domingo, 11 de maio de 2014

Se essa rua fosse minha


Do imbróglio sobre a Oswaldo Imperatrice, viela que vale R$ 5,87 mi no Itaim Bibi

10 de maio de 2014 | 16h 00

Juliana Sayuri - O Estado de S. Paulo
Consta que a Rua Oswaldo Imperatrice, sita no CEP 04542-120, Itaim Bibi, São Paulo, SP, Brasil, está na mira imobiliária. Que, entre chapas metálicas brancas e grafites coloridos com ilustrações como Batman e Coringa, a viela estreita se encontra fechada por portões de ferro verde. Noutros tempos, ainda ladeada por casinhas de vila desocupadas, a travessa foi tomada por grama verde, mas tosca. Agora, meio-fio aos pedaços, a Rua foi "engolida" por uma construção.
A travessa se tornou canteiro de obras na Faria Lima - Alex Silva/Estadão
Alex Silva/Estadão
A travessa se tornou canteiro de obras na Faria Lima
Consta que em novembro de 2012, o prefeito Gilberto Kassab (PSD) encaminhou o PL 477/2012 à Câmara, desincorporando e autorizando a alienação da Rua mediante licitação, sob a justificativa de que "a via sem saída destinada exclusivamente a permitir acesso aos lotes lindeiros não apresenta interesse sob o ponto de vista viário." Consta que, para a compreensão do perfil da Rua, seus 589,41 m² à época valeriam no mínimo R$ 5.872.609,00.
Travessa da Rua Leopoldo Couto de Magalhães Junior, quase na esquina com a Avenida Brigadeiro Faria Lima, a Rua Oswaldo Imperatrice não foi oficialmente incorporada, mas virou um canteiro de obras no Projeto B32 da Faria Lima Prime Properties (FLPP) que, consta, tem autorização da CET para fechar acesso a seus pequenos paralelepípedos com cavaletes e fitas zebradas a fim de manobrar caminhões de cimento, entre 7 de abril e 28 de maio.
Consta nas páginas da metrópole que o presente prefeito Fernando Haddad (PT) engavetou a ideia de vender a Rua, em junho de 2013. Que, porém, o projeto foi endossado por diversas comissões e aprovado em primeira discussão na Câmara, com uma emenda ao artigo 3, definindo em outubro de 2013 que os recursos obtidos deveriam se destinar ao Fundo Municipal de Habitação. Que, outro porém, os vereadores consideraram discutir a proposta no fim de abril de 2014. Assim, a Rua voltou à baila.
Consta que Rafael Birmann é o nome à frente do Projeto B32. Gaúcho, 60 anos, 1,80 de altura, cabelos brancos e olhos azuis, Birmann é um empresário excêntrico. Consta que o incorporador já içou mais de 100 prédios nesta capital. Que é autor do Birmann 21, arranha-céu na Avenida das Nações Unidas que abriga a Editora Abril. Que, vestindo agasalho listrado, jeans e tênis surrado, no seu escritório no edifício New Star, na Faria Lima, declarara eloquentemente:
"Quando Haddad tirou a Rua da pauta, pensei: puta que pariu que tá tudo errado! Aí nós acordamos: para dar certo, antes de tudo, precisamos apresentar o projeto para a sociedade - e para os políticos".
Ao projeto. Rafael Birmann rabiscou o Edifício Faria Lima 3732 por volta de dezembro de 2007, contemplando um espaço multiuso e uma praça pública - estes últimos constando nos seus croquis a partir de janeiro de 2008. Do edifício: uma torre de 30 pavimentos, 24 para escritórios, num total de 120 mil m² de área construída. Do espaço multiuso: um teatro batizado "O Cubo". Da praça: uma área inspirada principalmente no Bryant Park de Nova York. Consta no projeto que a praça teria 6 mil m², arborizada, sem muros nem plaquinhas "não pise na grama", com murais para grafite, mesas e cadeiras soltas. Que seria "um espaço executado 100% com iniciativa privada, mas 200% aberto ao público". Que provavelmente seria apelidada "Praça da Baleia" - "pois se Copenhagen tem sereia, São Paulo terá baleia", na rima de Birmann, que idealizou a escultura do cachalote nas linhas de Jonas, Moby Dick e Pinóquio.
Consta que, na década de 2000, Rafael Birmann arrematou ali 35 propriedades independentes, entre terrenos baldios e casinhas de vila varridas na Operação Urbana Faria Lima dos tempos de Paulo Maluf. Consta que no meio do caminho tinha uma pedra: Oswaldo Imperatrice, "uma rua que não liga nada a lugar nenhum" - mas que, lembre-se de passagem, vale quase R$ 6 milhões, o que está dentro da estimativa de Luiz Paulo Pompeia, diretor da Empresa Brasileira de Estudo de Patrimônio, que diz que um terreno regular nos arredores pode valer entre R$ 10 mil e R$ 15 mil por m². Que, desde 2009, Birmann quer comprar a Rua. Que, a priori, os moradores foram contra, temendo confrontar outro "Quarteirão da Cultura", disputada área que abriga a Biblioteca Anne Frank e a Escola Infantil Tide Setúbal. Que, a posteriori, os moradores mudaram de ideia, após conhecer detalhes ditos idôneos do projeto.
Consta que foi esse o trajeto do empresário Marcelo Motta, da Sociedade Amigos do Itaim Bibi. Primeiro, contra. Depois, a favor: "Já foi. Agora a Rua é morta. A cidade é uma metamorfose, mas deve ser uma metamorfose humana, não agressiva e não engessada. No Itaim ou na favela de Paraisópolis, a comunidade deve ser respeitada. E os responsáveis pelo empreendimento buscaram dialogar com a comunidade, mostraram respeito. A praça promete uma alternativa melhor à Rua. Isso, claro, se o empreendimento cumprir as promessas de compensação. No fim, a gente precisa ter esperança, não é?"
Mas Birmann martela, com razão, que não se trata de uma "contrapartida" (uma rua de 589 m² por uma praça de 6 mil m²). "No projeto original, a praça e o teatro já estavam previstos. Não é uma ‘contrapartida’." Consta que o gaúcho não quer erguer "só mais um" arranha-céu. Que, novamente eloquente, diz numa marretada só: "Arquitetura não é apenas tijolo e cimento. É visão: quero construir um marco na cidade, uma proposta para olhar o empreendimento imobiliário não como algo circunscrito a um terreno, mas como parte de um todo. Não é só x metros, y andares, um muro ali e outro lá. Estamos construindo uma cidade em que cada um fica no seu quadrado, sem diálogo nem urbanidade. Precisamos retomar o urbanismo perdido. A cidade é feita de ruas e prédios interligados - e de gente, oras! Quero discutir o espaço público numa metrópole colapsada como São Paulo. Se ‘tu’ olhar a Faria Lima e a Paulista, todos os prédios são fechados. Quero um prédio aberto, para interagir com a cidade".
Fora dos autos, Birmann conta: "Meus investidores se esgoelam: ‘Pô, Rafael, que é que a gente ganha com isso?!’ Meus sócios pensam que sou idiota, louco, tarado por urbanismo. Dizem: ‘Rafael, não dá mais, a gente tá nessa história da Rua desde 2009. Vamos partir pra outra. Onde tá o lucro?’ E eu estou me sentindo um perfeito idiota, pois estou tendo muito prejuízo e muito atraso. O custo é imenso. Mas eu quero fazer! Porque tenho orgulho, tenho tesão por urbanismo. O endereço fica mais nobre, a cidade fica mais legal. Não sou o malvado da história. Não sou o destruidor de vilinhas. Nosso cinismo está de matar, mas precisamos acreditar na cidade.
Ingênuo, né? Sei que essa minha proposta parece meio naïf, meio imbecil, mas me recuso ao cinismo. Quero fazer um negócio importante para a cidade, pô! É o momento certo: 60 anos, fim de carreira (risos, sonoros). Esse será meu último prédio de escritórios. Depois quero me dedicar ao urbanismo mesmo, talvez com a Fundação Aron Birmann. Dizem que esse prédio será meu legado. Não... Legado é muito boiola".
Atualmente o B32 tem duas alternativas. Plano A: construir o prédio com a praça e o teatro, o que só será possível, por questões geométricas, com a Rua. Plano B: impedida a aquisição da Rua, só dá para construir o prédio. Neste caso, por lei, a travessa deverá ser murada, o que a isolará ainda mais. Birmann, aliás, tem aversão a muros - "que proíbem a passagem e roubam a perspectiva". Consta que o empresário se inspira na linha do Project for Public Spaces (PPS), em cidades como Londres, Nova York, Paris, e em nomes como Jane Jacobs e William H. White. Que transpira ao pensar na espera para poder comprar a Rua: "O projeto é legal. Os moradores aprovaram, o prefeito gostou, o subprefeito gostou. Por que não sai do papel?"
Consta que o advogado Jorge Eduardo Rubies, do movimento Preserva SP, discorda. "O pior espaço público é melhor que o melhor espaço privado. É uma questão de princípios. O espaço público é de todos, enquanto as áreas privadas só podem ser usufruídas por alguns", diz. "Isso abre precedente para privatizar outras ruas. O mais grave é esse domínio do setor imobiliário. Estão destruindo tudo: casarões, fábricas, vilas. Agora querem avançar no espaço público. Não se pode cruzar essa linha. É o fim!"
Consta que o arquiteto Angelo Salvador Filardo Junior, subprefeito de Pinheiros, compreende as ideias de Rubies, mas não as rubrica: "O Preserva SP recusou o projeto por princípios, mas não por lei. Respeito o movimento, mas a Câmara é soberana. Até entendo a ideia de ‘passa um boi, passa uma boiada’, quer dizer, hoje você vende um beco sem saída, amanhã você vende um quarteirão cultural. Mas diferentemente do ‘Quarteirão da Cultura’, a Oswaldo Imperatrice é pequena e, isolada, não poderia ser aproveitada. Agora só terá sentido como parte de uma área maior. O importante é que as compensações sejam feitas, a praça e o teatro. Reitero: o interesse público deve ser garantido antes do interesse particular".
Que conste que o biólogo Helcias de Pádua, do Memórias do Itaim, tem outro olhar sobre a questão. Desde 1946 no Itaim Bibi, Pádua é um apaixonado pelo bairro. "Oswaldo Imperatrice ainda é uma via pública, com CEP, nome e sobrenome. Não é a primeira ruazinha ‘engolida’ pela especulação imobiliária. Lá atrás, os moradores foram expulsos. Ao sair, cada morador leva um pouco da memória do bairro. Depois entram ‘passantes’, que às vezes não têm esse amor pela história. Sempre digo: só preserva quem conhece."
Só para constar: na história do bairro, talvez Oswaldo Imperatrice não simbolize tanto quanto nomes pomposos como Leopoldo Couto de Magalhães Junior (o "Bibi" da família que adquiriu a chácara que os índios se referiam como Itahy, "pedra pequena" no tupi, em 1896). Era um bairro popular, morada de negros alforriados e imigrantes italianos e portugueses. Tornou-se subdistrito em 1934. Na década de 1970, com a abertura de avenidas importantes, como Faria Lima e Juscelino Kubitschek, o bairro começou a se transformar no que é hoje: altamente verticalizado e valorizado. Todavia consta que Oswaldo Imperatrice era um alfaiate, de grande família imigrante italiana na Lapa, onde mantinha a Camisaria Imperatrice na Rua 12 de Outubro, 696 - endereço que agora abriga a popularesca Akamai Hawaiian Surfer. Consta que, em 1970, a camisaria foi premiada como a melhor vitrine no concurso de ornamentações natalinas - e que Oswaldo foi convidado à cerimônia de premiação no Jardim de Inverno Fasano, na Avenida Paulista, onde o vencedor receberia 5 mil cruzeiros e um troféu de ouro. Que em 1975 a camisaria repetiu o feito, eleita a mais bela entre 113 vitrines paulistanas. Que Oswaldo morreu em 12 de janeiro de 1982, tendo missa de sétimo dia na Igreja Dom Bosco, Lapa. Consta nos arquivos do historiador Maurílio Ribeiro, do Arquivo Histórico de São Paulo, que em 6 de outubro de 1982, a "Rua Particular" - que conste a ironia do destino nos autos - recebeu o nome "Oswaldo Imperatrice" mediante o Decreto Municipal nº 18.287. Consta ainda que há Imperatrices espalhados nesta capital, entre Bom Retiro, Brás, Lapa, Pirituba e Pompeia, mas a família se distanciou tanto que muitos não se conhecem pessoalmente. Entre outros laços familiares, Oswaldo é tio-avô de Paulo de Barros Imperatrice, que atualmente mantém a R e Imperatrice Confecções no Brás, e cujo filho, Rodrigo Imperatrice, propõe o seguinte: "Se a Rua não tem mais volta, eles podiam pelo menos batizar a praça de ‘Oswaldo Imperatrice’, né?"
Consta que o urbanista Eduardo Nobre, professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAUUSP), tem questões sobre o imbróglio da Rua. A saber: "O espaço público não é alienável. Faz sentido disponibilizar ruas a interesses imobiliários? Não deveríamos discutir a verticalização, a mobilidade urbana e o esgotamento de áreas arborizadas? Não deveríamos discutir o modelo de cidade que queremos? Infelizmente, a visão neoliberal está invadindo a política urbana".
Nesse beco sem saída, Rafael Birmann não se interessa por discussões políticas polarizadas. "Sou um capitalista até a raiz do cabelo. Mas é um absurdo o que o mau urbanismo faz com o povo." Considera-se um "capitalista do bem"?, questiono. Que conste sua resposta: "Sempre digo: pensar só em dinheiro é muito pobre. Claro que me considero um homem ‘do bem’. Critico alguns colegas empresários que não conseguem ver além do dinheiro. O lucro é vital, mas além dele existe um mundo de outras coisas para serem almejadas e conquistadas".
Nessa quinta marcada por manifestações de sem-teto e sem-terra em São Paulo, a Rua Oswaldo Imperatrice continuava fechada. Enquanto isso, a decisão sobre seu destino ainda tramita na Câmara. "Sinceramente, se eu for obrigado a construir esse prédio sem a praça e o teatro... Prefiro não fazer prédio nenhum. Vou ficar tão puto da vida que posso até vender o terreno, mas não quero construir ‘só mais um’ prédio na Faria Lima. Quero uma praça. Quem não quer?!" Por fim, nessa cidade cimentada por tecnicalidades, decretos e autos, sobre o futuro do urbanismo, ainda nada consta. 

Nível do Cantareira atinge 8,9% da capacidade e bate novo recorde negativo


Os sistemas Alto Tietê e Guarapiranga, utilizados desde o início do ano no remanejamento de áreas antes abastecidas pelo Cantareira, também apresentaram queda neste domingo

11 de maio de 2014 | 12h 45

O Estado de S.Paulo
SÃO PAULO - O nível de armazenamento no Sistema Cantareira atingiu 8,9% de sua capacidade e bateu mais um recorde negativo neste domingo, 11. Em queda há 21 dias consecutivos, o reservatório que abastece a Grande São Paulo recuou 0,2 ponto porcentual de ontem para hoje.
Para efeito de comparação da situação crítica pela qual passa o Cantareira, na mesma data do ano passado, o volume de água armazenado no sistema correspondia a 61,5% de sua capacidade total, quase sete vezes maior que o atual.
Os sistemas Alto Tietê e Guarapiranga, utilizados desde o início do ano no remanejamento de áreas antes abastecidas pelo Cantareira, também apresentaram queda neste domingo. O Alto Tietê caiu de 34% para 33,8%, enquanto o Guarapiranga, de 75,2% para 75,2% da capacidade de armazenamento.
De acordo com a Sabesp e o governo de São Paulo, a captação do chamado "volume morto" do sistema Cantareira deve começar já nesta próxima semana. A previsão é de que as obras para exploração da água do fundo dos reservatórios Jaguari e Jacareí estejam prontas na quinta-feira, 15. O investimento feito pela concessionária foi de aproximadamente R$ 80 milhões.

segunda-feira, 5 de maio de 2014

Comitê quer reservar água em represas para se prevenir de nova crise no verão + Vale do Paraíba (ANA)


Sabesp prevê inicialmente usar metade do chamado 'volume morto' até novembro

02 de maio de 2014 | 2h 05

Fabio Leite - O Estado de S.Paulo
Preocupado com as incertezas que cercam a próxima temporada de chuvas, o comitê anticrise que monitora a seca histórica do Sistema Cantareira pediu aos órgãos gestores do manancial que definam reserva estratégica de água a ser preservada ao fim de novembro, quando a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) prevê o esgotamento do "volume morto" - água represada abaixo do nível das comportas -, que começará a ser captado neste mês.
A recomendação feita à Agência Nacional de Águas (ANA) e ao Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE) revela preocupação com uma possível repetição da estiagem enfrentada neste verão, que foi o mais seco em 84 anos. O grupo anticrise é composto por técnicos dos dois órgãos, dos comitês das bacias hidrográficas Alto Tietê e dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí (PCJ), que recebem água do Cantareira, e pelo diretor metropolitano da Sabesp, Paulo Massato.
"Aos órgãos gestores, ANA e DAEE, que, em função das incertezas envolvidas no regime hidrológico futuro e de eventuais imprevistos, seja definido um volume estratégico a ser preservado ao final do período de planejamento, 30/11/2014", recomenda o comitê anticrise. Segundo o grupo, o "volume útil" do Cantareira, que ontem estava em 10,5% da capacidade, deve acabar em "meados de julho", em plena Copa do Mundo, conforme oEstado antecipou.
No plano emergencial enviado ao comitê, a Sabesp prevê iniciar a captação do "volume morto" no dia 15 de maio nas Represas Jaguari-Jacareí, na região de Bragança Paulista. Os dois reservatórios, que representam 80% da capacidade de todo o Sistema Cantareira, estavam ontem com apenas 3% de volume armazenado. Dali, a Sabesp pretende retirar cerca de 120 bilhões de litros represados abaixo do nível da tubulação, usando bombas flutuantes.
Estimativa. Pelos cálculos apresentados, a quantidade é suficiente para abastecer a Grande São Paulo até o fim de agosto. A partir daí, a Sabesp deve iniciar a captação de 80 bilhões de litros do "volume morto" da represa Atibainha, em Nazaré Paulista, que deve durar até 27 de novembro, conforme estimativa da companhia.
Até esta data, a presidente da Sabesp, Dilma Pena, garantiu o abastecimento de água sem a necessidade de adotar racionamento generalizado. Após esse prazo, a companhia espera que a próxima temporada de chuvas, que normalmente começa em outubro, volte a encher os reservatórios. Mas, para o comitê anticrise, esse cenário ainda é incerto e, por isso, o grupo quer a garantia de uma "reserva estratégica".
Segundo dados apresentados pelo governo Geraldo Alckmin (PSDB), o "volume morto" tem cerca de 400 bilhões de litros. Desta forma, restariam nas represas cerca de 200 bilhões de litros para possível uso em caso de nova seca. A quantidade é suficiente para abastecer a Grande São Paulo por aproximadamente quatro meses.
Segundo o comitê anticrise, a vazão média afluente aos reservatórios do Cantareira entre outubro de 2013 e março deste ano foi de apenas 16,4 mil litros por segundo. Na pior crise registrada até então, entre 1952 e 1953, a vazão média foi de 26,3 mil litros por segundo, ou seja, 60% maior.
Em abril, por exemplo, mesmo após a Sabesp ter reduzido a captação do Cantareira em 6 mil litros por segundo, a retirada média do manancial foi de 23,9 mil litros - 9,1 mil litros a mais do que o volume de água que entrou no período. O déficit, segundo o comitê, representa uma redução de 23,6 bilhões de litros do sistema.
Além de reduzir o limite de captação de água pela Sabesp em 10% anteontem, a ANA e o DAEE devem começar neste mês uma série de encontros com agricultores, indústrias e empresas municipais de saneamento da região de Campinas para avaliar conjuntamente a situação de estiagem local, seu impacto sobre as vazões dos rios e as medidas mitigadoras a serem adotadas.

Comitê quer reduzir o volume de água desviado do Paraíba para abastecer o Rio de Janeiro

Para Ceivap, a redução é necessária para evitar um colapso nos reservatórios da bacia do rio Paraíba do Sul, que estão com 39,5% apenas de sua capacidade
Xandu AlvesSão José dos Campos
O Ceivap (Comitê de Integração da Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul) vai recomendar à ANA (Agência Nacional de Águas) que o rio Paraíba forneça 17 mil litros de água por segundo a menos para o Estado do Rio de Janeiro neste ano.
A redução é necessária, segundo o comitê, para evitar o colapso dos reservatórios da bacia do rio Paraíba, que estão com 39,5% da sua capacidade em março, antes do período de estiagem.
A maior e mais importante das represas da região, a de Paraibuna, que representa 61% de todo armazenamento do sistema Paraíba do Sul e regula a vazão do rio, está com 37% do seu volume.
Os dados reprovam a proposta do governador Geraldo Alckmin (PSDB) de ligar as represas de Atibainha e Jaguari, esta pertencente à bacia do rio Paraíba, para suprir o sistema Cantareira, responsável por abastecer a Região Metropolitana de São Paulo e que está com 10,5% da capacidade.
Em razão disso, o Ceivap irá propor que a vazão mínima de 190 mil litros por segundo exigida pela ANA para o reservatório de Funil, que recebe a água do rio Paraíba e a libera para o rio Guandu, no Rio de Janeiro, seja reduzida para 173 mil litros por segundo.
A decisão foi tomada em reunião no dia 24 de abril, em Resende, e recebeu protestos do Inea (Instituto Estadual de Meio Ambiente do Rio de Janeiro). Segundo participantes do encontro, o Rio de Janeiro é contra reduzir a vazão em Funil por prever problemas de abastecimento no Estado.
“A situação hoje em relação ao abastecimento de água não é tão confortável. O Estado não trabalha com uma folga tão grande”, disse Paulo Carneiro, pesquisador do laboratório de hidrologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, em entrevista à Agência Brasil.

Colapso. A posição do Ceivap é baseada em relatório do ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico), órgão responsável pelo controle da operação da geração e transmissão de energia elétrica no país, que alerta para o risco de colapso da bacia do Paraíba até novembro deste ano.
Simulação feita pelo ONS com base na pior seca já registrada na região, em 1955, mostra que a capacidade dos reservatórios da bacia pode chegar a 1,8% em sete meses, o pior índice da história, quando deveria registrar ao menos 10% antes da estação chuvosa.
O cenário trabalha com a projeção de que as chuvas não serão intensas no final deste ano e nem em 2015, o que poderia representar a falência dos reservatórios do Vale do Paraíba, comprometendo o abastecimento de água na região e o próprio rio.
“Temos que economizar agora para não matar os reservatórios”, afirmou o engenheiro Luiz Roberto Barretti, vice-presidente do CBH-PS (Comitê das Bacias Hidrográficas do Rio Paraíba do Sul).
“A ‘caixa d’água’ é uma só. Se ela secar, acabou”.
Para a Renata Paiva (DEM), vereadora de São José que articula uma reação à proposta do Estado de tirar água da bacia do rio Paraíba, a situação é “muito grave” e merece uma “ação emergencial”.
“O risco de colapso na nossa bacia para 2014/15 é eminente, portanto é fundamental a mobilização da sociedade em defesa do rio Paraíba do sul”, disse a vereadora.
Para André Marques, presidente da Agevap (Agência da Bacia do Rio Paraíba do Sul), a ligação das represas pode prejudicar a qualidade da água do rio. “Com menos água no rio, em uma segunda transposição, a qualidade vai cair.”

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