domingo, 5 de maio de 2013

Rombo e consumo, por Celso Ming


Celso Ming - O Estado de S.Paulo
Na semana que passou, a economia brasileira expôs uma nova fragilidade: a das Contas Externas.
Já era, em parte, coisa esperada, mas não nas proporções apresentadas pelos resultados da balança comercial do primeiro quadrimestre. Desta vez, o rombo medido por importações mais altas do que exportações foi de US$ 6,2 bilhões, um recorde para o período - veja o Confira.
Esse desempenho já vinha prejudicado por lançamentos de importações de combustíveis que deveriam ter sido feitos no ano passado e que caíram nestes primeiros meses de 2013. (Aliás, esse diferimento estatístico até agora não foi bem explicado. Aparentemente, fez parte de manobra destinada a enfeitar o balanço da Petrobrás de 2012.)
No entanto, mais cedo ou mais tarde, esse aumento das importações de combustíveis tinha mesmo de ser contabilizado e não muda o essencial: o diagnóstico de que a balança comercial aponta para distorção da mesma natureza da que já vinha sendo mostrada em outras áreas da economia, sobretudo a do forte aumento do consumo não atendido pelo setor produtivo interno.
O déficit comercial deste ano não está sendo provocado somente por importações mais altas, de 10,1% no quadrimestre sobre o primeiro quadrimestre de 2012. Para ele, concorre também a queda das importações, de 3,1% no mesmo período. Um tanto simplificadamente dá para afirmar que, além de provocar mais encomendas ao exterior, o forte consumo interno está comendo produção que normalmente seria exportada.
É um comportamento da economia que contraria os planos do governo Dilma. Para seus economistas, bastava garantir a expansão do consumo para que o setor produtivo fosse atrás, como abelha atraída pelas flores. Mas as coisas estão dando errado. A indústria brasileira, derrubada pelo peso excessivo dos custos e pelo nível alarmante de colesterol da administração pública, não tem conseguido competir com a do resto do mundo, nem lá fora nem mesmo aqui dentro.
Por enquanto, o rombo crescente do comércio exterior do País é suportável. Primeiro, porque os Investimentos Estrangeiros Diretos (IED) vêm compensando a maior parte do déficit. Segundo, porque o Brasil possui hoje reservas externas na casa dos US$ 378 bilhões, que podem ser acionadas caso haja necessidade de cobrir contas externas sem cobertura financeira. E, terceiro, porque este pode ser apenas mau momento, a ser revertido nos próximos meses.
O problema é que as causas do baixo desempenho comercial não estão sendo devidamente atacadas. O governo segue gastando demais, com o que cria renda e consumo. E a saúde da indústria nacional ainda está abalada, o que reforça sua incapacidade de atender à demanda interna e às exportações. Esse quadro negativo começa a ser identificado no exterior e pode prejudicar decisões de investimento e afluxo de moeda estrangeira para a economia.
Lamentavelmente, o governo Dilma não parece convencido de que tem de mudar o atual arranjo de políticas de modo a virar esse resultado medíocre. Falta saber o custo político dessa omissão.

sábado, 4 de maio de 2013

USP: só 4 pretos nos cursos disputados


Perfil das dez carreiras mais concorridas da universidade é de alunos brancos, vindos de famílias com renda mensal acima de R$ 6,2 mil

04 de maio de 2013 | 2h 03

PAULO SALDAÑA - O Estado de S.Paulo
Praticamente metade dos alunos matriculados nos dez cursos mais concorridos da USP é de família de classe A (renda acima de R$ 12.440) ou B (acima de R$ 6.220). Dados do questionário socioeconômico da Fuvest, que realiza o vestibular da USP, mostram que os ingressantes de 2013 nessas carreiras são predominantemente brancos, de escolas particulares e com renda familiar superior a 10 salários mínimos mensais.
Essa faixa de renda representa 13,9% das famílias do Estado. Na USP, como um todo, chega a 32% a proporção de calouros de famílias mais abastadas.
Nesses dez cursos, só quatro pretos foram aprovados, além de 73 pardos - o que representa 10% das matrículas. A classificação é adotada pelo IBGE, que registra 35% de participação do grupo na população do Estado.
Entre as carreiras mais concorridas, Audiovisual tem 58,6% de alunos das faixas de renda mais altas - e só 2,4% de alunos de famílias carentes, de até 3 salários mínimos. Além de ser uma das carreiras mais tradicionais, Direito também está entre as mais elitistas. Mais de 40% dos ingressantes são de famílias com renda acima de 15 salários mínimos - a maior proporção nesse recorte.
O professor de Direito da USP Marcus Orione diz que uma maior heterogeneidade seria positiva. "Não tenho dúvida de que temos uma unidade elitista e isso é um pouco o desenho histórico do País. Se tivéssemos perfil mais plural, teríamos, por exemplo, outras aproximações aos temas de estudo."
Cotas. A divulgação ocorre ao mesmo tempo em que são debatidas cotas na USP. Lançado pelo governo e por reitores das três estaduais, o Programa de Inclusão com Mérito no Ensino Superior Paulista (Pimesp) deve ser votado na universidade neste semestre. O Pimesp não contempla metas por renda e só prevê benefício a estudantes de escola pública, além de pretos, pardos e indígenas.
A atual política da USP, que dá bônus no vestibular a alunos de escola pública, independentemente de raça e renda, não conseguiu ampliar efetivamente seus números. Entre 2012 e 2013, o porcentual de alunos de escola pública passou de 28% para 28,5%. Levando em conta apenas as dez carreiras mais concorridas, só 19% dos matriculados eram da rede pública. Os piores resultados estão no interior: Administração da USP de Ribeirão Preto teve 5,88% de matrículas da escola pública. Depois aparece Engenharia Civil de São Carlos, com 7,94%.
Exceção. O calouro Paulo Sérgio Junior, de 17 anos, é uma exceção. Foi um dos 12 alunos da rede pública aprovados em Economia e Controladoria na USP Ribeirão. "Por ser do interior, tenho um contato maior com o professor, que incentiva mais", diz ele, que é de Dourado, no interior, e não fez cursinho.
O presidente da ONG Educafro, Frei David, se disse preocupado. "Se a USP não tiver a capacidade de rever sua meritocracia injusta, o movimento social vai ter de radicalizar."

Preço de imóvel novo recua pela 1.ª vez em quatro anos


Márcia De Chiara
Pela primeira vez em quatro anos, houve uma freada generalizada nos preços dos imóveis residenciais novos colocados à venda na cidade de São Paulo. No primeiro trimestre, o valor do metro quadrado dos lançamentos com um e dois dormitórios, os imóveis mais procurados, caiu 7,8% em relação a dezembro de 2012, revela pesquisa da Empresa Brasileira de Estudos de Patrimônio (Embraesp).
Isso significa que o metro quadrado de área útil de um imóvel de dois dormitórios, cotado em média a R$ 6,4 mil em dezembro, tinha recuado para R$ 5,9 mil em março. Nos imóveis de três e quatro quartos, a retração no primeiro trimestre foi de 5% e de 1%, respectivamente. "Provavelmente, a queda de preço reflete a dificuldade de venda, a falta de liquidez", diz Luiz Paulo Pompéia, diretor da Embraesp.
Promoções. O que se viu desde o fim de 2012 foi uma enxurrada de promoções inusitadas no mercado para impulsionar vendas e enxugar estoques. Em meados de março, a Cyrela, por exemplo, anunciou a venda de apartamentos de dois e três dormitórios em Santos (SP), com preço de 2010. "Foi a primeira vez que isso ocorreu", diz Carlos Valadão, presidente da Eugênio Marketing Imobiliário.
A Cyrela diz que conseguiu fazer essa oferta porque se baseou no preço do terreno comprado naquele ano.
No mês passado, a Even cortou os preços de imóveis residenciais e comerciais, numa promoção, prorrogada até hoje, com descontos de até 30%.
Já a construtora Trisul, além de reduzir preços em até 25% de 800 imóveis desde 1.º de março, decidiu pagar as despesas com escritura e a mudança dos compradores. Segundo o diretor Ricardo Stella, não há desaceleração nas vendas. O que ocorreu foi um acúmulo pequeno de estoques provocado pelo aumento da oferta e pelo cancelamento de negócios. É que houve comprador que não conseguiu assumir o financiamento.
Ciclo. Após a explosão de preços e do boom de lançamentos em 2010 e 2011, Pompéia acredita que o mercado imobiliário esteja iniciando um ciclo de baixa. Segundo ele, as empresas calcularam mal o tamanho da procura e a participação dos investidores. Nos últimos tempos, parte importante das vendas foi para investidores. Agora, uma parcela desses compradores está pondo à venda os imóveis para reaver o dinheiro. Isso pressiona ainda mais os preços.
"Primeiro, houve uma redução da produção, que vimos em 2012. Agora, as empresas começam a baixar os preços, que estão voltando para um patamar mais real", diz Pompéia. Para este ano, ele projeta queda de 10% no valor do metro quadrado. "Se considerarmos a inflação, a perda real com imóveis novos deve ficar entre 3% e 4%."
Celso Petrucci, economista-chefe do Secovi-SP, que reúne as empresas do setor imobiliário, é enfático: "O mercado vai indo muito bem, obrigado". Segundo ele, não há redução de preços e o mercado imobiliário está "bastante" ajustado.
Os dados, porém, trazem incertezas. Pesquisa do próprio Secovi aponta que, no primeiro bimestre, o último dado disponível, o número de unidades vendidas na capital paulista caiu 12,7% em relação a igual período de 2012 e o total de lançamentos cresceu 16,8%. Petrucci diz que houve neste ano uma migração de vendas de fevereiro para março. Ele acredita que o desempenho do trimestre será melhor do que o do bimestre.