Leão Serva
Terminadas as campanhas eleitorais, a relação de promessas no país inteiro talvez contenha mais obras para os próximos quatro anos do que todas as realizadas ao longo da história do Brasil, desde que Cabral mandou erigir o altar da primeira missa. Políticos brasileiros prometem obras. Nem sempre honram promessas, mas mesmo a pequena fração que será cumprida provocará grande estrago.
Faz cem anos que Washington Luís (1869-1957), um político fluminense estabelecido em São Paulo, adotou o lema "governar é construir estradas". O legado desse presidente da República é terrível: desde então, quase todo político brasileiro defende que governar é construir rodovias, prédios públicos, hospitais, escolas, creches, pontes, hidrelétricas, ruas, conjuntos habitacionais, torres, enfim, obras, obras, obras.
O exemplo recente mais aberrante desse distúrbio é a Cidade Administrativa de Minas Gerais, obra de quase R$ 2 bilhões, que substituiu toda a estrutura da administração estadual e concentrou os servidores em uma mesma sede faraônica, na periferia de Belo Horizonte. Desde a inauguração, milhares de funcionários públicos se concentram em longos congestionamentos para idas e vindas ao templo do desperdício.
Esses exemplos abundam no Brasil. Museus importantes queimam por falta de manutenção enquanto outros novos brotam por todo canto. Estradas esburacadas cobrem o território nacional e, ainda assim, novas rodovias estão em construção.
Já há várias décadas, estudo britânico concluiu que novas estradas produzem engarrafamentos que não existiriam sem elas. Levado ao governo, foi responsável pela suspensão do plano de rodovias de Margaret Thatcher (1979-1990). Não é por outra razão que as décadas passam e o sistema viário britânico tem tão poucas alterações.
Agora mesmo, o governo paulista, em fim de mandato, quer implementar um "Macroanel Rodoviário", com traçado três vezes maior que o Rodoanel Mario Covas, ainda inconcluso, mas já congestionado. O custo total ainda não foi definido, mas seu resultado os engenheiros de tráfego já sabem: ficará engarrafado cerca de dois anos após a inauguração.
Uma pessoa ingênua poderia achar que tudo é coincidência. Não é! As empreiteiras de obras públicas brasileiras se incluem entre as maiores do mundo. A investigação policial que as envolveu, a Lava Jato, é "o maior escândalo de corrupção do planeta". Obras públicas, na quantidade em que se realizam no Brasil, são uma jabuticaba determinada pela voracidade das empreiteiras em simbiose secular com governantes.
E, entre todas as obras, nada supera uma hidrelétrica em volume de recursos investidos. Por isso, a grande excitação por novas e mais longínquas hidrelétricas, apesar de as análises do fim do regime militar terem concluído que nosso parque hídrico já não compensa mais barragens.
O Tribunal de Contas da União já apontou mais de uma vez que a oferta de energia elétrica poderia ser ampliada com investimentos nos equipamentos já instalados. Novas turbinas e melhor aproveitamento dos reservatórios podem ampliar em 23% a produção de usinas com mais de 20 anos. Redução de perdas na distribuição pode gerar ganhos de 19,5%. Essas medidas, somadas, poderiam gerar oferta adicional correspondente a 2,5 vezes a produção de Belo Monte. Mas são providências cujos contratos não envolveriam as construtoras brasileiras, que não têm essa expertise. Será por isso que não ocorrem?
O Brasil só reduzirá a corrupção quando a gestão pública construir menos e administrar e usar melhor o que já está construído. E isso só ocorrerá quando a opinião pública finalmente disser "nãos" a obras!
Faz cem anos que Washington Luís (1869-1957), um político fluminense estabelecido em São Paulo, adotou o lema "governar é construir estradas". O legado desse presidente da República é terrível: desde então, quase todo político brasileiro defende que governar é construir rodovias, prédios públicos, hospitais, escolas, creches, pontes, hidrelétricas, ruas, conjuntos habitacionais, torres, enfim, obras, obras, obras.
O exemplo recente mais aberrante desse distúrbio é a Cidade Administrativa de Minas Gerais, obra de quase R$ 2 bilhões, que substituiu toda a estrutura da administração estadual e concentrou os servidores em uma mesma sede faraônica, na periferia de Belo Horizonte. Desde a inauguração, milhares de funcionários públicos se concentram em longos congestionamentos para idas e vindas ao templo do desperdício.
Esses exemplos abundam no Brasil. Museus importantes queimam por falta de manutenção enquanto outros novos brotam por todo canto. Estradas esburacadas cobrem o território nacional e, ainda assim, novas rodovias estão em construção.
Já há várias décadas, estudo britânico concluiu que novas estradas produzem engarrafamentos que não existiriam sem elas. Levado ao governo, foi responsável pela suspensão do plano de rodovias de Margaret Thatcher (1979-1990). Não é por outra razão que as décadas passam e o sistema viário britânico tem tão poucas alterações.
Agora mesmo, o governo paulista, em fim de mandato, quer implementar um "Macroanel Rodoviário", com traçado três vezes maior que o Rodoanel Mario Covas, ainda inconcluso, mas já congestionado. O custo total ainda não foi definido, mas seu resultado os engenheiros de tráfego já sabem: ficará engarrafado cerca de dois anos após a inauguração.
Uma pessoa ingênua poderia achar que tudo é coincidência. Não é! As empreiteiras de obras públicas brasileiras se incluem entre as maiores do mundo. A investigação policial que as envolveu, a Lava Jato, é "o maior escândalo de corrupção do planeta". Obras públicas, na quantidade em que se realizam no Brasil, são uma jabuticaba determinada pela voracidade das empreiteiras em simbiose secular com governantes.
E, entre todas as obras, nada supera uma hidrelétrica em volume de recursos investidos. Por isso, a grande excitação por novas e mais longínquas hidrelétricas, apesar de as análises do fim do regime militar terem concluído que nosso parque hídrico já não compensa mais barragens.
O Tribunal de Contas da União já apontou mais de uma vez que a oferta de energia elétrica poderia ser ampliada com investimentos nos equipamentos já instalados. Novas turbinas e melhor aproveitamento dos reservatórios podem ampliar em 23% a produção de usinas com mais de 20 anos. Redução de perdas na distribuição pode gerar ganhos de 19,5%. Essas medidas, somadas, poderiam gerar oferta adicional correspondente a 2,5 vezes a produção de Belo Monte. Mas são providências cujos contratos não envolveriam as construtoras brasileiras, que não têm essa expertise. Será por isso que não ocorrem?
O Brasil só reduzirá a corrupção quando a gestão pública construir menos e administrar e usar melhor o que já está construído. E isso só ocorrerá quando a opinião pública finalmente disser "nãos" a obras!
Leão Serva
Jornalista, ex-secretário de Redação da Folha; administrador, com mestrado em administração pública, e doutor em comunicação e semiótica pela PUC-SP
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