Emilio Sant’Anna, O Estado de S.Paulo
24 de março de 2022 | 05h00
A despoluição do Rio Pinheiros avança: 85% dos pontos de medição estão dentro das metas de oxigenação na água. Além disso, 83% de esgoto tratado, obras de limpeza, desassoreamento e saneamento estão progredindo. Os dados devem ser apresentados nesta quinta-feira, 24, no lançamento das obras da Usina São Paulo, antiga Usina de Traição, pelo governador João Doria (PSDB).
Dos 13 pontos de monitoramento da água no rio em janeiro (dados completos mais recentes), 11 tinham valores de DBO (a chamada demanda bioquímica de oxigênio) abaixo de 30 mg/l, o limite para que a água não tenha cheiro e menor turbidez. É uma das principais métricas usadas para medir a limpeza.
Ainda assim, hoje há discrepâncias na qualidade ao longo de seu curso. Em seus extremos, na Usina Pedreira e no Cebolão, estão os locais com os piores índices. A parte superior do rio (da antiga Usina de Traição em direção à zona sul) é o trecho mais limpo, onde já se nota a presença de peixes. O presidente da Sabesp, Benedito Braga, explica que isso não é surpresa, uma vez que as ligações de esgoto já foram feitas.
Da usina até o Cebolão, porém, a poluição é mais concentrada. Por ora, assim como o Tietê, onde deságua, o Pinheiros limpo é ainda um projeto. E limpo não significa que terá condições de algum dia ser um rio em que se possa nadar ou pescar. Às margens da bacia do Pinheiros vivem cerca de 3 milhões de pessoas, 1,6 milhão sem esgoto tratado.
Além do esgoto clandestino, o rio recebe a sujeira difusa das pistas da Marginal. Óleo, restos de pneus e detritos dos carros são levados pela chuva para o seu leito todos os dias. A única forma de evitar essa poluição seria não ter movimento na via, o que está longe de ser uma opção. “É um rio urbano que, assim como Sena ou o Tâmisa, está sujeito a essa poluição difusa”, diz o secretário de Infraestrutura e Meio Ambiente, Marcos Penido.
O projeto de limpeza do Pinheiros prevê o investimento de R$ 3 bilhões em obras para a coleta de esgoto, despoluição e desassoreamento do leito, construção de Unidades de Renovação da Água em locais em que a coleta casa a casa é quase impossível (normalmente em ocupações irregulares), instalação do Parque Bruno Covas, com 17 km de extensão em sua margem, e a transformação da Usina São Paulo em um centro gastronômico, de compras e lazer.
Desde 2019, foram feitas a ligação de esgoto em 554 mil domicílios na bacia do Pinheiros, o que corresponde a 2.300 litros de esgoto por segundo de 1,5 milhão de moradores a menos nos afluentes do rio. Além disso, cinco Unidades de Renovação da Água devem ser entregues até setembro, a primeira delas em abril. A meta é chegar até setembro sem esgoto clandestino jogado no rio, o que deverá reduzir a pressão de matéria orgânica na água.
Segundo Penido, o modelo de contratação das obras é um passo fundamental. “Os contratos são por resultado, não por obra. Ou seja, as empresas contratadas têm interesse em fazer o máximo possível de ligações de esgoto”, afirma.
Isso, porém, não evitará que algumas ações continuem mesmo após o fim das obras. O desassoreamento do rio e a coleta de material sólido das águas são duas delas. Em todo seu curso, o Pinheiros deve manter 2,5 metros de profundidade. Para isso, 22 balsas e mais de 200 funcionários seguirão retirando lodo. Para evitar que lixo sólido, como garrafas plásticas, sejam jogadas nos afluentes, o plano é continuar investindo em educação ambiental nas comunidades.
Ao anunciar a reforma da usina, concedida por R$ 280 milhões a um consórcio privado, Doria a chamou de “Puerto Madero” brasileiro, referência à área revitalizada de Buenos Aires, na Argentina. Penido vê no empreendimento um ponto de valorização da região. “Entre a outorga paga ao Estado e o investimento na reforma do local, o investimento privado é de cerca de R$ 1 bilhão”, afirma.
Para o coordenador de pesquisas do IDS (Instituto de Democracia e Sustentabilidade), Guilherme Checco, o projeto acerta ao trazer medidas inovadoras como as Unidades de Renovação da Água e os contratos por produção. No entanto, lamenta que mananciais como a represa Billings e Guarapiranga não façam parte do escopo. "O rio não está sozinho no território. Ele corre para o Tietê e em determinadas condições é revertido para a Billings que, como a Guarapiranga, está em uma situação muito delicada", afirma. "Há esgoto e loteamento das margens (das represas) pelo crime organizado. Os mananciais são o centro para pensaramos numa política de segurança hídrica."
Mancha de poluição diminui, mas Tietê ainda é desafio
Se em três anos o Pinheiros conseguiu se aproximar muito de suas metas, será inevitável o paulistano olhar para o Tietê e se perguntar a razão de, apesar de ter passado de uma mancha de 800 km de poluição para 162 km, o rio não seguir até hoje o mesmo caminho. Desde 1992, ele passa por uma série de obras e foi alvo de seguidas promessas de diferentes governadores.
Segundo diz o secretário de Infraestrutura e Meio Ambiente Marcos Penido, o modelo foi estabelecido. “Estamos deixando o conceito, com contratos por produção, unidades de renovação da água nos afluentes e coleta de esgoto”, afirma.
De acordo com o levantamento Observando o Tietê da organização não governamental SOS Mata Atlântica, entre setembro de 2020 e agosto de 2021, a área com qualidade de água ruim no Rio Tietê foi reduzida em 50%.
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