Quando foi passar o Réveillon de 2017 em Pipa (RN), o cearense Fabrício Cavalcante, 34, teve a ideia de montar um hostel em uma casa alugada.
Logo em fevereiro, assinou contrato para ficar em um imóvel de cinco quartos, que receberiam até 13 hóspedes, e investiu inicialmente R$ 5.360 para pagar aluguel e caução e comprar tintas e roupa de cama. A inauguração do Free Hostel aconteceu em abril.
"Estava muito disposto a fazer acontecer. Pedi demissão do emprego em que eu ganhava R$ 8.000 porque não queria ficar frustrado de nunca ter tentado", diz o engenheiro civil, que trabalhava havia sete anos como supervisor em parques eólicos.
O formato o atraiu pela vontade de oferecer um atendimento mais direcionado e de estimular a interação entre os hóspedes. Em agosto de 2022, o hostel foi transferido para um imóvel maior, de 11 quartos, onde hoje pode receber até 31 hóspedes por diárias a partir de R$ 120.
O lucro com a hospedagem, em torno de R$ 6.000 por mês, é a fonte direta de renda de Fabrício e sua mulher, que têm mais dois funcionários. Embora tenha visto seu salário reduzir consideravelmente, o dono do hostel não se arrepende da mudança de vida. "Minha recompensa tem sido diferente, o que eu tenho de qualidade de vida hoje nem se compara a antes."
A jornalista Claudia Giudice, 58, passou por um processo diferente e mais longo para abrir a pousada A Capela, em Arembepe (BA), a cerca de 40 km de Salvador. Anos antes de inaugurar a hospedagem, em 2012, ela já tinha como meta administrar uma pousada quando se aposentasse.
"Comecei o projeto com antecedência, porque tinha a consciência de que é muito mais complicado montar um negócio quando você está em uma situação de pouca renda."
A construção da pousada aconteceu em um momento de tranquilidade financeira, enquanto Claudia ainda ocupava um cargo de liderança em uma editora em São Paulo.
Segundo ela, foram cerca de R$ 4 milhões investidos ao longo de dez anos, que permitiram que a pousada dobrasse de tamanho, de 8 para 17 quartos —cujas diárias custam a partir de R$ 500. No total, A Capela pode receber até 45 hóspedes, possui uma equipe de 20 pessoas e tem estrutura para celebrar casamentos com 150 convidados.
No início, o principal desafio foi vender Arembepe como destino, à época pouco popular entre a classe média baiana, diz ela, por causa da aldeia hippie. A vila ganhou notoriedade nos anos 1960 e 1970, quando foi visitada por Mick Jagger e Janis Joplin. Turistas de outros estados, que conheciam o local devido à aldeia, não eram tão resistentes.
"Eu entendi que havia aqui uma oportunidade de negócio, porque não existia nenhuma outra pousada de charme. Criamos uma novidade, com uma praia praticamente exclusiva e um serviço muito bom." Ela passou a se dedicar só à Capela em 2014, quando foi demitida da editora.
Segundo Eduardo Faraco, fundador da Faraco Consultoria, especializada em planejamento e gestão hoteleira, o perfil de quem resolve mudar de carreira e partir para a hotelaria inclui investidores que querem diversificar seu portfólio, além dos jovens entre 30 e 40 anos em busca de qualidade de vida e recolocação profissional e pessoas com plano de aposentadoria.
O que esses empresários têm em comum, segundo o professor de administração da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Cleverson Cunha, é a disposição para investir em projetos relacionados a seus estilos de vida e gostos.
"Se antes os empreendimentos eram focados na experiência profissional de cada um, hoje há muitas pessoas que partem para um plano B em algo que as impacte, e o turismo é uma motivação concreta que percebemos no contexto atual", diz o acadêmico.
A Hospedaria Entre Amigos saiu do papel também em 2012, dez anos depois que José Roberto de Almeida, 77, e sua mulher adquiriram uma casa em Búzios (RJ). O casal de cariocas havia comprado o imóvel para empreender e manter uma atividade quando estivessem mais velhos.
Inicialmente, hesitaram em fazer uma pousada por medo de perder a privacidade. Mas os altos gastos com manutenção os fizeram tentar, e eles construíram mais dez suítes, com diárias a partir de R$ 420.
Para ele, estar no local é fundamental para o sucesso do negócio. "Você tem que participar de toda uma rede comercial, social e política, se fazer conhecer e conhecer a realidade da região."
O contato próximo com os clientes e com a cidade é valorizado também na Casa do Pescador, em Camburi (SP), que tem quatro suítes, com diárias a partir de R$ 300.
Em um bom mês, a proprietária Deyse Ribeiro, 72, fatura R$ 40 mil. Ela trabalha com seus dois filhos. Ultimamente, o movimento está baixo, principalmente após a enchente que atingiu o litoral norte de São Paulo no Carnaval.
A ideia do empreendimento partiu do filho de Deyse, que havia perdido o emprego. Ela já estava aposentada e recebia hóspedes em sua casa em São Paulo pelo Airbnb.
"Eu disse a ele que toparia se viéssemos para a praia. Aí encontramos essa casa, de uma família baiana que havia pedido para que um arquiteto fizesse uma casa de pescador típica da Bahia."
Quando compraram o imóvel, por cerca de R$ 550 mil, ele estava coberto de vegetação e tinha problemas estruturais. A reforma durou um ano até a inauguração, em 2016.
Faraco, no ramo hoteleiro há mais de 40 anos, lembra que as redes sociais têm sido o grande mostruário da pequena hotelaria. "É muito difícil para uma pousada ter sustentabilidade financeira apenas esperando o telefone tocar ou receber uma mensagem."
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