precisaria estar na Justiça. Mas é preciso atender também ao mercado jurídico, ainda promissor e ainda aliciante de milhões de jovens que se iludem, mas que poderão enfrentar dificuldades irremovíveis num futuro próximo.

No dia em que a população perceber que ela não precisa ser órfã e que a receita para um Brasil melhor está no resgate dos valores esgarçados: no reforço da família, da escola, da Igreja e do convívio fraterno. Não no viés facilitado de acreditar que a orfandade será corrigida por um Estado que está capenga e perplexo, pois já não sabe como honrar suas ambiciosas promessas de tornar todos ricos e felizes.
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