sábado, 25 de julho de 2020

Fernando Haddad Nordeste, FSP

Tenho sérias dúvidas de que uma revolução teria feito mais pelo Nordeste do que os governos petistas.
Lula nunca fez segredo do seu projeto político. Via o pobre como parte da solução, não parte do problema. E, diante da enorme dificuldade em transformar democraticamente uma sociedade atrasada, tomou a decisão que lhe parecia mais viável para cumprir os seus objetivos.

Sem aumentar a carga tributária —que nos oito anos anteriores tinha passado de 26% para 32% do PIB—, Lula optou por redefinir prioridades e, nas suas palavras, "pôr os pobres no Orçamento da União".

Como a proporção de pobres era muito maior no Nordeste do que em qualquer outro lugar do país, deu-se uma mudança estrutural que nenhum especialista em desenvolvimento regional esperaria.

O Nordeste, tido pela elite econômica como o peso morto que atrasava o progresso do Brasil, ganhou uma projeção que, apesar de recentíssima, foi, de certa forma, naturalizada.

Cisternas, Luz para Todos (energia elétrica), Caminho da Escola (ônibus escolares), Reuni (universidades e institutos federais), Proinfância (creches e pré-escolas) etc. são algumas das iniciativas conhecidas.
As mais debatidas, contudo, pela escala, foram o Fundeb, o Bolsa Família e a transposição do rio São Francisco, ações das quais Bolsonaro tenta se apropriar.

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Matar a fome e a sede de uma mãe e matricular seu filho na universidade passou a ser, no decurso de uma década, uma possibilidade concreta para milhões de famílias nordestinas situadas abaixo da linha de pobreza, enquanto as oportunidades de emprego e renda se multiplicavam em toda região.

Em 1º de abril de 2010, o Twitter do Bolsonaro pontuava: "o bolsa farelo (família) vai manter esta turma no poder". Pois durante a tramitação da PEC de prorrogação do Fundeb —que este governo boicotou o quanto pôde—, Bolsonaro resolveu pegar carona no limite extrateto da complementação da União para fermentar o programa Bolsa Família com a intenção declarada de mudar seu nome para Renda Brasil. Isso depois de comemorar a transposição do São Francisco, obra que recebeu praticamente pronta.

A colunista do UOL Thaís Oyama ouviu de um assessor militar do presidente que "o Nordeste é um campo fértil esperando que o governo faça a colheita" ("Bolsonaro, o pai dos pobres", 26/6/2020). Condizente com a visão do chefe, o militar acrescentou que as viagens não seriam a única ferramenta para a "colheita".

O homem que estima o peso de negros em arrobas e chama os nordestinos de "paraíba" há de receber uma resposta à altura da sua visão agropecuária da nossa gente.

Fernando Haddad

Professor universitário, ex-ministro da Educação (governos Lula e Dilma) e ex-prefeito de São Paulo.

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