terça-feira, 17 de maio de 2022

A conversa fiada da revitalização, Alvaro Costa e Silva, FSP

 Leio a notícia e me bate a sensação de déjà-vu. Após acordo com o Ministério Público, a Supervia, concessionária responsável pelo transporte ferroviário no Rio, irá reformar a estação da Leopoldina. O investimento prometido para obras na gare e nas plataformas é de R$ 5 milhões. O edifício histórico, abandonado há mais de 20 anos e caindo aos pedaços na cabeça de quem se aventura a passar por ali, é um retrato da falência e do desprezo pela cidade.

A empresa, campeã de reclamações e em briga aberta com o governador Cláudio Castro (que classificou o serviço de "podre"), terá de conservar e manter limpas as áreas sob sua responsabilidade. Ainda está prevista uma segunda etapa do projeto: a instalação, no prazo de um ano após a conclusão da reforma, de um centro cultural, com salas de exposição e teatro —ouço essa conversa fiada há três décadas.

A Leopoldina, ou a estação Barão de Mauá, está carregada de memória afetiva. Inspirada na gare Victoria, de Londres, foi inaugurada em 1926. Luxo de outros tempos, o amplo salão interior, que oferecia serviços de cafeteria, barbeiro, engraxate, charutaria e agência bancária, é dominado por uma abóbada de fina estrutura metálica. Os passageiros embarcavam para bairros do subúrbio (Bonsucesso, Ramos, Olaria, Penha) e também para Petrópolis, Friburgo, Campos. Entre 1994 e 1998, funcionou o Trem de Prata para São Paulo.

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O passado do Rio que merece ser preservado é um permanente e nunca concluído projeto de "revitalização". Se o rio Carioca jorra litros de esgoto na baía de Guanabara, como ocorreu no mês passado, logo surge a promessa de limpar e salvar suas águas. E assim ficamos: na promessa.

A estação Leopoldina, no centro do Rio - Paulo Carneiro/Photopress/Folhapress

Quando se contar a verdadeira história do samba na Lapa dos anos 90, Eduardo Galloti será o bamba daquele movimento. Ele morreu na quinta (12), sem desfrutar da glória em vida.

'Revogaço' e adeus às armas, Cristina Serra, FSP

 É aterrador o relato do repórter Ivan Finotti sobre sua visita a uma loja de armas, em São Paulo, para o lançamento de uma marca de fuzil. O novo fetiche da turma da bala custa quase R$ 20 mil e pode ser parcelado em até dez vezes no cartão.

A mesma loja oferece tacos de beisebol não para praticar o esporte, mas como um item a mais para o cliente montar o seu arsenal. Os bastões têm inscrições como "Direitos Humanos" e "Diálogo". É o recado claro e debochado de como resolver conflitos: no grito, na força bruta, à bala.

Cerca de dez armas penduradas na parede
Armas expostas em loja - Ivan Finotti/Folhapress

Este é apenas um exemplo de como a violência passou a ser um valor promovido pelo governo. Bolsonaro conseguiu afrouxar a legislação sobre armas por meio de decretos e portarias. São instrumentos meramente administrativos, que dispensam a apreciação do Congresso. Alguns deles contaram com a conivência do Exército, que perdeu atribuições de controle e rastreamento.

Quase quatro anos de estímulo às armas produzem muitos efeitos. Tem gente ganhando rios de dinheiro com isso, multiplicaram-se os clubes de tiro pelo país e devem estar abarrotados os depósitos das milícias, facções e outras modalidades de crime.

Há ainda outra consequência, difícil de mensurar, que é a naturalização da percepção de que uma sociedade armada até os dentes seria uma garantia de proteção e segurança para o cidadão. O caso do ex-ministro da Educação Milton Ribeiro, no balcão do aeroporto de Brasília, é autoexplicativo. Ele carregava uma pistola em vez de livros.

Com a convicção de que Bolsonaro não será reeleito, tomo a liberdade de dar uma sugestão ao próximo presidente. No dia da posse, em 1º de janeiro de 2023, como primeiro ato de governo, publique um "revogaço" no Diário Oficial, anulando todas as medidas de facilitação do acesso às armas.

O "revogaço" não resolverá tudo, pois já há um imenso arsenal em mãos erradas. Mas emitirá um sinal poderoso de mudança e de que é possível e urgente dar adeus às armas.

Proposta que recria privilégio a juízes e procuradores tem avanço no Senado, OESP

 


Volta do adicional de 5% sobre o salário a cada 5 anos, o quinquênio, está prevista em PEC que deve ser levada a votação em breve, como sinaliza o presidente do Senado 

Adriana Fernandes, O Estado de S.Paulo

17 de maio de 2022 | 05h00

BRASÍLIA - Sob forte pressão em ano eleitoral, o presidente do SenadoRodrigo Pacheco (PSD-MG), sinalizou que vai colocar em breve em votação a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 63, que garante um benefício extra no contracheque de juízes e procuradores. No Congresso Brasileiro de Magistrados, na quinta-feira passada em Salvador (BA), Pacheco defendeu a volta do privilégio. Ontem, no Roda Viva, reafirmou o apoio e disse que pode ser, inclusive, o relator da proposta.

O retorno do quinquênio (adicional de 5% do salário a cada cinco anos) para Judiciário e Ministério Público teria custo de R$ 7,5 bilhões por ano, segundo cálculos obtidos pelo Estadão incluindo servidores ativos e aposentados e pensionistas.

Rodrigo Pacheco
Rodrigo Pacheco, presidente do Senado; Pacheco defendeu projeto que resgata quinquênio para juízes e procuradores.  Foto: Dida Sampaio/Estadão

O adicional se somaria a outros privilégios já existentes, como férias de 60 dias, auxílio-moradia de R$ 4,3 mil a magistrados sem residência oficial nas comarcas e vale-alimentação superior a R$ 1 mil (em 24 Estados), entre outros. O benefício, visto como regalia, foi extinto para juízes em 2005 – para os servidores do Executivo, já não existia desde 1999. Caso volte, juízes e procuradores receberão o adicional acima do teto constitucional, de R$ 39,3 mil mensais. 

Hoje, a despesa média mensal por juiz para os cofres públicos, incluindo salário, indenizações, encargos, Imposto de Renda e despesas como passagens aéreas e diárias, é de R$ 48,2 mil, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Em entrevista ao Roda Viva ontem, Pacheco defendeu que a proposta seja atrelada ao projeto que propõe o fim dos "supersalários" do Judiciário. O texto que limita os ganhos acima do teto de gastos para o serviço público foi aprovado na Câmara há quase um ano e aguarda o aval dos senadores.

Segundo Pacheco, o resgate do privilégio é importante para a "valorização" da carreira da magistratura e para compensar "privações", como não poder ter outro emprego. "É importante para ter uma carreira estimulada e profissionais independentes", afirmou. De acordo com ele, que se dispôs até mesmo a relatar a proposta, a extensão do quinquênio para aposentados e pensionistas precisa ainda ser discutida no Congresso.

A movimentação acontece na semana em que o presidente Jair Bolsonaro tem de decidir sobre o reajuste de 5% para o funcionalismo. O martelo chegou a ser batido pelo presidente, mas ele recuou e preferiu esperar. Em ofício à Casa Civil, o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Luiz Fux, já deu aval ao governo para reajustar, em 5%, os salários do Judiciário, apesar de o valor estar longe do que esperavam os servidores.  

Digital do Planalto 

A expectativa é de que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 63, que resgata o privilégio de adicional de 5% sobre o salário a cada cinco anos de trabalho para juízes e procuradores, seja discutida na pauta desta semana do colégio de líderes do Senado. A perspectiva de que a PEC vá a votação começou a circular na quinta-feira, 12. 

Assessores do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), dizem que não há data para a votação e que ele próprio vai primeiro discutir com os líderes. Pacheco, no entanto, considera a proposta “inteligente” para acabar com as tentativas de novos penduricalhos. Na quinta-feira passada, na abertura do 24.º Congresso Brasileiro dos Magistrados (CBM), ele defendeu a aprovação do projeto. 

“É preciso o reconhecimento das excepcionalidades da carreira. A legítima reestruturação da magistratura é necessária para evitar a distorção de um magistrado no início da carreira ter a mesma remuneração de um magistrado no final da carreira”, disse o presidente do Senado no evento. 

Em boletim, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) informa que o custo médio mensal por juiz é de R$ 48,2 mil. O documento não traz as remunerações iniciais e finais dos magistrados. Apenas em quatro Estados (Alagoas, Piauí, Amazonas e Pará), esse custo por juiz fica abaixo de R$ 40 mil. O salário mínimo no País, válido para os empregados do setor privado, é de R$ 1.212. 

O avanço da proposta tem a digital do governo. O ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, discutiu o tema com servidores interessados, entre eles, o presidente do Tribunal de Justiça do Piauí (TJ-PI), desembargador José Ribamar Oliveira – seu reduto eleitoral. A Casa Civil não se manifestou.

Nos bastidores, presidentes de tribunais também se movimentam para agilizar a votação antes que os parlamentares se dispersem com a campanha eleitoral. Uma série de emendas já apresentadas pede a extensão do benefício para outras categorias, como advogados e defensores públicos, policiais federais, procuradores dos Estados, Tribunal de Contas da União (TCU) e auditores da Receita

Despesas

O cálculo do impacto de R$ 7,5 bilhões por ano se o benefício ficar restrito a juízes e integrantes do Ministério Público foi feito pelo consultor legislativo Luiz Alberto dos Santos, em uma nota técnica. Santos é especialista em políticas públicas e sócio da consultoria Diálogo Institucional Assessoria e Análise. 

“A PEC 63, em tramitação há quase 9 anos, volta à tona em um momento crítico, ao final do mandato presidencial, em período pré-eleitoral, e motivada por pressões e interesse imediato de seus beneficiários”, escreveu Santos. O aumento da despesa anual seria de R$ 2,1 bilhões para os juízes federais e estaduais na ativa e de R$ 1,5 bilhão para os membros do Ministério Público Federal e estadual. Com a inclusão dos inativos, o valor chegaria aos R$ 7,5 bilhões.