sábado, 5 de dezembro de 2020

Anvisa deve garantir que resultados da fase 3 se repitam quando vacina for usada em larga escala, OESP

 Fernando Reinach*, O Estado de S.Paulo

05 de dezembro de 2020 | 05h00
Atualizado 05 de dezembro de 2020 | 09h49

Correções: 05/12/2020 | 09h48

Com o governo do Estado de São Paulo prometendo que vai iniciar a vacinação da população em janeiro, a pressão sobre a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e as acusações de perseguição vão pipocar no noticiário. Sejam justas ou não. Assim, vale a pena entender o papel da Anvisa no caminho que leva a vacina na fase 3 até sua aplicação em larga escala. 

Existem hoje quatro vacinas que trilham esse caminho, mas o Brasil só apostou em duas delas, a da Sinovac/Butantã e a de Oxford/AstraZeneca. A da Pfizer sem dúvida é a mais avançada, a da Moderna está em segundo, a de Oxford em terceiro, e a da Sinovac é a menos avançada.

Todas afirmaram ter terminado os estudos da fase 3. As três primeiras já divulgaram para a imprensa a eficácia - Pfizer e Moderna de até 95%. A de Oxford/AstraZeneca apresentou eficácia menor, de 62%, que poderá ser aumentada dependendo de novos estudos. Já o governo de São Paulo, que tem parceria com a Sinovac, prometeu divulgar os resultados em 15 de dezembro. Após divulgar os resultados à imprensa, as empresas precisam publicar esses dados em uma revista científica - o que ainda não aconteceu.

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)  Foto: Mariana Leal/Anvisa

Feita a publicação, ou em paralelo, cada um dos fabricantes precisa solicitar aos órgãos regulatórios de cada país que concedam a autorização para que a vacina seja usada. A Pfizer e Moderna já submeteram esse pedido a EUAUnião Europeia e Inglaterra. A AstraZeneca aparentemente ainda não fez isso. A Sinovac sequer divulgou os resultados.

É importante lembrar que nenhum desses quatro fabricantes fez seu pedido à Anvisa, e sem pedido formal a agência não pode iniciar formalmente a análise. Nesse aspecto a bola está na mão das empresas. A Anvisa vem acompanhando os ensaios de fase 3 das empresas que estão fazendo os testes no Brasil (AstraZeneca, Pfizer e Oxford). No mundo, de todos os pedidos feitos por essas empresas, somente um foi aprovado: o da Pfizer na Inglaterra - e a vacinação começa segunda feira. No Brasil nenhum pedido foi sequer submetido.

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A vacina da Pfizer é considerada atualmente como a mais avançada Foto: Handout via REUTERS

Uma vez que a Anvisa receba um pedido de aprovação, o que ela tem de examinar? A primeira análise se refere à condução dos estudos de fase 3. Ele foi bem feito, os dados são confiáveis, justificam a conclusão sobre a eficácia da vacina e sobre sua segurança? A princípio isso é relativamente fácil de fazer, uma vez que todos os dados tenham sido recebidos do fabricante. Mas essa não é a tarefa mais importante. Cabe à Anvisa garantir que os resultados obtidos na fase 3 se repitam quando a vacina for usada em larga escala. 

Para isso é preciso verificar se o processo de fabricação, feito em pequena escala para os testes clínicos, vai resultar no mesmo produto quando for implementado em grandes bateladas em diferentes fábricas ao redor do mundo. Que controles e testes cada batelada terá antes da entrega? Além disso, se o fabricante diz que a vacina mantém a qualidade por um certo período, que experimentos foram feitos para garantir que isso é verdade?

Em suma, a Anvisa tem de ter certeza de que tudo que se espera da vacina vai ser entregue em milhões de doses que serão usadas ao longo de muitos anos. É por esse motivo que a Anvisa certifica cada fábrica, e está agora na China. No caso das fábricas que serão construídas no Brasil, só para envasar ou para produzir o produto ativo da vacina, elas também têm de demonstrar que seguem as melhores práticas de biossegurança, esterilidade, e assim por diante.

Quando tudo isso estiver garantido, e a Anvisa estiver convencida de que os milhões de doses a serem injetados em milhões de brasileiros vão ser produzidas com todo cuidado (lembrem-se de que na fase 3 a AstraZeneca injetou por erro parte dos voluntários com meia dose) e o funcionamento da vacina vai corresponder ao obtido na fase 3, aí ela vai autorizar o uso no Brasil. Ou seja, é bom sabermos que a Anvisa não deve, e na verdade não pode, simplesmente carimbar e aprovar um pedido. Afinal é análise e fiscalização que vão garantir a segurança e a efetividade de toda a campanha de vacinação. 

É para garantir essa independência que a Anvisa foi criada como uma agência regulatória nacional, parcialmente protegida da influência direta dos políticos e do Ministério da Saúde. Precisamos exigir da Anvisa que ela seja rápida na análise dos pedidos, mas sem abrir mão dos critérios de qualidade. Em última instância é ela que vai garantir que as vacinas usadas no Brasil sejam eficazes e seguras. Por esse motivo muitos duvidam que a vacinação no Brasil comece em janeiro. 

Acompanhar de perto esse caminho, entendendo suas dificuldades, é essencial para entendermos quando as vacinas estarão disponíveis. Enquanto isso, cabe ao SUS se organizar para garantir que, uma vez aprovadas, as doses sejam bem usadas. O primeiro objetivo deve ser zerar as mortes e os casos graves e em seguida diminuir o número de casos leves. A Inglaterra acredita que atingirá esse primeiro objetivo nos próximos seis meses. Já no Brasil...

*BIÓLOGO, PHD EM BIOLOGIA CELULAR E MOLECULAR PELA CORNELL UNIVERSITY E AUTOR DE A CHEGADA DO NOVO CORONAVÍRUS NO BRASIL; FOLHA DE LÓTUS, ESCORREGADOR DE MOSQUITO; E A LONGA MARCHA DOS GRILOS CANIBAIS

Eleições projetam cores e caras para 2022, oesp

 João Gabriel de Lima, O Estado de S.Paulo

16 de novembro de 2020 | 03h00

Vermelho, azul e verde. Seria exagero dizer que o pleito municipal, as “midterm elections” do Brasil, antecipam a disputa presidencial. Elas definem, no entanto, os campos políticos que irão predominar nos anos seguintes. Abertas as urnas, eles são três. O “verde” do bolsonarismo, o “vermelho” da esquerda e o “azul” de um centro que tende à direita.

O resultados trazem mensagens diferentes para cada campo.

Os “azuis” Eduardo Paes (DEM) e Bruno Covas (PSDB) ganharam votações expressivas no Rio e em São Paulo, os dois maiores colégios eleitorais municipais. No terceiro, Salvador, Bruno Reis (DEM) ganhou no primeiro turno. Como o centro tende à direita, trata-se de uma notícia ruim para o presidente Jair Bolsonaro. Muitos dos que descarregaram nele o voto útil em 2018 encontraram novas alternativas em 2020 – e talvez procurem-nas em 2022.

Entre os “vermelhos”, a mensagem é o crescimento para fora dos muros do PT. Guilherme Boulos (PSOL) conquistou uma votação expressiva em São Paulo, Manuela D’Ávila (PCdoB), em Porto Alegre, e dois candidatos jovens de esquerda foram bem no Recife, João Campos (PSB) e Marília Arraes – esta última, do PT.

Os “verdes” de Bolsonaro não têm muito o que comemorar. Fracassaram com Celso Russomanno em São Paulo. No Rio, Marcelo Crivella se arrastou até o segundo turno – mas as rejeições do atual prefeito e do presidente, somadas, dão grande favoritismo a Paes.

Não é o caso, no entanto, de vaticinar uma derrota de Bolsonaro em 2022. Primeiro, ele leva a vantagem natural de ser presidente. Segundo, largou na frente. Os eleitores já sabem que o candidato do bolsonarismo em 2022 é Jair Bolsonaro.

Enquanto isso, as cores “azul” e “vermelha” ainda estão em busca, cada uma, de um rosto que unifique seus matizes. A boa notícia, nos dois campos, é o surgimento de caras novas com projeção nacional – Covas, Boulos, Manuela, Bruno Reis e muitos outros.

No bolsonarismo, há poucos rostos inéditos. O presidente desfila montado no cavalo de Átila – não nasceu nem deverá nascer grama nova no campo dos “verdes”.


Polícia do Rio intima William Bonner e Renata Vasconcellos para depor sobre suposta desobediência a ordem judicial no caso das ‘rachadinhas’, oesp

 Fábio Grellet/RIO

04 de dezembro de 2020 | 20h27

Os apresentadores do Jornal Nacional, da TV GloboWilliam Bonner e Renata Vasconcellos, foram intimados a depor à Polícia Civil do Rio de Janeiro em uma investigação sobre suposta desobediência à decisão judicial que proibiu a emissora de divulgar informações a respeito da investigação do esquema de “rachadinha” (devolução de parte do salário) que, segundo o Ministério Público do Rio (MP-RJ), o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) praticou enquanto era deputado estadual no Rio de Janeiro.

Em 4 de setembro, a juíza Cristina Serra Feijó, da 33ª Vara Cível do Rio de Janeiro, atendeu pedido do senador Flávio Bolsonaro e proibiu a TV Globo de exibir qualquer documento ou peça da investigação sobre o suposto esquema de “rachadinha” no gabinete de Flávio enquanto ele era deputado estadual no Rio. “Não tenho nada a esconder e expliquei tudo nos autos, mas as narrativas que parte da imprensa inventa para desgastar minha imagem e a do presidente Jair Messias Bolsonaro são criminosas”, publicou Flávio nas redes sociais, à época, justificando o pedido de censura.

Na ocasião, a emissora parou de veicular reportagens sobre o tema e classificou a decisão como cerceamento à liberdade de informar, uma vez que a investigação é de interesse de toda a sociedade.

O jornalista William Bonner, apresentador do Jornal Nacional, da TV Globo. Foto: Reprodução/Instagram

A defesa do senador Flávio Bolsonaro apresentou à Delegacia de Repressão aos Crimes de Informática denúncia de que a TV Globo teria descumprido a ordem judicial, e o delegado Pablo Dacosta Sartori iniciou investigação sobre suposta “desobediência a decisão judicial sobre perda ou suspensão de direito”.

Em nota, a defesa do senador afirmou que “o registro policial feito contra a Rede Globo deveu-se ao crime de desobediência praticado por vários de seus prepostos (editores, repórteres, etc) nos seus principais telejornais, em acintoso desrespeito à decisão que a proibiu, por duas vezes, de exibir reportagens sobre a investigação que atualmente tramita sob supersigilo”. Ainda segundo a nota, “como foi derrotada em várias tentativas de reverter a decisão, (a emissora) resolveu ignorar o Judiciário para seguir com o seu jornalismo clandestino, feito à custa de delitos próprios e alheios”. A defesa de Flávio Bolsonaro informou ter pedido aplicação de multa de R$ 500 mil por cada ato de violação.

Dentro da investigação, na última quarta-feira (2) determinou que os apresentadores do “Jornal Nacional” sejam intimados a depor na próxima quarta-feira, dia 9, na sede da DRCI, em Benfica (zona norte do Rio). Renata deve depor às 14h e Bonner, às 14h30. Se algum deles não comparecer, segundo a notificação, terá praticado crime de desobediência, punido com detenção de até seis meses e multa.

Procurada pela reportagem, a TV Globo informou que “não se manifesta sobre procedimentos legais em curso”.

ABI. Em nota, a Associação Brasileira de Imprensa manifestou “seu espanto e sua indignação” com o fato de Bonner e Renata terem sido intimados a depor.

“Nosso espanto vem do fato de terem sido Bonner e Renata os convocados a depor, e não Flávio Bolsonaro e o miliciano Fabrício Queiroz, seu assessor. Nossa indignação vem do fato de que, uma vez mais, se tenta intimidar a imprensa e calar a sua voz, num claro atropelo à Constituição”, diz a nota da ABI. A entidade, presidida por Paulo Jeronimo, “se coloca incondicionalmente ao lado dos jornalistas atingidos”.