Antes de Bolsonaro, outro presidente acreditou às cegas nas Forças Armadas
Do alto de seu palanque presidencial, Jair Bolsonaro espuma, impreca, manda calar a boca e, em seguida, faz-se de indignado e urra que "chega", "sua paciência se esgotou" e que as Forças Armadas estão "com o povo" —leia-se, com ele, Bolsonaro. Dá a entender que, a um comando seu, tanques, aviões e navios se porão em marcha e arriarão o peso de suas armas sobre o STF, o Congresso, a imprensa e quem mais discorde dele. Cita a Constituição, as instituições, a liberdade e a democracia, mas deixa implícito que, para garanti-las, será preciso primeiro destruí-las. E, para isso, está escorado pelos militares.
Muita gente já acreditou nisso no passado. Em 1964, outro presidente, João Goulart, foi levado por uma claque palaciana e sindical a tomar atitudes contra sua natureza de homem tíbio e inseguro, como a de propor reformas "na lei ou na marra", permitir a instabilidade política e insuflar a intranqüilidade nos quartéis. E tudo porque o convenceram de que estava protegido por um "dispositivo militar" organizado pelo general Assis Brasil, chefe da sua Casa Militar.
Segundo o dispositivo, todos os comandos de tropas estavam alinhados com Jango. Os generais A, B e C eram "nossos"; X, Y e Z também; o general K, de São Paulo, era "compadre do presidente"; e Fulano, Beltrano e Sicrano estavam "enquadrados". Tudo nos conformes. Não só as esquerdas acreditaram nisso. A direita também --daí o golpe.
No dia 1º de abril, o golpe marchou, e o fabuloso dispositivo era uma miragem. Seus tanques não saíram, aviões não voaram, navios continuaram boiando. Os generais com que ele contava ficaram em casa, de pijama, ou traíram. O próprio K —Amaury Kruel—, compadre ou não, foi um. O dispositivo existia, mas era o do inimigo.
Bolsonaro já deixou Jango no chinelo em matéria de barbaridades contra a ordem legal. Está confiante em seu dispositivo militar.
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