Em vigor desde 1º de janeiro de 2007, a Lei Cidade Limpa foi sancionada no final do ano anterior pelo então Prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, e serviu para regular o tamanho de letreiros, placas, luminosos de estabelecimentos comerciais e proibir a propaganda em outdoors na capital paulista.
A princípio, como toda lei polêmica, ela dividiu a opinião da população paulistana, apesar da ampla margem de pessoas favoráveis a nova lei municipal. Naquele já distante ano de 2007 os principais opositores foram aqueles que sempre poluíram visualmente a cidade sem pouco se importar com qualidade de vida como, por exemplo, empresas de publicidade focadas em outdoors, que tiveram que mudar de ramo ou migrar para outras cidades.
Rapidamente o paulistano viu os benefícios da Lei Cidade Limpa, com a remoção de propagandas gigantes por toda a cidade, e a redescoberta de fachadas antigas centenárias, antes escondidas por luminosos enormes. Ouso dizer que possivelmente essa lei, moderna e focada no bem estar do cidadão, é disparada a maior lembrança que o paulistano tem da gestão de Gilberto Kassab.
Mas, como tudo que é bom dura pouco, a Lei Cidade Limpa foi aos poucos sendo alterada e mutilada a cada ano que passava, para atender a interesses dessa ou daquela empresa, em detrimento do cidadão.
Curiosamente foi o próprio Kassab o primeiro a fazer alterações na lei, trazendo de volta a poluição visual dos famigerados relógios de rua, que marcam horário e temperatura e em troca mostram publicidade, como se fosse necessário manter esses relógios espalhados pela cidade em pleno século 21, onde todo mundo tem celular, relógio no carro, no pulso, monitores em ônibus etc. Seu sucessor, Fernando Haddad, poderia ter revogado essas mudanças, como fez com o famigerado CONTROLAR mas não quis.
De lá para cá a lei sofreu diversas alterações, reduzindo cada vez mais o seu alcance, e a própria prefeitura foi relaxando as fiscalizações, deixando a lei cada vez mais de lado, em detrimento do bem-estar do paulistano. Porém em 2024 o que se vê é uma lei que além de carente de fiscalização, é cada vez mais desrespeitada por empresas de todo o tipo.
Semana passada a rede de fast food Burger King resolveu decorar a fachada de uma de suas principais lojas na capital paulista, localizada na esquina das avenidas Paulista e Brigadeiro Luís Antônio com duas imagens gigantes de personagens de um filme que está em cartaz. A ação, que a meu ver faz o paulistano de bobo, não menciona o filme mas basta você estar minimamente antenado com a programação dos cinemas para saber do que se trata, ou então entrar na loja e ser bombardeado com a publicidade do "combo dos parças" que é alusiva aos mesmos personagens.
Já na região da Sé o que se vê é outra estratégia de violação da Lei Cidade Limpa, essa adotada por bets e cassinos virtuais. Para embarcar na onda do grafite, modalidade artística que a capital paulista se destaca, essas empresas estão pagando grafiteiros para fazer murais que são, nada menos, que publicidade disfarçada de arte em muros da cidade e bancas de jornais. Para evitar multas ou receber uma punição mais dura, esses grafiteiros não assinam essas obras como é de praxe em seus trabalhos.
É assim que a empresa de jogatina virtual Brazino 777 tem espalhado diversas publicidades disfarçadas de grafite pela cidade, as quais já localizei nas regiões central, norte e leste de São Paulo. Outra empresa a fazer o mesmo truque é a empresa de apostas Vai Vai Bet, que tem espalhado sua propaganda em bancas da região central de São Paulo, principalmente no bairro da Bela Vista.
A POSIÇÃO DAS EMPRESAS E DA PREFEITURA
Consultada sobre o envelopamento de sua loja com a publicidade de filme que é alusivo a seu combo de lanches, o Burguer King limitou-se a responder que sua ação está de acordo com as diretrizes da Lei Cidade Limpa, mas não encaminhou nenhuma documentação que autoriza sua veiculação. Também consultadas, as empresas Brazino 777 e Vai Vai Bet não responderam aos questionamentos até o fechamento desse texto.
Já a prefeitura de São Paulo, através da Secretaria Municipal das Subprefeituras, enviou a seguinte resposta: "A Secretaria Municipal das Subprefeituras informa que os locais serão fiscalizados e autuados, caso sejam constatadas irregularidades. Este ano, a Prefeitura de São Paulo já aplicou 130 multas por descumprimento da Lei Cidade Limpa, que totalizaram mais de R$ 2,46 milhões.". No entanto a secretaria não respondeu se essas propagandas são irregulares ou não e se seriam eventualmente multadas.
PREFEITURA APAGA GRAFITES
Apesar de a secretaria não ter respondido na nota sobre a legalidade ou não destas publicidades em questão, ao menos ficou evidente que os grafites da Vai Vai Bet e Brazino 777 não estavam em conformidade com a lei, pois a própria prefeitura apagou os grafites após nosso contato. Resta saber se as empresas foram ou serão multadas e qual será a punição para o caso de haver reincidência.
LEI PODE SOFRER OUTRA MUTILAÇÃO
A já tão desfigurada e desrespeitada Lei Cidade Limpa está prestes a sofrer mais um duro golpe. A Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento (SMUL) realizou nesta última quarta-feira, 7 de agosto, uma reunião ordinária da Comissão de Proteção à Paisagem Urbana (CPPU) que prevê alterações que irão beneficiar empresas como construtoras em stands de vendas, liberando painéis de led de até 10m² em funcionamento das 7h às 22h, e para empresas do ramo de varejo de produtos para pets, a adesivagem do lado externo de suas fachadas.
O que o paulistano está prestes a assistir é a morte lenta e dolorosa daquela que é uma das leis mais sensatas que já se aprovaram em São Paulo.
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