Marcos da Costa*
08 de março de 2022 | 08h30
Este Dia Internacional da Mulher de 2022 chega impactado por áudios machistas, sexistas, misóginos, que ainda traduziram uma covardia, pois indicavam abuso de situação de vulnerabilidade de mulheres ucranianas, impactadas pela guerra iniciada pela Rússia, com a agravante de seu autor ser um Deputado Estadual, uma autoridade eleita para representar a sociedade paulista. E ainda estão bem vivas na memória as imagens captadas pelas câmeras do Plenário da Assembleia Legislativa de um outro Deputado Estadual, nesta mesma legislatura, se encostando e apalpando uma de suas colegas.
Essas situações gravíssimas são apenas a parte visível e desprezível de um machismo que se encontra ainda enraizado em nossa sociedade e, por consequência, na estrutura de instituições paulistas.
A Assembleia Legislativa de São Paulo, que tem na sua composição aqueles deputados estaduais, desde os remotos tempos da extinta Assembleia Legislativa Provincial, de 1889, até nossos dias, jamais teve eleita uma mulher presidente. Na atual legislatura foram eleitas 19 mulheres, um número recorde; mas apesar do avanço, a Casa democrática tem uma representação feminina bastante baixa, de apenas 20% das 94 cadeiras no Parlamento paulista.
Jamais tivemos também uma mulher Governadora de São Paulo, isso considerando desde os tempos do Brasil Colonial com os donatários da capitania de São Vicente, em 1534, até os tempos atuais. E, por incrível que pareça, São Paulo nunca teve também uma Vice-Governadora.
No âmbito do sistema de Justiça Paulista, poucos avanços, e de forma bastante lenta, têm ocorrido.
No Ministério Público Paulista, onde Zuleika Sucupira Kenworthy foi a primeira mulher a ingressar por concurso de 1948, só em 2019 teve eleita a sua primeira Corregedora-Geral, Tereza Cristina Maldonado Katurchi Exner, e até hoje não teve uma mulher presidindo sua associação classista, a Associação Paulista do Ministério Público – APMP, assim como jamais teve uma mulher nomeada Procuradora-Geral de Justiça.
No âmbito do Poder Judiciário paulista, embora o Tribunal de Justiça tenha sido instalado em 1874, e promova concursos desde 1922, somente em 1980 foram aprovadas as três primeiras mulheres para ingressar na magistratura: Berenice Marcondes Cesar, Iracema Mendes Garcia, e Zélia Maria Antunes Alves. E apenas em 1997 foi nomeada a primeira mulher a integrar o TJ, a desembargadora Luzia Galvão da Silva, cujo ingresso na Corte se deu através do quinto constitucional, vaga do Ministério Público.
Por incrível que pareça, ainda não tivemos nenhuma mulher ocupando cadeira no Conselho Superior da Magistratura, formado pelo Presidente da Corte, seu Vice-Presidente, o Corregedor-Geral, o Decano, e os Presidentes de cada uma das três sessões, de Direito Público, Direito Privado e Direito Criminal, o que significa também que nenhuma mulher, jamais eleita para qualquer desses cargos de comando da Justiça Paulista.
Em 2018, conversando com o então presidente do Tribunal, Desembargador Pereira Calças, fiz duas ponderações sobre a presença de mulheres na Corte. A primeira foi a de que jamais uma mulher havia sido eleita para compor o Órgão Especial. E a segunda foi que, nos bustos que ornavam o Tribunal, em sua tradição de homenagear os grandes nomes que construíram a Justiça Paulista, advogados, promotores e magistrados, não havia nenhum de uma mulher, como se elas não merecessem as mesmas homenagens destinados aos homens do direito. O presidente disse compactuar com essas críticas e que já estava se esforçando para mudar o cenário.
De fato, naquele mesmo ano de 2018 tive a honra de participar, como presidente da OAB SP, da posse da primeira mulher eleita para o Órgão Especial do TJ, a desembargadora Maria Cristina Zucchi, que havia ingressado na magistratura pela via do Quinto Constitucional, vaga da Advocacia.
E ainda em 2018 a OAB SP recebeu autorização para promover a entronização do primeiro busto de uma mulher nas galerias do Tribunal, fazendo homenagem à Maria Augusta Saraiva, a primeira formada em direito pela Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, em 1902, e a primeira a exercer a advocacia em São Paulo.
Nossas esperanças de mudança desse cenário tomaram um novo e importante impulso neste ano de 2022 quando, ao completar 90 anos de sua criação, tomou posse a primeira mulher presidente da OAB SP, Patrícia Vanzolini, que esperamos, seja precursora de um movimento que possa levar a aplaudirmos, em breve, mulheres também no comando do Ministério Público e do Tribunal de Justiça de São Paulo.
*Marcos da Costa, advogado, ex-presidente da OAB SP gestões 2013 a 2015 e 2016 a 2018