BRASÍLIA
O novo sistema de avaliação de pós-graduação no Brasil vai ampliar a análise de indicadores e passará a focar fatores como impacto social, interação com o setor produtivo regional e a vocação de cada programa. A própria escala de notas atribuída aos cursos deve ser alterada.
O governo Jair Bolsonaro (PSL) planeja ter o novo modelo até o fim de 2020, para que a implementação ocorra no próximo ciclo de avaliação, que começa em 2021 —o ciclo é realizado a cada quatro anos, com acompanhamentos periódicos.
A avaliação dos cursos de pós-graduação —mestrado e doutorado— é de responsabilidade da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), autarquia ligada ao MEC (Ministério da Educação).
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As discussões do novo modelo começaram oficialmente em 2017, ainda no governo Michel Temer (MDB).
Os programas de pesquisa recebem notas com base no desempenho em indicadores, mas as informações de pesquisa (como quantidade de artigos e citações) têm maior protagonismo. Outros aspectos, como impacto social, carecem de indicadores e ficam sem peso na avaliação final.
Os programas de pesquisa recebem notas com base no desempenho em indicadores, mas as informações de pesquisa (como quantidade de artigos e citações) têm maior protagonismo. Outros aspectos, como impacto social, carecem de indicadores e ficam sem peso na avaliação final.
O objetivo da reformulação é, segundo a Capes, garantir um acompanhamento que reflita um panorama mais amplo dos pontos fortes e áreas em que há necessidade de melhoria de cada programa.
O presidente da Capes, Anderson Ribeiro Correia, diz que a chamada análise multidimensional também servirá para induzir pesquisas de maior impacto científico, social e econômico.
"Com a avaliação, vamos incentivar que a pesquisa tenha maior impacto na sociedade, na indústria, estaremos em busca de uma pesquisa mais relevante", diz Correia.
O novo sistema trará indicadores em cinco dimensões: transferência de conhecimento, internacionalização, impacto na sociedade, formação e pesquisa.
A Capes ainda analisa quais serão os indicadores de cada dimensão, mas devem compor esse sistema, por exemplo, informações de pesquisas com engajamento regional, evolução salarial do egresso, criação de empresas e projetos de extensão universitária.
"A gente quer que a universidade cumpra sua vocação regional e os indicadores vão medir [esse impacto]", diz.
O próprio sistema de notas será alterado. Em vez de ter um conceito único por programa, haverá uma nota para cada uma das cinco dimensões.
Atualmente, a escala de notas vai de 1 a 7. Para funcionar, programas precisam receber conceito mínimo 3.
Essa avaliação norteia a priorização de concessão de bolsas e também a autorização de funcionamento dos cursos.
O ministro da Educação, Abraham Weintraub, tem feito críticas à qualidade da pesquisa brasileira, que, segundo ele, teria baixo impacto.
A Capes passou neste ano por um corte que atingiu 8% das bolsas de pesquisa por causa de bloqueios de orçamento. A maior parte dos cortes atingiu programas nota 3.
O governo ainda planeja uma fusão da Capes com o CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), outra agência de apoio à pesquisa ligada ao Ministério da Ciência.
O país tem 4.591 programas de pós-graduação. Um terço tem nota 3, metade deles recebe notas 4 e 5, e 11%, 6 e 7. Essa escala de notas deve ser alterada. Estuda-se uma escala que vá até 5.
Informações sobre pesquisa e formação continuarão, entretanto, como primordiais: um desempenho mínimo nesses quesitos deve permanecer como parâmetro de autorização de funcionamento.
Os cursos deverão ter bons indicadores em todas as dimensões, mas haverá um olhar diversificado para cada área.
Um curso de filosofia não terá, naturalmente, necessidade de transferir tecnologia. Por outro lado, um mestrado profissional que não tiver bons indicadores de relação com o mercado pode ser descredenciado, segundo exemplos do presidente da Capes.
Parte desses aspectos não é ignorada na avaliação atual, mas, segundo a Capes, não ganha destaque pela falta de indicadores definidos.
"Hoje, o impacto social tem visibilidade menor pela falta de indicadores claros", diz a diretora de Avaliação da Capes, Sônia Báo.
Análises internas da Capes mostram que há programas que poderão ter notas reduzidas, como alguns considerados de excelência internacional (6 e 7) mas que não registram indicadores de internacionalização consistentes.
Por outro lado, pós-graduações que tenham bons resultados de inovação poderão ter seu trabalho mais evidenciado.
A cientista Helena Nader, presidente de honra da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), avalia como positiva a proposta, mas ressalta alguns riscos em relação à definição de indicadores.
"Meu medo é banalizar. Tem de ter critérios muito claros, e, antes de pôr em prática, simular para entender o impacto", diz ela, que também diz estar preocupada para que o novo modelo não desprestigie a pesquisa básica. "Há uma dificuldade com patentes, porque demora dez anos para aprovarem."
"O grande desafio é que a evolução do modelo ocorra sem sustos, sem causar descontinuidade no processo avaliativo", afirma o professor Jorge Audy, da PUC-RS, que preside a Comissão Nacional de Acompanhamento do Plano Nacional de Pós-Graduação, que trabalha nas discussões.
Mais de 80% dos programas funcionam em instituições públicas, apesar de, na graduação, 75% dos alunos estarem em particulares.
O presidente da Capes diz que o novo modelo deve beneficiar os dois lados: vai incentivar as públicas a buscarem recursos e parcerias com a iniciativa privada e valorizar as privadas que têm maior facilidade de fazem isso.
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