segunda-feira, 1 de julho de 2019

Real, 25, é a moeda mais longeva da história recente do país, FSP


Oscar Pilagallo
SÃO PAULO
O real completa 25 anos nesta segunda-feira (1º) com a marca, recém-conquistada, de moeda com circulação ininterrupta mais longeva da história contemporânea do Brasil. A posição foi alcançada sem alarde quando, em 2018, ultrapassou o cruzeiro, até então a moeda que tinha circulado por mais tempo no passado recente do país.
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O cruzeiro durou pouco mais de 24 anos. Por coincidência, nasceu e morreu sob ditaduras. Foi criado em novembro de 1942, durante o Estado Novo de Getúlio Vargas, e extinto em fevereiro de 1967, quando, no governo do general Castello Branco, passou a vigorar o cruzeiro novo, com o corte de três zeros, para reduzir nominalmente os números inchados pela inflação dos anos anteriores.
Fábricas de matrizes e cédulas da Casa da Moeda do Brasil, em Santa Cruz, na Zona Oeste do Rio de Janeiro
Fábricas de matrizes e cédulas da Casa da Moeda do Brasil, em Santa Cruz, na Zona Oeste do Rio de Janeiro - Fernando Frazão - 24.jul.2017/Folhapress
O cruzeiro teria duas reedições, por assim dizer. Voltou a circular entre 1970 e 1986 e mais tarde ensaiou uma volta que seria fugaz, entre 1990 e 1993. Nessas ocasiões, no entanto, apresentava outro padrão monetário, e por isso as sobrevidas não devem ser somadas ao seu tempo de existência. Embora com o mesmo nome, eram outras moedas.
Se considerarmos o passado remoto, o real só perde para o mil-réis, que foi usado no Brasil desde meados do período colonial até 1942, quando o cruzeiro o sepultou. Mil-réis era uma popular unidade de conta, um múltiplo de real, que emprestou seu nome à moeda atual.
Na certidão de nascimento do real consta a data de 1º de julho de 1994, mas a unidade monetária teve uma importante vida embrionária --a URV (Unidade Real de Valor)-- que, mais do que antecipar seu nome, fez a transição com a moeda anterior, o cruzeiro real.
Considerado um prodígio da engenharia econômica, o artifício, lançado três meses antes, permitiu que, aos poucos, a sociedade abandonasse a moeda desvalorizada e migrasse para um indexador estável.
O Plano Real, do qual resultou a moeda, foi uma obra coletiva. Contou com a elaboração de economistas tucanos, como Edmar Bacha, André Lara Resende, Pérsio Arida e Gustavo Franco, sob a coordenação política do então ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, a ponte entre a equipe técnica e o presidente Itamar Franco, que bancou a aposta, assumindo um papel que talvez tenha sido subestimado.
Depois de pelo menos uma década combatendo o dragão inflacionário da imaginação dos chargistas, o plano foi um sucesso e logo derrubou as taxas de quatro dígitos para níveis vigentes nos países desenvolvidos.
Uma das poucas críticas veio do PT, que chamou o plano de "Cruzado dos ricos", em oposição ao Cruzado de José Sarney, que teria sido "dos pobres", pois por poucos meses em 1986 promoveu uma festa de consumo.
Na época, o PT criticou o Real por intuir, corretamente, que seu artífice de maior visibilidade seria eleito presidente no pleito daquele ano. Foi o que aconteceu: FHC derrotou Lula no primeiro turno.
Posteriormente, a crítica da esquerda seria modulada. Hoje poucos duvidariam que o fim da hiperinflação, que transferia renda para quem dela podia se proteger, teve um impacto social positivo.
Permanece, no entanto, a ressalva de que o seu eixo --a âncora cambial que segurou os preços-- teria também efeitos danosos, ao inibir o crescimento econômico, gerando desemprego.
De qualquer maneira, quem viveu a montanha-russa de emoções provocadas pela sequência dos planos anti-inflacionários fracassados tenderá provavelmente a identificar um saldo positivo nessa moeda velha de um quarto século.

Egoísmo histórico, Ruy Castro , FSP


Juscelino Kubitschek, então presidente da República, visitou o Museu Nacional, na Quinta da Boa Vista, em 1958. Depois dele, tivemos na Presidência Jânio Quadros, João Goulart, Castello Branco, Costa e Silva, Médici, Geisel, Figueiredo, Sarney, Collor, Itamar, Fernando Henrique, Lula, Dilma, Temer e, agora, Bolsonaro. Todos acharam tempo para ir ao Maracanã, ao Sambódromo ou à Festa da Uva. Menos ao Museu Nacional. 
Museu Nacional foi uma das nossas três instituições de pesquisa que, nos últimos 200 anos, falaram de igual para igual com as maiores comunidades científicas do mundo —as outras, o Jardim Botânico e o Instituto Oswaldo Cruz. Alguns dos presidentes citados nem deviam saber para o que elas serviam —o atual, nitidamente, não sabe. Se soubessem, ter-lhes-iam destinado, se não mais verbas, pelo menos alguma admiração. 
O Museu Nacional, no Rio
O Museu Nacional, no Rio - Ricardo Borges - 12.fev.19/Folhapress
O museu queimou no dia 2 de setembro último. Dois séculos de investigação e pesquisa e 20 milhões de peças foram devorados pelo fogo. Mas muito pode ser salvo e há heróis trabalhando. Há duas semanas, o Ministério da Educação liberou-lhe um repasse de R$ 908 mil. Foi a primeira parcela de um total de R$ 12 milhões previstos para 2019. O governo deve achar esse valor uma fortuna.
Enquanto isso, há dias, o governo alemão doou ao museu R$ 1,5 milhão. O British Council, R$ 150 mil. Os italianos ofereceram o empréstimo de peças de seus museus arqueológicos e “know how” para restaurar material atingido pelo incêndio —eles tiveram Pompéia, como se sabe. E o Instituto Smithsonian, dos EUA, convidou 14 jovens entomólogos, paleobiólogos e zoólogos brasileiros a continuarem lá os seus estudos até o museu poder voltar a abrigá-los.
Esses países estão fazendo ciência, não caridade. Aqui talvez seja pedir demais que a elite brasileira desperte de seus históricos egoísmo e ignorância e descubra o Museu Nacional
Ruy Castro
Jornalista e escritor, autor das biografias de Carmen Miranda, Garrincha e Nelson Rodrigues.