A década que se encerra neste ano amargará, por larga margem, a menor taxa acumulada de crescimento econômico já registrada no país pelas estatísticas e estimativas que alcançam até o início do século passado.
A se confirmar o centro das projeções dos analistas, segundo pesquisa do Banco Central, o PIB (Produto Interno Bruto, medida da renda nacional) encolherá 4,1% em 2020, devido ao impacto da pandemia do novo coronavírus.
Nessa hipótese, o PIB brasileiro encerraria o decênio com alta acumulada de somente 1,9% —desempenho que seria considerado ruim mesmo para um único ano.
Não existe nada parecido na história documentada do país. Na chamada década perdida, se considerado o período de 1981 a 1990, a economia teve crescimento de 16,9%, em meio à disparada da inflação e a calotes da dívida externa.
Se levados em conta quaisquer períodos de dez anos, a taxa acumulada mais baixa até aqui é a de 2009-18, de 12,8%. Nesse intervalo, o país viveu duas recessões diferentes.
O mesmo tende a se dar agora. Depois do ciclo de encolhimento do PIB de 2014-16, as medidas de combate à Covid-19 provocam uma nova —e possivelmente ainda mais aguda— retração das atividades produtivas.
A magnitude da nova queda ainda é difícil de estimar, e as projeções têm caído a cada semana nas pesquisas do BC.
A piorar o quadro, a renda nacional nem mesmo havia recuperado o patamar medido antes da última recessão, ou seja, o do início de 2014. Os últimos três anos foram de cifras fracas de expansão.
Não é improvável, por isso, que ao fim deste ano o PIB tenha retrocedido a um nível similar ao de 2010 —a despeito do aumento populacional ocorrido desde então.
Calamidades econômicas são eventos relativamente raros no Brasil, como se pode notar na série histórica elaborada pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, ligado ao Executivo federal) com início em 1901.
Nessas 12 décadas, registraram-se quatro grandes recessões em duração e intensidade —não está na lista a que já deve estar em curso. Em comum, todas tiveram impactos políticos dramáticos.
A primeira, sobre a qual só existem estimativas, resultou em queda calculada em 5,3% do PIB no biênio 1930-31, na esteira da Grande Depressão provocada pela quebra da Bolsa de Nova York, em 1929.
Tratava-se de um desastre para um país pobre e rural, que enfraqueceu a oligarquia agrária e deu fim à era conhecida como República Velha.
Nas décadas seguintes, o Brasil experimentaria um processo de urbanização, industrialização e crescimento econômico mais acelerado, com intervenção estatal na forma de criação de empresas, proteção comercial e subsídios.
Tal modelo, chamado de desenvolvimentista no léxico doméstico, perdurou com idas e vindas até a década de 1970, quando se observou o "milagre econômico" da ditadura militar —o PIB cresceu 128,8% de 1971 a 1980.
As taxas recordes de expansão, no entanto, se fizeram acompanhar de mais inflação e, sobretudo, endividamento externo. Quando os juros internacionais subiram, a dívida se tornou impagável.
A consequência foi a recessão mais aguda já medida no país (ressalvadas mudanças metodológicas nas contas): entre os anos de 1981 e 1983, o PIB encolheu 8,5% ao longo de nove trimestres, apressando a derrocada do regime.
Mesmo após a retomada, a crise persistiria na forma de inflação sem controle, desorganizando as relações entre empresas e consumidores e comprometendo a retomada da atividade.
Na tentativa de conter a alta de preços, o Plano Collor, de 1990, agravou e prolongou um ciclo de retração que havia começado no ano anterior e só acabaria em 1992.
Depois do bem-sucedido Plano Real, em 1994, o país viveu anos de relativa estabilidade monetário e crescimento econômico em geral modesto, mas sem grandes oscilações --até o colapso das finanças públicas em 2014.
Consequência do desenvolvimentismo ressuscitado pelo governo Dilma Rousseff (PT), uma nova escalada da dívida pública desencadeou uma crise política e econômica. Como Collor, Dilma sofreu um processo de impeachment.
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