Marcus Vinicius Rodrigues
Em tempos de fake news, não acreditei, num primeiro momento, na veracidade das declarações recentes do sr. Carlos von Doellinger, dirigente maior do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), defendendo a desindustrialização do Brasil nas atividades não vinculadas à agricultura e à mineração.
Um jovem assistente meu chegou a dizer, de forma humorada, que ele deve ter um doutorado em economia em Chicago, como muitos dos geniais burocratas da atual equipe de economistas do Ministério da Economia, que não são favoráveis e não entendem do tema desenvolvimento industrial.
Logo depois, também com o humor brasileiro, levantou a hipótese de que ele tinha tomado a vacina, e isso poderia ter alterado seu DNA, fazendo com que perdesse o bom senso ou esquecesse os ensinamentos básicos de uma especialização que fez em engenharia de produção e fabricação na PUC-RJ.
Mas nada disso! O atual presidente do Ipea, uma instituição que abriga os mais bem formados doutores em economia do país, possui somente um mestrado. E, pelas informações a que se teve acesso, ainda não tomou a vacina contra a Covid-19.
O Ipea é uma das instituições de referência e excelência, herança bendita dos governos militares, com o legado de “pensar o Brasil” e que ajudou a forjar o milagre econômico dos anos 1970. Historicamente, ele tem a função de dar suporte técnico ao governo para a formulação de políticas públicas destinadas aos programas de desenvolvimento.
Portanto, seu dirigente maior deveria ter uma visão macro e atualizada do contexto atual e ser independente do órgão responsável pelos programas de desenvolvimento, hoje o Ministério da Economia. Mas o atual presidente do Ipea foi indicação pessoal, segundo informações da imprensa, do titular do citado ministério, Paulo Guedes.
Assim, tudo foi explicado. Nem fake news, nem os efeitos da vacina, nem Chicago. O que pode ter ocorrido foi um saudosismo no retorno aos debates da “política do café com leite” da República Velha, quando se discutia o que era mais importante: a industrialização ou vender commodities. Posições míopes e desatualizadas quanto ao desenvolvimento, com foco apenas nos aspectos macroeconômicos, desprezando conhecimentos atuais e experiências de nações que cresceram e empregaram seus cidadãos a partir do setor industrial.
Hoje não existe nação forte, independente e soberana sem um parque industrial moderno, abrangente, diversificado e ativo, que fabrique de alfinetes a aviões. O exemplo disso é a recente pandemia que explicitou o erro estratégico das nações ocidentais ao terceirizar suas produções industriais, passando a administrar apenas marcas, marketing e fumaça. O desespero de muitas para comprar respiradores, e agora os insumos para a vacina, despertou o Ocidente para o erro cometido. Mas, diante das recentes declarações do titular do Ipea, o instituto que “pensa o Brasil”, o posicionamento brasileiro deveria ser o oposto.
É inconsequente e irresponsável que se defenda a desindustrialização de atividades não vinculadas à agricultura e à mineração. Isso poderia ser um crime de traição à pátria? Não tenho conhecimento jurídico para responder.
E tudo isso durante a quarta fase da Revolução Industrial, que tem como foco a inteligência artificial e que bate às nossas portas. No Brasil, a produção primária e a manufatura de seus produtos se fazem imperiosas sim. Mas só isso é pouco! Seria como planejar o fim dos sonhos de um país independente e autossuficiente.
Mas o Brasil é forte, grande e inovador. E o empresário brasileiro tem garra, é empreendedor e pensa grande —não vai se adequar somente à produção ou manufatura das commodities como foi sugerido, de forma limitada e infeliz, por um frentista do posto Ipiranga.
Pense mais, Ipea. Faça o seu papel e ajude a acordar o Brasil!
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