terça-feira, 25 de setembro de 2018

Grupo Globo contrata consultoria para reunir TV aberta e paga numa só, FSP

Segundo CEO, objetivo é juntar Rede Globo, Globosat e outras numa 'única empresa, mais ágil e forte'

Nelson de Sá
SÃO PAULO
O presidente-executivo do Grupo Globo, Jorge Nóbrega, distribuiu nesta segunda-feira (24) um comunicado para toda a empresa, anunciando o que chamou de Programa Uma Só Globo.
O grupo contratou a consultoria Accenture para "trabalhar em diversas frentes, a partir da nossa visão comum de grupo", para alcançar como resultado "a transformação da TV Globo, Globosat, Globo.com, DTCORP e Som Livre em uma única empresa, mais ágil e mais forte".
Apresentadora Tatá Werneck recebe o cantor Michel Teló; durante a segunda temporada do Lady Night, no Multishow
Apresentadora Tatá Werneck recebe o cantor Michel Teló; durante a segunda temporada do Lady Night, no Multishow - Gianne Carvalho/Multishow/Divulgação
Para encabeçar o projeto, Rossana Fontenele, até então a diretora-geral de Planejamento e Gestão da TV Globo, assumiu nesta segunda como diretora-geral de Estratégia e Desenvolvimento de Negócios.
"Nesse momento", segundo Nóbrega, os jornais, revistas e rádios do grupo não farão parte do programa. Abaixo, a íntegra do comunicado.

Programa Uma só Globo
O Grupo Globo tem uma história vitoriosa de transformações e mudanças. Ao longo de seus 93 anos de existência, criamos empresas e negócios, enfrentamos e vencemos dificuldades, inovamos, erramos e aprendemos com nossos erros. Mudar e evoluir, portanto, é parte do que somos.
Como vocês todos sabem, os negócios de mídia estão se transformando aceleradamente no mundo todo. Queremos estar à frente dessas mudanças e ser um exemplo de empresa bem-sucedida no novo cenário. Já estamos há algum tempo trabalhando em diversas iniciativas que levam a novas formas de atuar e representam um trabalho conjunto de nossas empresas e profissionais. Quero destacar quatro frentes que exemplificam esse processo:
Projeto Esportes, liderado por Roberto Marinho Neto, que tem por objetivo definir um novo modelo de gestão de esportes para TV Globo e Globosat, buscar integrar a produção de conteúdo esportivo (fábrica de esportes) e gerir esportes com uma visão de resultados e de conjunto.
Projeto de Inteligência & Publicidade Digital, liderado por Eduardo Schaeffer, que visa organizar uma área central de inteligência e comercialização dos ativos digitais produzidos pela TV Globo, Globosat e Som Livre, baseada em dados e conhecimento do consumidor.
Projeto OTT/Novo Globoplay, liderado por João Mesquita, que vai oferecer em uma plataforma de distribuição única, diretamente ao consumidor, um amplo serviço de vídeo com conteúdos produzidos pela TV Globo e pela Globosat, além de conteúdos internacionais.
Projeto Uma Só Tecnologia, liderado por Rossana Fontenele, que está organizando a tecnologia como uma função única e integrada para TV Globo, Globosat, Som Livre, Globo.com e DGCORP.
Esse conjunto de projetos mostra uma direção: integrar equipes e estruturas, desenvolver novas áreas de competência, criar novos negócios e buscar novas receitas. Queremos, agora, acelerar e tornar mais robusto esse processo de transformação. Vamos preservar o que sempre fizemos com excelência, de forma ainda melhor e mais eficiente. Mas também vamos criar novos negócios, aproveitando as oportunidades que a tecnologia e o conhecimento do nosso consumidor nos propiciam.
Estamos lançando, hoje, um ambicioso programa que chamamos de Uma Só Globo (usando o título do projeto bem-sucedido já utilizado pela TV Globo, agora aplicado ao nosso conjunto de empresas). Para nos ajudar nessa tarefa, contratamos a Accenture, líder mundial em consultoria de tecnologia e transformação empresarial. As equipes de consultores e dos nossos profissionais de diferentes áreas e empresas irão trabalhar em diversas frentes, a partir da nossa visão comum de grupo. O resultado final será a transformação da TV Globo, Globosat, Globo.com, DGCORP e Som Livre em uma única empresa, mais ágil e mais forte.
Vamos atuar em duas vertentes ao mesmo tempo: na melhoria e aperfeiçoamento de nossos negócios e atividades atuais e na criação de novos negócios. A partir da nossa visão de futuro, vamos criar objetivos concretos e mensuráveis, que serão trabalhados de forma estruturada por equipes mistas de consultores e profissionais da casa, produzindo soluções a serem imediatamente aplicadas. O programa deve durar três anos.
Com o objetivo de liderar o Programa Uma Só Globo, indiquei a Rossana Fontenele, atual diretora-geral de Planejamento e Gestão da TV Globo. Rossana assumirá desde já a posição de diretora-geral de Estratégia e Desenvolvimento de Negócios, subordinando-se diretamente a mim.
Na nova função, Rossana será responsável por todos os projetos do Programa Uma Só Globo, que começam a ser criados em outubro. Continuará respondendo pelo projeto Uma Só Tecnologia e apoiará a implantação dos atuais projetos Globoplay, Esportes e Publicidade Digital, cujos líderes continuarão subordinados a mim. Rossana vai acumular o novo cargo com suas atuais funções na TV Globo até o fim do ano.
Na sua estrutura a partir de janeiro, Rossana contará com Raymundo Barros, atual diretor de Tecnologia da TV Globo, que passará a liderar a nova estrutura integrada de tecnologia, com Cristiane Delecrode, atual diretora corporativa de Planejamento e Controle, e com Cintia Moraes, atual diretora de Planejamento Estratégico da DGCORP.
As empresas TV Globo, Globosat, Som Livre, bem como as demais áreas da DGCORP, seguem subordinadas a mim, assim como a Editora Globo/Infoglobo/Valor Econômico e o Sistema Globo de Rádio. Estas duas últimas, no entanto, não farão parte nesse momento do Programa Uma Só Globo.
Estamos fazendo um grande investimento no nosso presente e no nosso futuro. Os próximos três anos serão um período de muita efervescência e de muitas oportunidades de aprendizado e crescimento para todos. Quero convidar cada um de vocês a participar dessa construção, trazendo seus conhecimentos, sua dedicação e sua capacidade de colaborar e aprender.
Jorge Nóbrega
Presidente Executivo

Na reta final, temos uma eleição de símbolos, FSP

A estratégia da direita aponta para a desconstrução de um status quo

Estamos entrando na reta final de uma eleição singular. A gênese dessa singularidade foi a falha da elite política em compreender as jornadas de junho de 2013. Uma oportunidade perdida, pois, se o momento galvanizava uma série de insatisfações acumuladas, também possibilitava um aprimoramento cívico substantivo. Para o establishment político, quase todo perplexo, era um inconveniente a ser superado, e não a se adequar. Pagou-se um preço.
Na ocasião, a esquerda, sob o PT, não soube aproveitar para avançar sua pauta buscando um aggiornamento programático e do campo progressista ao seu redor. Sentia-se confortável com o segmento conservador de sua coalizão. A centro-direita, sob o PSDB, também não o soube. Não entendeu isso à época e abriu a caixa de pandora do impeachment, soltando um predador. Achou que o prenderia novamente. Enganou-se.
O que não se percebeu foi que havia no ar então uma crença democrática na mudança, disputando com o sentimento de desilusão o protagonismo da vida política a se seguir. As redes na ocasião já refletiam e aceleravam a dinâmica das ruas, operando um universo mais complexo do que o captado nas pesquisas. O que ocorre hoje é equiparável a “town meetings” em tempo real, de milhões de microcontribuições, culturais e políticas. O indivíduo no Brasil ressurge pós-2013 como sujeito político ativo se mobilizando nas ruas, mas organizado e impulsionado pelas redes sociais.

Democracias podem morrer, *JOSÉ ÁLVARO MOISÉS, O Estado de S.Paulo

Presidenciáveis têm de dizer como pretendem recuperar a confiança das pessoas na política

*JOSÉ ÁLVARO MOISÉS, O Estado de S.Paulo
25 Setembro 2018 | 03h00
Democracias podem morrer quando líderes eleitos violam as regras democráticas, incentivam a violência, contestam a legitimidade dos adversários e atacam as liberdades civis. O diagnóstico de estudiosos como Steven Levitsky se baseia nos exemplos de Putin, Erdogan, Chávez, Maduro e Trump, mas omite um aspecto importante: a sensação dos cidadãos de que não contam no funcionamento da democracia produz desprezo pelo regime e a ideia de que pouco importa se ele for substituído por alternativas autoritárias.
O Brasil tem democracia, mas seu sistema de representação está em crise. Mais de 90% de entrevistados de pesquisas de opinião declaram não se sentir representados por nenhum partido político e apenas 16 milhões de eleitores são filiados a eles. Em 2014, 45% de entrevistados de uma pesquisa declararam que a democracia pode funcionar sem os partidos políticos e outro tanto disse a mesma coisa do Congresso Nacional. Em 2013, quase 2 milhões de manifestantes já haviam dito isso, mas os partidos não se abriram aos jovens desejosos de ingressar na vida pública, e a distância entre governados e governantes só aumentou.
O Brasil é um caso extremo de fragmentação partidária, com 35 partidos, e outros 50 pedem registro, mas os eleitores não se sentem representados. Os programas partidários são frágeis em termos de disputas de projetos para o País e não enfrentam os desafios da governabilidade. A fragmentação corrói a responsabilidade dos partidos que, dominados por oligarquias que se perpetuam na sua direção, carecem de democracia interna e estão fechados à participação de seus apoiadores.
A resistência dos partidos brasileiros a adotar mecanismos como o de eleições primárias do sistema norte-americano é uma indicação do bloqueio à participação dos eleitores. Nas primárias, com base na posição dos postulantes a candidato, eleitores escolhem delegados às convenções partidárias, que tomam a decisão final. Milhões de pessoas se mobilizam, às vezes por mais de um ano, fazendo os candidatos considerarem as demandas específicas dos eleitores. O processo é inclusivo e vitaliza a democracia representativa.
No Brasil, a qualidade da democracia está em questão. Giovanni Sartori, cientista político italiano, discutindo o significado original da palavra grega demokratia, composta por demos (povo) e kratos (poder), argumentou que esse regime assegura a soberania do povo pela interação de dois princípios fundamentais: o demos-proteção e o demos-empoderamento. O primeiro assegura a liberdade e protege os cidadãos do arbítrio, o segundo garante o seu poder de escolher, influenciar e controlar quem governa em seu nome. O voto, então, é o instrumento pelo qual os eleitores garantem direitos, escolhem governantes e defendem seus interesses.
Mas ele não esgota o princípio de autogoverno dos cidadãos, reclama o entendimento dos eleitores sobre o que está em jogo na política e prevê meios de eles influírem no andamento do processo. Isso remete ao papel dos partidos para evitar que no interregno entre eleições os cidadãos sejam apenas objeto da ação dos eleitos. Para tanto o sistema eleitoral precisa traduzir os desejos e aspirações dos cidadãos no funcionamento das instituições. Se isso está bloqueado, as pessoas se frustram com a política, retiram a sua confiança nas instituições e duvidam que a democracia resolva os problemas da sociedade.
O sistema eleitoral brasileiro tem distorções que comprometem suas funções, como a desproporcionalidade entre a população das circunscrições eleitorais e seu teto de cadeiras na Câmara, resultando em pesos distintos dos eleitores dos Estados, violando o princípio “um homem, um voto”. O caso mais grave é o de São Paulo, que deveria ter mais de cem representantes, mas tem apenas 70, enquanto Roraima, Amapá, Acre e outros têm oito, mas deveriam ter menos.
O sistema proporcional de lista aberta com distritos de mais de 30 milhões de eleitores, como São Paulo, encarece as campanhas, dificulta a escolha de candidatos, estimula a personalização do voto em detrimento de projetos coletivos e favorece a competição entre candidatos do mesmo partido. Outra distorção é o sistema de coligações, que frauda o voto proporcional baseado em posições político-ideológicas e faz o eleitor eleger quem tem posição oposta à sua. O Congresso descontinuou as coligações para as eleições proporcionais a partir de 2020, mas sua manutenção em 2018 afetará a formação da próxima maioria governativa.
As distorções não acabam por aí. A desigualdade da inclusão política das mulheres, que a despeito de serem maioria na população têm menos de 10% de representação parlamentar, é algo gritante. As distorções também dizem respeito ao financiamento de campanhas, cujos recursos serão distribuídos pelas oligarquias partidárias que buscam continuar na liderança dos partidos, bloqueando a renovação política do Congresso. O fundo de financiamento de campanhas criado em 2017 reservou mais recursos aos maiores partidos, dificultando a indicação e a eleição de nomes novos para o Parlamento.
A crise recoloca a reforma política na ordem do dia. Os candidatos à Presidência têm de dizer como pretendem recuperar a confiança das pessoas na política. A agenda de reformas, além da recuperação da economia, inclui a revisão do sistema eleitoral com a adoção de distritos menores, o fortalecimento da relação entre representados e representantes e novas normas de funcionamento dos partidos. O País precisa de uma efetiva cláusula de barreira para diminuir a fragmentação dos partidos e eles precisam ser submetidos a regras de democracia interna se não quiserem ser rejeitados pelos eleitores. Os candidatos precisam sinalizar, portanto, com que maioria querem governar para serem capazes de realizar as reformas requeridas pela democracia brasileira. 
O País não resiste a mais crises políticas.
*CIENTISTA POLÍTICO, É PROFESSOR DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (USP)