quarta-feira, 22 de julho de 2020

Antonio Delfim Netto Atitudes obscurantistas transformaram Brasil em pária ambiental, FSP

Infelizmente, o presidente Bolsonaro administra a pátria amada com os piores preconceitos identitários e religiosos, além de revelar horror às evidências empíricas. Continua a negar o desaparecimento anual de parte da floresta amazônica apurado pelo Inpe. Os dados anuais revelam grandes flutuações, mas sem clara tendência. O aparente aumento entre 2012 e 2019 parece pura ilusão estatística.

Deixemos de lado, por um instante, a “conspiração” interna e externa contra a nossa eficiente e competitiva atividade agroindustrial, resultado do forte apoio político à Embrapa, que “inventou” a agricultura tropical. Esta é, mesmo, respeitada por nossos competidores internacionais —EUA, Europa, Austrália, Argentina, todos fora dos “trópicos”. Feito isso, vamos aos fatos.

Qualquer pessoa informada sobre a proteção ambiental no Brasil sabe que o Cadastro Ambiental Rural (CAR) e o Código Florestal criaram as condições para o conhecimento seguro (como o Inpe faz) em que se desenvolve nossa agricultura. Nem mesmo o deplorável “deixa passar a boiada” do ministro Salles pode alterar isso.

Os números a seguir, calculados pela Embrapa através do CAR para 2018, dão boa ideia do problema: a área destinada à proteção ambiental é de 66,3% do total (unidades de conservação pública e privada e vegetação nativa, 52,5%; terras indígenas, 13,8%).

Trata-se de uma área equivalente à da Europa. A área utilizada para a atividade agropastoril é, por sua vez, de 30,2% do território nacional: 22,2% plantados, lavoura, pastagem, floresta; 8% pastagens nativas. Para cada hectare plantado, temos, portanto, dois reservados à conservação ambiental!

Quanto à Amazônia, é bom lembrar que temos hoje alocados para tentar proteger uma área de 5 milhões de km2 (60% do país) e 17 mil km de perímetro, 40 mil homens da força armada profissional, com a coordenação do vice-presidente Mourão.

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É isso que Bolsonaro e seus ministros das Relações Exteriores e do Meio Ambiente deveriam estar mostrando ao mundo em vez de choramingar contra um complô imaginário que quer nos tirar a Amazônia.

Foram atitudes obscurantistas do ministro do Meio Ambiente (que execrou os competentes burocratas de seus quadros) que ajudaram nossos competidores a transformar o Brasil no pária destruidor do equilíbrio ambiental do planeta Terra.

Essa imagem ganhou força no exterior pela mediocridade da reação do Itamaraty, que, orientado por uma extravagante “filosofia”, emasculou a competente voz de nossos embaixadores, reconhecidos desde sempre como diplomatas altamente sofisticados e eficientes na defesa do interesse nacional.

Antonio Delfim Netto

Economista, ex-ministro da Fazenda (1967-1974). É autor de “O Problema do Café no Brasil”.

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